Moçambique: Violência em Cabo Delgado faz recuar liberdades
Os efeitos da violência armada em Cabo Delgado, norte de Moçambique, são os principais responsáveis pelo recuo nas liberdades em Moçambique em 2020, segundo o relatório anual da Freedom House sobre a evolução das liberdades no país, hoje divulgado.
© Lusa
Mundo Moçambique
"A pontuação caiu devido aos efeitos da escalada da insurgência islâmica na província de Cabo Delgado", lê-se em dois capítulos do documento, referentes à liberdade de movimentos e à defesa face a agressões, com Moçambique a perder um ponto em cada.
O relatório de oito páginas hoje divulgado complementa a informação que já havia sido divulgada no dia 03 de março.
Na altura, o documento da Freedom House intitulado "Liberdade no Mundo 2021 - Democracia sob Cerco" colocou Moçambique entre os países do mundo que registaram um maior recuo nos direitos políticos e liberdades dos seus cidadãos ao longo da última década.
A organização não-governamental (ONG) sem fins lucrativos, com sede em Washington, anunciou que a pontuação de Moçambique recuou 16 pontos na última década, sendo Mali, Turquia e Tanzânia os países que registaram maiores recuos, respetivamente de 39, 31 e 30 pontos.
Incluído na categoria de "parcialmente livre", Moçambique é o 16.º dos 27 países que mais recuaram na listagem da Freedom House desde o início da década de 2010.
A ONG dá voz a "muitos analistas" que expressam preocupação em relação ao que classificam como "fracasso da Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), partido no poder, em equilibrar a quota de poder através das reformas de 2018", dizendo que tal pode "ameaçar a paz precária em Moçambique", lê-se no relatório.
O documento hoje divulgado indica ainda que a corrupção continua a existir "de forma generalizada nos mais altos níveis de governação".
"As redes de clientelismo estão profundamente enraizadas, com vários grupos a competir por recursos estatais" e o enquadramento jurídico anticorrupção "é afetado por uma variedade de lacunas", destaca a organização na avaliação dos direitos políticos em Moçambique.
Ao mesmo tempo, "um setor judiciário suscetível à pressão do poder executivo complica ainda mais as tentativas de fazer cumprir as leis anticorrupção", acrescenta.
A Freedom House refere ainda que, "apesar da aprovação de uma lei de liberdade de informação em 2014, é difícil obter informações do Governo, na prática".
"O Governo é especialmente opaco no que diz respeito à insurgência islâmica na província de Cabo Delgado", nota, sublinhando o facto de ainda não ter investigado os alegados "atos de homicídio e tortura cometidos pelas forças de segurança" durante o conflito.
O desaparecimento do jornalista Ibraimo Mbaruco em abril de 2020 em Cabo Delgado e o fogo posto na redação do jornal Canal de Moçambique, em Maputo, em agosto do último ano, fazem parte dos sinais negativos ao nível da liberdade dos media.
A violência armada em Cabo Delgado, onde se desenvolve o maior investimento multinacional privado de África, para a exploração de gás natural, está a provocar uma crise humanitária com mais de duas mil mortes e 670 mil pessoas deslocadas, sem habitação, nem alimentos.
A violência surgiu em 2017, algumas das incursões foram reivindicadas pelo grupo 'jihadista' Estado Islâmico entre junho de 2019 e novembro de 2020, mas a origem dos ataques continua sob debate.
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