Shinzo Abe acaba de anunciar, em conferência de imprensa, que vai renunciar ao cargo de primeiro-ministro do Japão.
O anúncio acontece horas depois de os media nipónicos terem avançado com esta informação e de, nessa sequência, um dos membros do seu partido ter confirmado a decisão.
"As minhas condições de saúde não são perfeitas. Uma saúde fraca pode resultar em decisões políticas erróneas", disse Abe, sublinhando que, "em política, o mais importante é gerar resultados".
Shinzo Abe, membro do controverso grupo nacionalista Nippon Kaigi, renuncia assim devido a problemas de saúde, causados por uma doença inflamatória intestinal, como tinha sido já avançado.
Segundo a Reuters, a renúncia desencadeará uma corrida à liderança no Partido Liberal Democrático (LDP) - muito provavelmente dentro de duas ou três semanas - e o vencedor deverá ser formalmente eleito no parlamento. O novo líder do partido ocupará o cargo durante o resto do mandato de Abe, que terminava em setembro de 2021.
Questionado pelos jornalistas, Abe escusou-se a avançar nomes de um eventual sucessor, sendo que este se deve manter no cargo até que um novo líder seja eleito.
Shinzo Abe: A carreira política e o problema de saúde
As preocupações sobre o problema crónico de saúde de Abe voltaram à discussão pública desde o início do verão e intensificaram-se neste mês, quando deu entrada por duas vezes num hospital de Tóquio, para realizar exames não especificados.
Em 2007, Abe demitiu-se abruptamente, na primeira vez que ocupou o cargo, também devido a problemas de saúde, e lidera o governo desde final de 2012, um recorde de longevidade para um primeiro-ministro japonês.
O primeiro-ministro japonês demissionário reconheceu ter colite ulcerosa desde que era adolescente e disse que o seu estado foi controlado com tratamento.
É considerado um político de sangue azul que foi preparado para seguir os passos de seu avô, o ex-primeiro-ministro Nobusuke Kishi.
A sua retórica política concentrava-se frequentemente em fazer do Japão uma nação "normal" e "bonita", com um exército mais forte e um papel maior em assuntos internacionais.
Citado pela agência de notícias Associated press (AP), Hiroshige Seko, secretário-geral do partido para a Câmara Alta do parlamento, confirmou que Abe disse aos membros do partido que renuncia ao cargo de primeiro-ministro para não causar problemas.
Shinzo Abe tornou-se o primeiro-ministro mais jovem do Japão em 2006, aos 52 anos, mas sua primeira passagem excessivamente nacionalista terminou abruptamente um ano depois por causa da sua saúde.
Em dezembro de 2012, regressou ao poder, dando prioridade a medidas económicas na sua agenda nacionalista.
Ganhou seis eleições nacionais e conquistou o poder com firmeza, reforçando o papel e a capacidade de defesa do Japão e a sua aliança de segurança com os EUA. Também intensificou a educação patriótica nas escolas e aumentou a projeção internacional do Japão.
Abe tornou-se já esta semana, dia 24, o primeiro-ministro que mais tempo serviu no Japão por dias consecutivos no cargo, superando o recorde de Eisaku Sato, seu tio-avô, que serviu 2.798 dias de 1964 a 1972.
Mas a sua segunda visita ao hospital na segunda-feira acelerou as especulações e as manobras políticas em direção a um regime pós-Abe.
A colite ulcerosa causa inflamação e, às vezes, pólipos nos intestinos. Pessoas com a doença podem ter uma expectativa de vida normal, mas os casos graves podem envolver complicações com risco de vida.
Depois de as suas recentes visitas ao hospital serem conhecidas, altos funcionários do gabinete de Abe e do partido no poder disseram que o primeiro-ministro estava sobrecarregado e precisava de descanso.
As preocupações com a sua saúde aumentaram a especulação de que os dias de Abe no cargo estavam contados.
Os seus apoios já estavam em níveis muito baixos devido ao modo como lidou com a pandemia do coronavírus e o seu severo impacto na economia, além de vários escândalos políticos.
Há uma grande quantidade de políticos a desejar a substituição do chefe do governo.
Shigeru Ishiba, um ex-ministro da defesa, de 63 anos, e arquirrival de Abe, é o líder favorito nas sondagens entre os potenciais sucessores, embora seja menos popular dentro do partido no poder.
Um ex-ministro das Relações Exteriores, Fumio Kishida, o ministro da Defesa, Taro Kono, o secretário-chefe de gabinete, Yoshihide Suga, e o ministro da Revitalização Económica, Yasutoshi Nishimura, encarregado das medidas contra o coronavírus, são também referidos nos 'media' japoneses como potenciais sucessores.
Abe, que enfrentou críticas públicas devido à forma como lidou com o surto de coronavírus, foi frequentemente ofuscado pela governadora de Tóquio, Yuriko Koike, que é vista como uma candidata potencial a primeira-ministra por alguns. Contudo, teria de primeiro ser eleita para o parlamento para concorrer ao cargo mais alto.
O fim da primeira passagem de Shinzo Abe como primeiro-ministro foi o início de seis anos de mudança anual de liderança, lembrada como uma era de política de "porta giratória" que carecia de estabilidade e políticas de longo prazo.
Quando voltou ao cargo em 2012, Abe prometeu revitalizar o país e tirar a sua economia da estagnação deflacionária com sua fórmula 'Abenomics', que combina estímulo fiscal, flexibilização monetária e reformas estruturais.
As medidas impopulares que tomou para fazer face ao coronavírus fizeram com que os seus apoios diminuíssem, já antes dos seus problemas de saúde.
Talvez o seu maior fracasso tenha sido a sua incapacidade de cumprir uma meta longamente acalentada pelo seu avô, de reescrever formalmente o esboço da constituição pacifista dos Estados Unidos. Abe e os seus apoiantes ultraconservadores veem a constituição elaborada pelos EUA como um legado humilhante da derrota do Japão na Segunda Guerra Mundial.
Não atingiu também o seu objetivo de resolver vários legados inacabados do tempo de guerra, incluindo a normalização dos laços com a Coreia do Norte, a resolução de disputas nas ilhas com vizinhos e a assinatura de um tratado de paz com a Rússia.