CEDEAO corre o risco de ser desautorizada pela ONU na Guiné-Bissau

O presidente do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), Domingos Simões Pereira, considerou hoje que a CEDEAO corre o risco de ser desautorizada pela ONU quanto à mediação na Guiné-Bissau.

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Lusa
05/07/2020 07:00 ‧ 05/07/2020 por Lusa

Mundo

Domingos Simões Pereira

 

O Conselho de Segurança da ONU expressou na quarta-feira preocupação com os recentes incidentes na Guiné-Bissau e admitiu a possibilidade de adotar "medidas apropriadas" em resposta à evolução da situação no país.

Sublinhando que tomou nota do reconhecimento pela Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) de Umaro Sissoco Embaló como vencedor das eleições presidenciais, o Conselho de Segurança instou todos os guineenses a respeitarem as decisões da organização regional, "incluindo a nomeação de um primeiro-ministro e formar um novo Governo, em total conformidade com as disposições da Constituição e com os resultados das eleições legislativas de março de 2019", ganhas pelo PAIGC.

"Este pronunciamento não é tão ligeiro e tão minimalista como ouvi algumas autoridades a tentarem desvalorizar, dizendo que as Nações Unidas poderiam não estar devidamente informadas dos últimos desenvolvimentos. Isso é um desconhecimento absoluto de como funcionam essas estruturas a nível das Nações Unidas", afirmou Domingos Simões Pereira, em entrevista à agência Lusa.

O dirigente disse agora esperar que a União Africana reaja à declaração do Conselho de Segurança da ONU e que os Estados-membros da CEDEAO "assumam uma postura mais séria porque senão correm o risco de serem completamente desautorizados pelas Nações Unidas".

Segundo o líder do PAIGC, "a CEDEAO não dá sinais de merecer a credibilidade" da ONU, que delegou nesta organização regional a mediação da crise política na Guiné-Bissau.

"Já há algum tempo eu disse numa entrevista à Lusa que convidava as autoridades portuguesas, da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portugues) e outras organizações a acompanhar a situação da Guiné-Bissau porque nós íamos enfrentar vários problemas", avisou Domingos Simões Pereira.

Para o antigo primeiro-ministro guineense, a CEDEAO "anda a reboque" do Senegal, que vai tendo o apoio da Nigéria.

"Esperemos que nos próximos tempos a CEDEAO aproveite esta oportunidade das Nações Unidas para ter uma participação mais correta, mais neutral, uma visão global da organização", salientou.

Para o líder do PAIGC, quando o Conselho de Segurança admite "assumir medidas apropriadas", não é um recado só a nível nacional, é também um recado para a própria CEDEAO que "se não se comportar devidamente corre o risco de ser realmente ultrapassada pela ONU".

A CEDEAO tem mediado a crise política na Guiné-Bissau desde 2012 e está autorizada a intervir no país através de um mandato do Conselho de Segurança das Nações Unidas.

A Guiné-Bissau está a viver um período de especial tensão política desde o início do ano, depois de a Comissão Nacional de Eleições ter declarado Umaro Sissoco Embaló vencedor da segunda volta das eleições presidenciais.

Domingos Simões Pereira, dado como derrotado pela Comissão Nacional de Eleições, não reconheceu os resultados eleitorais, alegando que houve fraude e meteu um recurso de contencioso eleitoral no Supremo Tribunal de Justiça, que não tomou, até hoje, qualquer decisão.

Umaro Sissoco Embaló autoproclamou-se Presidente da Guiné-Bissau em fevereiro e acabou por ser reconhecido como vencedor das eleições pela CEDEAO e restantes parceiros internacionais.

Após ter tomado posse simbolicamente, o chefe de Estado demitiu o Governo liderado por Aristides Gomes, saído das eleições legislativas de 2019 ganhas pelo PAIGC, e nomeou um outro liderado por Nuno Nabian, líder da Assembleia do Povo Unido - Partido Democrático da Guiné-Bissau (APU-PDGB), que assumiu o poder com o apoio das forças armadas do país, que ocuparam as instituições de Estado.

A CEDEAO tinha pedido a formação de um Governo que respeitasse os resultados das legislativas até 22 de maio, mas o prazo não foi cumprido, porque os partidos com assento parlamentar divididos em dois blocos reivindicavam ambos ter a maioria para formar Governo.

O PAIGC venceu as legislativas de março de 2019 sem maioria e fez um acordo de incidência parlamentar com a APU-PDGB, Partido da Nova Democracia e União para a Mudança, obtendo 54 dos 102 assentos no parlamento.

Logo no início da legislatura, o líder da APU-PDGB, Nuno Nabian, incompatibilizou-se com o PAIGC e aliou-se ao Movimento para a Alternância Democrática (Madem-G15), segunda força política do país, com 27 deputados, e Partido da Renovação Social, que elegeu 21 deputados.

Apesar da nova aliança, quatro dos cinco deputados da APU-PDGB mantiveram a sua lealdade ao acordo de incidência parlamentar assinado com o PAIGC.

Na segunda-feira, Nuno Nabian conseguiu aprovar o seu programa de Governo no parlamento guineense com os votos a favor de cinco deputados do PAIGC, que contrariam a decisão do partido e participaram na sessão plenária.

Os restantes deputados do PAIGC regressaram ao parlamento na quarta-feira para anunciar que o partido vai entrar com uma impugnação judicial à aprovação do programa de Governo, alegando "violações grotescas" ao regimento da Assembleia Nacional Popular.

Até hoje, a CEDEAO não reagiu ao incumprimento do prazo.

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