"A polícia inicialmente negou a ocorrência de um morto, mas no dia seguinte acabou por reconhecer, mas o que é mais repugnante ainda é a forma como a polícia manipulou a informação, porque o jovem morto, faleceu na hora, ali na Avenida Brasil, morto a tiro", afirmou hoje Maurílio Luyele, em declarações à Lusa.
Segundo o político da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), maior partido na oposição, a polícia está a veicular a informação e "manipulou inclusive o corpo clínico do Hospital Américo Boavida para prestar informações falsas".
"Um bocado à semelhança do que já ocorreu com o doutor Sílvio Dala [médico alegadamente morto numa esquadra policial, em setembro passado, após ter sido detido por não usar máscara facial no interior da sua viatura]", recordou.
O jovem angolano foi inicialmente dado como morto, mas a polícia afirmou que estava apenas ferido. O manifestante acabou por morrer, confirmou já na quinta-feira, a equipa médica de atendimento do hospital onde deu entrada na véspera.
A informação foi avançada pelo chefe da equipa do banco de urgência do Hospital Américo Boavida, onde foi atendido o jovem, de 26 anos, estudante universitário, que deu entrada naquela unidade hospitalar, ao início da tarde de quarta-feira, depois de ferido durante a tentativa de manifestação que visava exigir melhores condições de vida e a realização das primeiras eleições autárquicas.
Augusto Manuel referiu que o paciente foi levado pela polícia àquela unidade hospitalar, como tendo sido recolhido na via pública, vítima de provável agressão física.
O médico, em declarações à Televisão Pública de Angola, referiu que o jovem terá sido atingido "com um objeto contundente", provocando-lhe um trauma na cabeça, "com sangramento ativo e exposição da massa cerebral".
Hoje, o médico Maurílio Luyele assegurou serem "falsas" as informações de que o jovem manifestante tenha sido vítima de um trauma craniano, insistindo que o mesmo "não chegou vivo ao hospital" após ter sido ferido com uma arma de fogo.
"Não chegou vivo ao hospital, não é verdade, morreu no local. A polícia chegou ao hospital depois. Os companheiros levaram-no em desespero ao hospital, e quando chegaram ao hospital o corpo clínico confirmou que ele já estava morto", frisou.
"Mas a polícia chegou depois e afastou os companheiros da relação com o corpo clínico e manipulou a informação, tendo depois veiculado a informação de que o jovem estava vivo, mas ferido, para depois prestar aquela informação que teve trauma craniano e não por ferida de arma de fogo, o que é absolutamente falso", realçou.
O também vice-presidente do grupo parlamentar da UNITA referiu que o seu partido "repudia com veemência" a repressão policial sobre os manifestantes, defendendo por isso um "inquérito independente" sobre a morte do jovem manifestante.
"Impõe-se o esclarecimento deste caso, um inquérito independente sim, e como a nossa polícia já é useira, são muitos casos assim, penso que é preciso pôr termo a isto, aquilo deveria ser um inquérito médico-legal normal", defendeu.
Mas, observou, a medicina legal em Angola é da responsabilidade do SIC (Serviço de Investigação Criminal), órgão do Ministério do Interior, e "por corporativismo é quase que impossível a polícia nacional ou a PGR conduzir um inquérito deste".
O "ideal", notou, "seria um inquérito conduzido pela Procuradoria-Geral da República [PGR] mas com a partição de entidades independentes, talvez a Ordem dos Advogados, associações dos direitos humanos, ou a Amnistia Internacional".
"Porque já são muitas violações aos direitos humanos e já está a ser muita violência", apontou.
Segundo o deputado angolano, o "batalhão" de jovens que "reclama legitimamente" por melhores condições de vida "só tende a crescer, não é por incitamento da UNITA mas por dificuldades reais que existem".
"Esse batalhão tende a crescer e o que se espera é que nos próximos tempos aumente a violência e, se não se puser um freio nessa repressão policial, há o risco de ocorrer um massacre, o que seria muito mais grave ainda. Penso que ainda estamos a tempo de prevenir e evitar que uma coisa dessas aconteça", concluiu Maurílio Luyele.