Carolin Emcke é uma filosofa alemã que, em entrevista ao El País, ela que combate contra o crescimento dos movimentos populistas de extrema-direita, diz que a pandemia poderá ser um convite ao recrudescimento deste tipo de movimentos.
Lembrando a importância da existência de um sistema de saúde público, Emcke defende que estes deverão ser os países a sair da crise com uma ideia de estado mais fortalecida.
"Por mais que seja uma crise global, o seu impacto não afetará todos da mesma forma. A pandemia é uma tentação autoritária que convida à repressão, à vigilância totalitária baseada em dados digitais e regressão nacionalista. (...) Será decisivo poder demonstrar que as sociedades que saem menos prejudicadas da crise são aquelas que possuem um sistema público de saúde, aquelas cujas infraestruturas sociais não foram completamente privatizadas e corroídas, podendo provar que serão solidariedade e cuidado mútuo triunfam sobre o vírus e não o estado de exceção e a privação de liberdade", começa por lembrar.
Numa longa conversa, esta galardoada escritora lembra que as imagens que lhe chegam de Madrid ou de campos de refugiados não devem deixar ninguém sossegado.
Viver neste momento em Berlim dá-me humildade, mas também modéstia: "Até hoje, em Berlim, temos 50 mortes pelo vírus, em Nova Iorque são 10 mil. As imagens de Madrid ou dos campos de refugiados nas ilhas gregas são praticamente insuportáveis para mim. Não vejo como seremos capazes de pagar a dívida política e moral que estamos assumindo como alemães, como europeus, por não reagir com a solidariedade necessária, com a humanidade necessária. A implementação relutante de uma série de instrumentos financeiros para os países do sul, em vez de lançar títulos (bonds) para a Europa parece-me uma loucura mesquinha e imperdoável. E isso falando apenas do contexto europeu", defende Emcke, falando depois das mudanças que sente poderão resultar de toda a crise sanitária em termos societários.
"É natural que a pandemia cause medo e pavor. Medo de adoecer, de morrer sozinho, de não poder acompanhar os entes queridos, de não poder dizer adeus, medo de dificuldades, de perder o trabalho, medo de colapso existencial. Mas a perda de soberania não é compensada pela estigmatização ou humilhação de outros. Como se a impotência fosse menor se o marginalizado ou o parceiro fossem maltratados. Não é apenas a xenofobia que se utiliza como compensação pela insegurança individual ou social, é também a misoginia, a violência contra as mulheres", acrescenta para terminar.