"É difícil a mudança, mas é preciso começar por algum lado e como as pessoas não ouvem e só acreditam no que veem, eu estou aqui a pintar o que elas têm de ver", disse à Lusa o afro-americano Brain Craig enquanto pintava um mural num painel de madeira perto do edifício da Câmara Municipal.
"Não estou aqui apenas por causa de Breonna Taylor, mas também pelo resto da cidade", diz Brian Craig sentado no chão enquanto pintava uma águia americana, símbolo da cidade de Louisville, prédios e uma faixa cor de rosa porque, explica, este mês decorre uma campanha contra o cancro a "par das campanhas do 'Black Lives Matter'".
"A minha mensagem é de paz e esperança. Ela (Breonna Taylor) era muito jovem, eu não sei o que aconteceu, só sei dizer que uma pessoa foi morta e por isso vou escrever o nome dela aqui para mostrar à cidade que a vida é um bem precioso", afirma.
Breonna Taylor, 26 anos, foi alvejada por três agentes da polícia no passado dia 13 de março dentro do apartamento onde residia em Louisville, estado do Kentucky.
O tribunal distrital determinou que os agentes Jonathan Mattingly, Brett Hankison e Myles Cosgrove da Louisville Metro Police Department (LMPD) não enfrentam acusações criminais.
O painel de madeira onde o mural está a ser pintado por Brain Craig é uma das muitas proteções instaladas na parte baixa da cidade de Louisville por causa dos protestos contra o racismo e a violência policial, assuntos que marcam a campanha para as eleições presidenciais da próxima terça-feira.
A baixa da cidade é uma zona administrativa de serviços públicos onde fica instalado o departamento da polícia de Louisville, o tribunal do estado do Kentucky e a Câmara Municipal com duas esculturas junto à escadaria, incluindo o monumento ao terceiro presidente dos Estados Unidos, Thomas Jefferson (1743-1826), que o ativista Brain Craig diz ter mantido as plantações de escravos apesar das "boas intenções" da Declaração de Independência.
Thomas Jefferson nunca esteve na cidade fundada em 1778 - cujo nome tem origens no rei francês Luís XIV - mas foi governador de Louisville quando o território pertencia ao estado da Virgínia.
Ao lado há um memorial de bronze em honra aos militares da cidade tombados em conflitos armados: desde a Guerra Civil no século XIX até ao conflito no Afeganistão, onde os Estados Unidos mantêm tropas destacadas.
"Muitos dos militares tombados eram negros, sobretudo na guerra do Vietname. Eu conheço algumas famílias que perderam gente nessa guerra", diz Craig enquanto pinta a palavra "esperança" no mural de protesto.
"Para as guerras precisam de pretos e de pobres e depois tratam-nos desta maneira", lamenta outro pintor de frases de protesto que prepara as latas de tinta para iniciar "o trabalho" no painel ao lado.
A maior parte dos estabelecimentos comerciais desta zona da cidade está encerrada por causa da pandemia de covid-19 e quando cai a noite as ruas são habitadas por sem-abrigo brancos e negros.
Na avenida paralela ao mural de Craig há uma assembleia de voto (condado de Jefferson, Louisville), mas não há um único eleitor na fila.
Em frente, a Grande Loja Maçónica do Kentucky partilha o mesmo edifício com o Centro de Genealogia "Filhos da Revolução Americana".
"Entre e descubra as suas raízes familiares", refere o cartaz do laboratório que diz determinar com testes de ADN se o cliente está relacionado "com os rebeldes do passado" da luta contra os ingleses.
Há dois homens brancos no interior e do outro lado da rua foi fixado um enorme cartaz da campanha "Black Lives Matter".
A cor da pele, a história, o passado longínquo e os acontecimentos recentes marcam a vida da cidade onde segundo o ativista Brain Craig é preciso começar por algum lado, nem que seja a pintar a palavra "esperança".
As eleições presidenciais norte-americanas decorrem no dia 03 de novembro e opõem o Presidente Donald Trump ao candidato democrata Joe Biden.