"Julgo que o nervosismo de Marrocos face à Europa no seu conjunto após a rejeição da proclamação de Trump é evidente. Não apenas face a Espanha, mas também face à Alemanha", referiu Oubi Bouchraya, representante da Frente Polisário na Europa e representante da autoproclamada República Árabe Saarauí Democrática (RASD).
"E existe também um desejo da parte de Marrocos de transmitir aos europeus o receio de uma resposta violenta caso o Tribunal de Justiça Europeu se pronuncie de novo em favor da soberania do povo do Saara Ocidental", prosseguiu o dirigente saarauí, numa referência aos incidentes diplomáticos que opõem Rabat a Berlim, e em particular a Madrid, após o secretário-geral do movimento da Frente Polisário, Brahim Ghali, ter sido internado em abril passado num hospital da cidade espanhola de Logroño.
"Receberam o nosso presidente como um gesto humanitário, é uma decisão da Espanha", sustentou.
"Marrocos ganhou o hábito de fazer chantagem sobre todos e por vezes os países veem-se obrigados, num exercício de soberania, a tomar as decisões necessárias. É um conflito entre Espanha e Marrocos e julgo que os espanhóis explicaram muito bem a sua posição", considerou.
No que foi considerado um gesto de retaliação, cerca de 8.000 migrantes provenientes de Marrocos chegaram em apenas dois dias ao enclave espanhol de Ceuta, localizado no norte do país magrebino, um fluxo migratório de dimensões inéditas e que segundo a agência noticiosa Efe se deveu a um "relaxamento da vigilância policial em toda esta região do território marroquino".
"A instrumentalização por Marrocos da Carta da Imigração não é nova, é um reflexo clássico dos marroquinos, para pressionar os países vizinhos", prosseguiu Oubi Bouchraya, que também recordou outros contenciosos entre Marrocos e países limítrofes.
"Não é apenas Espanha que é afetada por esta política de desestabilização e más relações de vizinhança. Nós sofremos com a ocupação, a Argélia tem as fronteiras encerradas, a delimitação das fronteiras marítimas com as ilhas Canárias também implica conflitualidade com a Espanha, há aparentemente um problema bilateral entre Marrocos e a Mauritânia. Marrocos tem problemas com toda a sua vizinhança imediata", sugeriu.
E concluiu: "O problema entre Marrocos e Espanha insere-se num quadro mais vasto que engloba praticamente toda a região: a ocupação do Saara Ocidental, as fronteiras encerradas com a Argélia, a tensão com a Mauritânia e agora com Espanha. É um país que tem problemas com praticamente todos".
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