Argentinos protestam contra a quarentena e contra o Governo

Milhares de argentinos protestaram em mais de 120 cidades do país contra a quarentena mais prolongada do mundo e contra a estratégia do Governo de avançar contra as liberdades e a favor da impunidade na corrupção.

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Lusa
13/10/2020 00:49 ‧ 13/10/2020 por Lusa

Mundo

Covid-19

Nas principais praças e avenidas do país, milhares de bandeiras argentinas eram agitadas, enquanto as panelas em protesto misturavam-se às buzinas dos automóveis em caravanas.

Das janelas, aqueles que preferiram não quebrar a quarentena, protestavam com panelas e cornetas. De quando em quando, a orquestra propositalmente ruidosa cedia lugar à entonação do hino nacional argentino.

Os protestos aconteceram em pequenos povoados e nos pontos de referência das grandes cidades. Incluíram ícones patrióticos, como o Monumento à Bandeira, na cidade de Rosario, a Praça de Maio, em frente à Casa Rosada, sede do Governo em Buenos Aires, e a residência oficial de Olivos, com o objetivo de que o Presidente Alberto Fernández escutasse o protesto.

Ali, Julieta Bogado (38) erguia o cartaz "Pela Pátria Livre, Justiça independente e sem impunidade".

"O Governo viola todos os dias a Constituição. Não temos liberdade para circular nem para trabalhar. Cada vez mais, limitam os nossos direitos. Precisamos que a Justiça seja independente. Peço, por favor, que o mundo olhe para o que está acontecer na Argentina. Estão a acabar com o país. Não temos liberdade e não é por culpa da pandemia", descreve à Lusa.

Apesar das urgências sanitárias e económicas do país depois de 207 dias de quarentena, a mais longa do mundo, estendida até, pelo menos, 25 de outubro, o Governo avança com uma agenda sem contacto com as prioridades do país.

No Parlamento, a vice-presidente Cristina Kirchner avança com uma Reforma do Judiciário cujo objetivo, acusam os manifestantes e juristas, é a de garantir a sua impunidade perante os processos por corrupção que a acossam. A Reforma reestrutura o Judiciário, promovendo a indicação de centenas de juízes aliados.

"Viemos aqui para defender a República e as suas instituições. Querem colonizar a Justiça com os seus aliados. Querem dominar o Congresso. Tudo para garantir a impunidade da vice-presidente e dos seus comparsas. Queremos uma pátria livre sem semelhança com Venezuela nem Cuba", acusa Liliana Martínez (56).

Envolvida na bandeira da Venezuela, María Laura Méndez (46) alerta os argentinos ao seu redor.

"Já vivi isso na Venezuela. Não quero que se repita aqui. Lutem enquanto há tempo. Não saiam do país. Fiquem para impedir que a Argentina torne-se a nova Venezuela", pede emocionada.

Mas Carmen Almeyda (76) é mais pessimista. "Tenho 76 anos. Já vivi 15 crises, mas esta parece terminal. Estão a devastar o país. Os meus netos querem ir embora. Não veem mais esperança no horizonte e não tenho mais argumentos. Por isso, venho. É a minha última luta por este país", diz.

No segundo trimestre, a economia argentina encolheu 19,1% e a previsão é de uma queda próxima de 15% no ano. O peso argentino perdeu 230% do seu valor em um ano. A desvalorização alimenta a inflação de 40% que ameaça sair do controlo. Esse círculo vicioso que devora empresas elevou a pobreza de 35,5% a 40,9%, e projeta-se a 50% no final do ano.

"A quarentena não é o método para cuidar da saúde. Vamos morrer de fome antes. Tenho medo da pobreza, da miséria e da insegurança. É terrível o lugar para onde nos levam. Vamos falir todos", adverte Pablo Ortíz (52).

Sondagens como a da consultora Giacobbe & Asociados indicam que somente 33,3% apóiam a continuidade da quarentena e os que querem o seu fim chegam a 55,7% da população.

Em março, o presidente registrava uma taxa de aprovação popular de 67,8%. Desde então, perdeu 33 pontos, chegando agora a 34,8%. A imagem negativa, na via contrária, subiu a 52,8%.

"Nas sondagens, há uma insatisfação crescente. O presidente tem hoje menos popularidade do que os 48% que votaram nele há menos de um ano. Não estão nas ruas apenas os que já eram opositores, mas também os seus próprios eleitores perdidos", avalia o analista político Sergio Berensztein.

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