Ao longo das mais de seis horas de depoimento na CPI, que investiga alegadas falhas na gestão da pandemia de covid-19, Mayra Pinheiro relatou a sua atuação na crise em Manaus, no estado do Amazonas, onde dezenas de pacientes morreram asfixiados por falta de oxigénio em hospitais, em janeiro último.
A secretária de Gestão do Trabalho e Educação disse nunca ter visto nada igual em 30 anos de carreira na medicina, mas isentou o Governo Federal de responsabilidade no colapso hospitalar na região, versão que foi criticada por senadores.
"Como é que uma técnica com este nível de formação, com toda a assessoria do Ministério da Saúde presente em Manaus, vê um quadro desse e não identifica que haveria colapso por falta de oxigénio? Como? Ninguém vai me convencer de que vocês não tinham conhecimento porque o caos estava lá, a olhos vistos. A solução estava ali do lado e não conseguiram resolver", contestou o senador Eduardo Braga.
Mayra contradisse ainda o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello sobre o momento em que a tutela da Saúde foi informada do problema no abastecimento de oxigénio hospitalar em Manaus, no início do ano.
Pazuello afirmou que foi avisado sobre a crise em 10 de janeiro, porém, a secretária declarou que conversou sobre o assunto com o general dois dias antes, em 08 de janeiro.
Um dos momentos mais aguardados do depoimento da médica pediatra era a abordagem à sua forte defesa da cloroquina, um fármaco tradicionalmente usado em casos de malária, mas sem eficácia contra a covid-19.
Mayra Pinheiro, também conhecida como "capitã cloroquina", usou o seu depoimento para voltar a defender o uso do medicamento na fase de replicação viral, no início da doença, e admitiu que o Ministério deu orientações para a utilização do fármaco contra a covid-19.
A médica confirmou que encaminhou um ofício à Secretaria de Saúde de Manaus indicando a cloroquina entre os medicamentos a usar, ressaltando que havia "comprovação científica sobre o papel das medicações antivirais orientadas pelo Ministério da Saúde".
No ofício, a secretária reforçou que seria "inadmissível" a não adoção da orientação, segundo a imprensa local.
A secretária defendeu também a autonomia médica e o "livre-arbítrio" dos profissionais de Saúde e dos seus pacientes durante os tratamentos, mas a sua posição acabou criticada por senadores.
Segundo Eduardo Braga, a médica não tem nenhuma publicação na área de medicamentos e, mesmo assim, contrapôs-se aos pareceres científicos internacionais.
Mayra Pinheiro lançou ainda críticas à Organização Mundial de Saúde (OMS), argumentando que a entidade já fez recomendações "condenáveis" e teve "falhas", acrescentando que os países não são obrigados a seguir as orientações da OMS.
A intenção da CPI, com o depoimento da médica, é esclarecer se o Governo, através da insistência no uso da cloroquina, contribuiu para agravar a situação da pandemia e se incorreu em desvio de dinheiro público, ao ordenar a fabricação massiva e a importação do fármaco.
O relator da CPI, senador Renan Calheiros, apontou, pelo menos, 11 contradições e mentiras no depoimento de Mayra Pinheiro, entre elas o tratamento precoce contra a covid-19 ou a crise em Manaus.
O presidente da CPI, Omar Aziz, disse na terça-feira que o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, e o ex-ministro Eduardo Pazuello, serão reconvocados para prestar depoimentos.
O Brasil, um dos países mais afetados pela pandemia em todo o mundo, totaliza 452.031 mortes e 16.194.209 milhões de casos.
A pandemia de covid-19 provocou, pelo menos, 3.475.079 mortos no mundo, resultantes de mais de 167,1 milhões de casos de infeção, segundo um balanço feito pela agência francesa AFP.
Leia Também: Ex-Presidente do Brasil Dilma Rousseff recebe alta após mal-estar