"Novidade do século". China anuncia técnica para reverter paralisia

Uma equipa de ortopedistas chineses anunciou, este sábado, os resultados interinos de um estudo clínico concluído com sucesso e que permite reverter a paralisia motivada por lesões da medula espinhal. Xiaoping Ren, que liderou o estudo, assegura que a técnica revolucionária "permite ao paciente pôr-se de pé novamente". Para o neurocirurgião italiano Sergio Canavero, que desenvolveu o protocolo que viabilizou a cirurgia, esta "é a novidade do século. O fim de um pesadelo”.

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Filipa Matias Pereira
21/11/2020 09:48 ‧ 21/11/2020 por Filipa Matias Pereira

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A equipa liderada pelo ortopedista chinês Xiaoping Ren anunciou, este sábado, que concluiu com sucesso o primeiro estudo científico em que foi revertida a paralisia da medula espinhal. O avanço científico, que promete romper paradigmas, foi desenvolvido com base no protocolo  (GEMINI) idealizado pelo italiano Sergio Canavero, que anunciou em 2017 estar preparado para avançar para o primeiro transplante da cabeça em seres humanos.

Depois de gerações de cientistas terem visto frustradas as expectativas de curar lesões na medula espinhal, a equipa de ortopedistas do Ruikang Hospital, de Nanning, na China, está a fazer ‘soar os alarmes’ da comunidade científica internacional. 

A equipa de Xiaoping Ren desenvolveu, ao longo dos últimos meses, um estudo que aplicou o protocolo de fusão da medula espinhal GEMINI, que já se tinha mostrado eficaz em cães e macacos, numa série de pacientes chineses paralisados na sequência de uma lesão traumática na coluna dorsal.

Os resultados alcançados revolucionam o mundo da medicina ao trilhar um caminho na senda da cura biológica da paralisia da medula espinhal e, consequentemente, devolvem a esperança a quem perdeu a mobilidade. 

De acordo com os resultados interinos do estudo que foi apresentado hoje no 1.º Fórum Internacional de Académicos, que se realizou em Shaoxing, Zhejiang, na China, e ao qual o Notícias ao Minuto teve acesso, os pacientes que foram submetidos a cirurgia, ao final de um mês, sem reabilitação intensiva, conseguiam mover voluntariamente os membros inferiores. E, dois a quatro meses depois, conseguiram voltar a andar sem apoio. [ver vídeo na galeria]

Notícias ao MinutoRecuperação de paciente com paralisia submetido a cirurgia© GICUP, Global Initiative to Cure Paralysis

Em declarações ao Notícias ao Minuto já depois de ter apresentado o estudo na reunião científica, Xiaoping Ren mostra-se radiante por poder partilhar com o mundo a técnica revolucionária, mas prefere ser cauteloso e reitera que os resultados finais serão publicados a seu tempo. 

Porém, apesar de os resultados hoje divulgados serem apenas interinos, o cirurgião chinês recolheu evidência científica que lhe permite assegurar que "esta é a melhor cirurgia para a lesão na medula espinhal e que permite ao paciente pôr-se de pé novamente". 

A técnica revolucionária

Apesar de protejada para mudar o futuro, a abordagem cirúrgica promovida pelos ortopedistas tem, na verdade, os alicerces no passado. 

Passemos a explicar: na primeira metade do século XX, cientistas tentaram diferentes técnicas para curar as lesões da medula espinhal. Por exemplo, o neurocirurgião Walter Freeman sugeriu que a cura biológica permanente da paralisia era possível, pelo menos em alguns casos de lesão crónica da medula espinhal, através da remoção do segmento lesionado da medula espinhal. Para tal, o especialista propunha a conexão de duas extremidades não danificadas após o encurtamento espinhal

Os especialistas chineses pensaram, então, em seguir a abordagem de remoção da lesão, mas propondo que a lacuna fosse preenchida com recurso a um transplante de um dador em morte cerebral. Esta opção, porém, significava que era necessário usar imunossupressores (evitam a rejeição do órgão), o que se reflete em toxicidade. 

O caminho passava por seguir outra abordagem: a do autotransplante (transplante de órgãos/tecidos de uma parte do corpo para outra no mesmo indivíduo). Tecnicamente, os cirurgiões removem o epicentro da lesão da medula espinhal e preenchem a lacuna com o segmento da medula espinhal saudável do paciente, retirada acima ou abaixo da lesão que se removeu. 

Notícias ao MinutoIlustração do procedimento © GICUP, Global Initiative to Cure Paralysis

E é aqui que entra o nome de ‘código’ GEMINI. O neurocirurgião italiano Sergio Canavero foi pioneiro ao desenvolver o protocolo de fusão da medula espinhal GEMINI que, como defendeu no ano passado em entrevista ao Notícias ao Minuto, irá possibilitar realizar o primeiro transplante da cabeça em seres humanos. Nas cirurgias realizadas pelos ortopedistas liderados Xiaoping Ren, o protocolo GEMINI foi implementado na interface entre o enxerto transplantado e as extremidades saudáveis para reiniciar a condução eletrofisiológica dos impulsos motores e sensoriais.

É a novidade do século. O fim de um pesadelo

Um ano depois, Sergio Canavero volta a estar à conversa com o Notícias ao Minuto, mas desta vez o ‘dossier’ transplante da cabeça em humanos é deixado, pelo menos por agora, de lado. É tempo de aclamar o alcance do colega Xiaoping. “É a novidade do século. O fim de um pesadelo”, pressagia o italiano, não escondendo o entusiasmo.

O neurocirurgião não resiste, porém, em enviar ‘farpas’ aos mais céticos que apontam severas críticas à sua ‘ousadia’ científica: “É a prova humana de que o GEMINI funciona e que as pessoas voltam a andar”.

Pese embora reconheça que, naturalmente, faz parte do processo que permite reverter a paralisia, Canavero recusa o protagonismo. “Desenvolvi o protocolo de fusão da medula espinhal GEMINI, mas tudo o resto deve-se à China. É uma grande conquista da China”

Ao longo de todo o processo, o ex-diretor do Grupo de Neuromodulação Avançada de Turim foi acompanhando o estudo que também sofreu a pressão da pandemia de Covid-19. Apesar de o epicentro do surto ter sido na China, a equipa de Xiaoping “trabalhou à ‘velocidade da luz’ e o estudo foi concluído em meses. Os efeitos têm sido tão surpreendentes que a China está a divulgar os resultados interinos do estudo”, revela. 

Notícias ao MinutoRessonância magnética que mostra o crescimento pré e pós-operatório de fibras© GICUP, Global Initiative to Cure Paralysis

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