"Os quadros [do partido] acusados de envolvimento em atos de corrupção, devem explicar-se perante a comissão de integridade, aqueles que não derem uma explicação aceitável podem ser suspensos, os condenados devem renunciar aos cargos de liderança e enfrentar ações disciplinares", declarou Ramaphosa.
O chefe de Estado adiantou que a direção do Congresso Nacional Africano (ANC, na sigla em inglês), no poder desde 1994, "reconheceu" a existência uma "campanha coreografada" contra a sua liderança que "não irá distrair o movimento do combate à corrupção e à captura do Estado".
O chefe de Estado sul-africano falava hoje aos jornalistas através uma conferência de imprensa virtual sobre a mais recente vaga de mega corrupção no seio do Governo e do ANC, do qual também é presidente, relacionada com o combate à pandemia da Covid-19 que já infetou mais de 650 mil pessoas e causou 14.028 mortos no país desde março.
Ramaphosa reuniu durante o fim de semana a direção do partido para tentar evitar um desafio à sua liderança por parte de fações rivais aliadas ao antigo chefe de Estado, Jacob Zuma, que se opõem às medidas de combate à corrupção no país e à implementação de reformas económicas anunciadas desde que assumiu o poder em 2018.
Falando também na ocasião, o secretário-geral do partido no poder, Ace Magashule, aliado de Jacob Zuma, disse que a constituição da África do Sul "é a Carta Magna pela qual todos se devem reger", mas sublinhou que "o movimento [ANC] tem os seus próprios processos internos para lidar com questões de corrupção no seio dos seus dirigentes", que são também governantes.
Entre os dirigentes políticos do ANC recentemente implicados em casos de corrupção, encontram-se a porta-voz presidencial Khusela Diko e o ministro da Saúde da província de Gauteng, Bandile Masuku.
A moeda nacional, o Rand (ZAR), desvalorizou cerca de 0,9% relativamente ao dólar na sequência da reunião especial da direção do partido no poder.
Cerca de 660 contratos públicos relacionados com a aquisição de bens e serviços necessários para a resposta do Governo à pandemia da Covid-19, no valor de 5 mil milhões de rands (247.1 milhões de euros), estão a ser investigados pela Unidade Especial de Investigação (SIU, na sigla em inglês) criada em 1996 para investigar a corrupção no Estado sul-africano, segundo a polícia.
Em declarações ao canal público de televisão sul-africano SABC News, o analista político Mcebisi Ndletyana disse hoje que a continuidade de Cyril Ramaphosa na presidência do país, bem como na presidência do partido no poder, estão "por um fio", à medida que a indignação pública aumenta com as alegações de "corrupção galopante" no seio de elite dirigente.
"A indignação pública é o fator diferenciador desta vez, este presidente prometeu um ANC completamente diferente e não se pode ter pessoas a roubar dinheiro no segundo ano da sua presidência, é como se não tivesse autoridade alguma", salientou.
"Toda a reputação [de Cyril Ramaphosa], e toda a sua presidência, dependem da sua atuação. O ANC sempre falsificou as questões porque tem um monte de gente corrupta no partido e por isso é que não vai permitir a aplicação de medidas decisivas contra a corrupção porque os implica a todos", afirmou o analista político sul-africano ao canal público.
O atual chefe de Estado sucedeu a Jacob Zuma, que em 2018 foi instado pelo partido a afastar-se devido a múltiplos escândalos relacionados com corrupção.
Uma comissão judicial de inquérito, liderada pelo juiz Raymond Zondo, investiga desde fevereiro 2018 alegações de mega corrupção e fraude na administração pública sul-africana, incluindo nos órgãos do Estado, de mais de 500 mil milhões de rands (24.7 mil milhões de euros) no mandato presidencial de Jacob Zuma, em que Cyril Ramaphosa ocupava o cargo de vice-presidente da República.
Nenhum político do ANC foi até hoje condenado.