A extensão do confinamento, que entrou em vigor na segunda-feira, inclui um decreto que proíbe reuniões de familiares que não coabitem em qualquer domicílio ou ambiente fechado.
A proibição prolonga-se pelo menos até dia 16 de agosto e vale para todo o território nacional, inclusive em zonas do interior do país onde o vírus não circula.
O texto do decreto proíbe expressamente "eventos sociais ou familiares em espaços fechados e nos domicílios das pessoas em qualquer caso e com qualquer quantidade de participantes, exceto o grupo que coabita".
Os parentes que, não vivendo juntos, decidam reunir-se, poderão ser punidos com uma pena de até dois anos de prisão.
As penas estão suportadas em dois artigos do código penal que estabelecem penas para "quem violar medidas adotadas pelas autoridades para impedirem a introdução ou a propagação de uma epidemia" e "para quem resistir ou desobedecer um funcionário público no seu exercício legítimo".
A medida provocou críticas e a província de Corrientes, que faz fronteira com o Brasil, anunciou que não acatará o decreto presidencial.
"Nós aqui estamos bem, numa situação sanitária boa, sem circulação comunitária do vírus. Não há razões para suspender os encontros sociais e familiares", declarou o secretário-geral do governo provincial, Carlos Vignolo.
"Um decreto que regule o que acontece dentro da casa das pessoas é inaceitável. Não vou cumprir", disse por seu lado o jornalista Marcelo Longobardi, que conduz o programa de rádio de maior audiência na rádio argentina.
Juristas consultados pela Lusa denunciam que o decreto é inconstitucional e alertam contra o avanço do Governo sobre as liberdades individuais.
O advogado constitucionalista Daniel Sabsay classifica mesmo a legislação como "inconstitucional" porque "a Constituição proíbe o governo de criar um decreto para uma matéria penal".
"Os delitos penais só podem ser criados por lei. Em matéria penal, não se admite a analogia. Uma coisa é proibir uma festa ou uma reunião familiar; outra é dizer que a festa constitui um delito", explica Sabsay.
"O simples facto de alguém se reunir com a própria família ou com amigos mais íntimos não significa que está a propalar a doença. É preciso provar que a pessoa sabia que estava doente e que quis contagiar os demais", acrescenta.
O também constitucionalista Félix Lonigro considerou que a medida era razoável no começo da pandemia", mas que "não se pode restringir liberdades eternamente, sobretudo quando o Congresso está a funcionar".
"O Governo está a restringir o direito à intimidade, isto é, aquilo que se pode fazer dentro do próprio domicílio. O decreto é grotesco e passa dos limites", acusa Lonigro.
A Argentina tem tido um enfoque de combate à pandemia que divide o país em duas regiões: a área metropolitana de Buenos Aires, em isolamento social com fortes restrições, e o interior do país, em distanciamento social com flexibilizações.
No entanto, a área metropolitana de Buenos Aires concentra 35% dos habitantes, é responsável por metade do Produto Interno Bruto argentino e concentra o consumo da produção do resto do país.
Com 137 dias, o confinamento na Argentina, o mais longo do mundo, apelidado de "quarenterna" (quarentena eterna) entrou numa nova fase desde segunda-feira até o dia 16, quando poderá ser renovada pela décima vez desde 20 de março.