O setor maioritário no executivo, do Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE), mostra publicamente o seu apoio total e inequívoco à NATO (Aliança Atlântica), enquanto o minoritário, do Unidas Podemos (extrema-esquerda), classifica essa posição de "irresponsável", recuperando o "não à guerra" que a esquerda utilizou em 2003 contra a "foto dos Açores" em que estava José Maria Aznar, o primeiro-ministro da altura, do Partido Popular (PP, direita).
Esta divisão contrasta com o apoio da totalidade da oposição de direita -- PP, Vox (extrema-direita) e Cidadãos (direita -liberal) - ao atual chefe do executivo, o socialista Pedro Sánchez.
O Unidas Podemos assinou mesmo um manifesto de "recusa frontal" ao envio de tropas para o Mar Negro e a Bulgária, juntamente com outros pequenos partidos da esquerda espanhola que normalmente apoiam no parlamento as iniciativas do Governo: Bildu (independentistas bascos), Compromís (nacionalistas valencianos), BNG (nacionalistas galegos), e Mais País (cisão em Madrid do Podemos).
"Não nos podemos permitir ficar presos a um velho esquema da Guerra Fria", defende o texto assinado pelos parceiros de Sánchez, ao mesmo tempo que apelam ao primeiro-ministro para respeitar a "soberania dos povos" e rejeitar "ameaças militares de um país a outro Estado soberano, bem como qualquer mudança de fronteira através da agressão militar".
Entretanto, Pedro Sánchez teve uma série de contactos com líderes internacionais durante o fim de semana para tratar da situação na Ucrânia, tendo reiterado ao secretário-geral da NATO, Jens Stoltenberg, o compromisso da Espanha para com a Aliança Atlântica e a segurança da Europa.
"Apoiamos a soberania e a integridade territorial da Ucrânia e confiamos que a diplomacia e o diálogo serão o caminho para a diminuição da intensificação desta crise", afirmou no domingo Pedro Sánchez na sua conta da rede social Twitter.
Irritou ainda muito os parceiros do PSOE, que Madrid tenha decidido enviar para a zona uma fragata, dois caça-minas e se tenha oferecido para enviar aviões de combate para a Bulgária.
O líder do principal partido da oposição, Pablo Casado (PP), apesar de apoiar a posição oficial de Madrid, fez este fim de semana um apanhado de opiniões e comentários de membros do Unidas Podemos no Governo que foram contrários à posição oficial do executivo e perguntou a Sánchez se ele "iria pôr o seu Governo em ordem".
O presidente do PP salientou que esses membros do executivo "estão a insultar a NATO e a sua ministra da Defesa", Margarita Robles, em relação à crise com a Ucrânia.
"Se o governo espanhol é um só, tem de haver uma posição clara sobre um conflito tão grave como o da Ucrânia", sublinhou ele.
O ex-líder do Podemos e antigo vice-presidente do Governo de Sánchez, Pablo Iglesias, atacou por motivos diferentes a ministra da Defesa, por esta se ter referido ao confronto da NATO com a Rússia na Ucrânia como "uma guerra humanitária".
"Acha que as pessoas são estúpidas e não sabem que a NATO é uma aliança militar para proteger os interesses dos Estados Unidos?", disse Iglesias, acrescentando: "Já não sou político, posso dizer a verdade".
A esquerda espanhola recorda o que aconteceu em 2003 numa cimeira nos Açores em que foi decidido lançar um ultimato ao Iraque com base na existência de armas de destruição em massa, nomeadamente químicas, que viria a revelar-se infundada, como reconheceram, anos mais tarde, todos os participantes da Cimeira das Lajes.
George W. Bush (Estados Unidos), Tony Blair (Reino Unido) e José Maria Aznar (Espanha), recebidos pelo primeiro-ministro português da altura, José Manuel Durão Barroso, reuniram-se no arquipélago dos Açores, na tarde de 16 de março de 2003, para uma cimeira que culminou, quatro dias depois, na madrugada de 20 do mesmo mês, com o início da intervenção militar no Iraque.
Os chefes de diplomacia da União Europeia discutem hoje em Bruxelas a tensão no Leste da Europa, à luz do conflito entre Ucrânia e Rússia, numa reunião na qual participa por videoconferência o chefe da diplomacia norte-americana, Anthony Blinken.
Os ministros dos Negócios Estrangeiros dos 27 voltam a reunir-se sem que a situação de tensão entre Ucrânia e Rússia tenha desanuviado, persistindo a séria ameaça de um ataque russo, apesar de todos os esforços que estão a ser feitos no plano diplomático, designadamente através dos Estados Unidos, o interlocutor com o qual Moscovo aceitou dialogar.
Ao longo da última semana, enquanto prosseguiram as negociações entre Washington e Moscovo em torno das exigências russas para não atacar a Ucrânia, que considera uma ameaça à sua segurança nacional, a União Europeia insistiu que qualquer nova agressão militar russa contra a integridade territorial e soberania da Ucrânia terá um preço elevado, acenando com a ameaça de "sanções económicas e financeiras maciças".
Leia Também: "Ameaça". Após EUA, Reino Unido também retira alguns diplomatas de Kiev