O ataque de terça-feira é uma repetição dos acontecimentos que levaram ao golpe de 2012, que lançou o país no caos quando os extremistas islâmicos aproveitaram o vazio de poder para se apoderarem das cidades no norte, antes de uma operação militar liderada pela França ter expulsado os terroristas dessa região.
De acordo com a agência de notícias AP, a queda do Presidente, Ibrahim Boubacar Keita, segue de perto os acontecimentos que levaram à queda do seu antecessor, Amadou Toumani Toure, que também foi forçado a demitir-se depois de uma série de derrotas militares, mas nessa altura os ataques foram feitos pelos rebeldes separatistas tuaregues, ao passo que agora foram os militares a expulsar Keita do poder.
"Os mediadores pediram a Keita para partilhar o poder num governo de unidade nacional, e ele até disse que estava aberto a convocar novas eleições legislativas, mas isso não foi suficiente para os líderes da oposição, que disseram que não descansariam até o afastar do poder", lê-se no artigo da AP.
Keita anunciou a sua saída num discurso transmitido pela televisão nacional, no qual apareceu de máscara devido à pandemia de covid-19 e explicou que se demitia para evitar um banho de sangue.
Eleito democraticamente em 2013 e reeleito cinco anos depois, Keita tinha, na verdade, poucas alternativas, depois de os soldados se terem armado na cidade de Kati e avançado para a capital, detendo o primeiro-ministro, Boubou Cisse, e o próprio Presidente.
Os acontecimentos de terça-feira surgem depois de vários meses de protestos e agitação social na sequência das eleições renhidas, e acontecem numa altura em que o Governo estava a ser criticado pela maneira como lidou com a insurgência dos últimos meses, que atirou para a instabilidade um país até então apresentado como um modelo de estabilidade na região.
Durante o último ano, os militares foram várias vezes vencidos por grupos islâmicos ligados ao Estado Islâmico e a grupos afiliados à al-Qaida, nomeadamente no norte do país, no ano passado, o que levou inclusivamente a uma reorganização das forças armadas para combater esta ameaça.
A notícia da detenção de Keita foi recebida com celebração na capital pelos protestantes contra o Governo, que começaram as manifestações logo em junho, exigindo a demissão do Presidente.
"Todos os malianos estão cansados, atingimos o limite", disse um manifestante citado pela AP, demonstrando a mudança sentida nas ruas face à esperança com que Keita foi recebido em 2013, quando venceu mais de duas dúzias de candidatos para ascender ao poder, com 77% dos votos.
O impasse político das últimas semanas manteve-se, mesmo com a intervenção da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), o que deixou antever uma nova intervenção militar que poderia conduzir a uma queda do Governo.
Portugal tem desde 01 de julho uma Força Nacional Destacada no Mali, no âmbito da Missão Multidimensional Integrada para a Estabilização do Mali (Minusma), das Nações Unidas, que inclui 63 militares da Força Aérea Portuguesa e um avião de transporte C-295.
O objetivo da missão portuguesa é assegurar missões de transporte de passageiros e carga, transporte tático em pistas não preparadas, evacuações médicas, largada de paraquedistas e vigilância aérea e garantir a segurança do campo norueguês de Bifrost, em Bamako, onde estão alojados os militares portugueses.
O Mali é um país da África Ocidental, fazendo fronteira com a Argélia, a Norte, a Mauritânia, Senegal, Gâmbia e Guiné, a Oeste, Costa do Marfim e Burkina Faso, a Sul, e com o Níger, a Leste.
De acordo com o Fundo Monetário Internacional, o Mali deverá ver o crescimento económico de 5,1% do ano passado abrandar para 1,5% este ano, mantendo-se, apesar dos efeitos da pandemia, em território positivo.
Com quase 20 milhões de habitantes, mais de 60% dos quais com menos de 25 anos, este país francófono é o oitavo em área no continente africano.