Instada a reagir à decisão do Tribunal de Última Instância (TUI), anunciada no sábado, de manter a exclusão dos candidatos pró-democratas ao parlamento local, a fonte do gabinete de Augusto Santos Silva indicou que "os recentes desenvolvimentos em Macau foram um dos pontos da agenda da recente reunião, por videoconferência, entre os ministros dos Negócios Estrangeiros de Portugal e da China, realizada no passado mês de julho".
"Ambas as partes concordaram que Macau é um caso específico, que não pode ser comparado com nenhum outro - tendo Portugal relembrado a importância da Lei Básica no processo de transição - e que todas as questões relevantes são imediatamente tratadas pelas vias diplomáticas adequadas", acrescentou a fonte oficial do MNE.
O órgão máximo legislativo da China aprovou recentemente uma proposta de reforma eleitoral em Hong Kong, que reforçou a presença de Pequim e restringiu a oposição pró-democracia, através do reforço do controlo dos candidatos às eleições legislativas.
No caso de Macau, o TUI informou que manteve a exclusão dos candidatos pró-democratas ao parlamento local decidida pela comissão eleitoral, tendo dado "como assente", de acordo com informações da Comissão para os Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa (CAEAL), que pelo menos dois dos candidatos que integravam cada uma das três listas integraram atividades de apoio incompatíveis com a miniconstituição do território, a Lei Básica, ou que provam ser "infiéis à RAEM [Região Administrativa Especial de Macau] da RPC [República Popular da China]".
O TUI detalhou que em causa esteve o apoio a atividades relacionadas com o "04 de junho", conhecido como o "Massacre de Tiananmen", "Carta Constitucional 08" ou "Revolução de Jasmim", nas quais se exigiram em diferentes momentos reformas democráticas na China.
Os juízes do TUI apenas analisaram as informações relativas aos dois primeiros candidatos de cada uma das três listas, que integravam, todas elas, cinco elementos. Isto porque, justificaram, verificando-se o afastamento dos dois primeiros, as listas já não cumpriam com um dos requisitos legais, a inclusão de pelo menos três candidatos.
Os juízes julgaram por unanimidade "improcedentes os recursos contenciosos eleitorais interpostos (...), mantendo a decisão da CAEAL de recusar as três listas de candidatura", anunciou o TUI.
Em 09 de julho, a CAEAL anunciou a exclusão de cinco listas e 20 candidatos das eleições para a Assembleia Legislativa (AL) de Macau, agendadas para 12 de setembro, 15 dos quais associados ao campo pró-democracia, por não serem "fiéis" a Macau.
Em Macau, o embaixador de Portugal na China afirmou que o país acompanha com "muita atenção" a exclusão de 15 candidatos pró-democracia das próximas eleições.
A AL é composta por 33 deputados, 14 eleitos por sufrágio universal, 12 escolhidos por sufrágio indireto (através de associações) e sete nomeados pelo chefe do Executivo macaense.
A transferência da administração de Macau de Portugal para a China ocorreu no final de 1999.
A Lei Básica de Macau, 'miniconstituição' do território que deverá estar em vigor até 2049, define que "os residentes de Macau gozam da liberdade de expressão, de imprensa, de edição, de associação, de reunião, de desfile e de manifestação".
O advogado dos candidatos pró-democratas excluídos das eleições para o parlamento local, Jorge Menezes, disse à Lusa no sábado que a decisão anunciada pelo TUI "rasga a declaração conjunta entre Portugal e a China".
"Toda a oposição democrática e crítica do governo foi desqualificada. O jogo passou a ter uma baliza só: neste 'jogo' político só se pode perder", afirmou o causídico.
Para o advogado, as "três listas de candidatos foram desqualificadas num processo de investigação policial secreto, abusivo e ilegal, com base em normas aprovadas secretamente por um órgão incompetente para o efeito e aplicadas retroativamente".
Isto, acrescentou, "sem conceder aos visados a possibilidade de participarem no processo de desqualificação e de apresentarem prova contrária e direito de defesa", concluindo que "maior violação do conceito de Estado de direito seria difícil".
Menezes considerou ainda "lamentável a emissão de declarações por parte de entidades oficiais da República Popular da China sobre a legalidade de uma decisão antes ainda de ela ter sido julgada por um tribunal de Macau".
Para Jorge Menezes, tal "constitui uma violação da autonomia de Macau face à China e do princípio da separação de poderes, que impõe a proibição de pressões sobre os tribunais por parte do poder político ou executivo".
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