Em entrevista à Lusa à margem da conferência dos ministros das Finanças africanos, que decorre até terça-feira a partir de Adis Abeba, Vera Songwe considerou que a criação de um mecanismo de libertação automática de verbas é fundamental para impedir crises como a que o continente vive.
"O que é preciso é que os países em desenvolvimento tenham um mecanismo automático de libertação de fundos, estamos à espera há um ano, vamos ter os Direitos Especiais de Saque (DES) aprovados, mas esperámos um ano, e nesse ano África teve 30 milhões de pessoas em situação de pobreza extrema, 50 milhões de empregos perdidos, e vamos ter mais 39 milhões a cair na pobreza, e mais 50 milhões de desempregados", apontou a economista.
"Isto podia ter sido evitado se África tivesse um mecanismo que imediatamente libertasse verbas, sem dizer se esta administração gosta ou não, se este governo gosta ou não, era a coisa certa a fazer", defendeu, numa referência ao veto que o Governo dos EUA, durante a Presidência de Donald Trump, impôs à emissão de DES no valor de 500 mil milhões de dólares, cerca de 420 mil milhões de euros, uma decisão revertida pelo seu sucessor, Joe Biden.
Na entrevista à Lusa, Vera Songwe defendeu que o continente "pode desenvolver os seus sistemas financeiros", mas lembrou que "o problema é que África não tem moeda forte nem reservas cambiais, e não se pode criar dinheiro senão a inflação dispara" e volta-se ao sítio onde se estava.
Questionada sobre os principais desafios do continente elencou a industrialização e a digitalização como os setores mais apelativos para o setor privado, que é fundamental para sustentar a recuperação económica.
"O grande ator é o setor privado, e a digitalização é o mais apropriado para os privados investirem porque os retornos são elevados, mas os governos africanos precisam de fazer a estrutura central da infraestrutura, ou seja, o custo terá de refletir o setor, é preciso desmonopolizar já, para garantir que o custo de acesso é suportável e rápido", argumentou.
Boa parte da infraestrutura de ligação está já feita, faltando apenas o último passo, acrescentou: "Temos cabos em todo o continente, no Djibuti há 17, o problema não é esse, o problema é o investimento no último passo, e a criação de um enquadramento regulatório que crie concorrência e faça descer os preços, criando mais acesso".
Para isso, concluiu, é preciso "que o empenho se transforme em implementação, que é um dos grandes desafios do continente". "É isso que fazemos na UNECA, implementar o plano, ligar orçamentos a decisões políticas com impacto, mas para isso é preciso orçamentar, porque só o que for orçamentado é que é feito", disse.
Leia Também: Angola foi único país que reestruturou dívida privada sem queda do rating