Logo depois da morte num bombardeamento norte-americano na Síria do líder do EI, conhecido como Abu Ibrahim al-Hachimi al-Qurachi, os Estados Unidos ofereceram uma recompensa de 10 milhões de dólares por qualquer informação que permita "identificar ou localizar" o líder do EI da Província de Khorasan (EI-K, o braço do EI no Afeganistão), também conhecido pelo nome de Shahab al-Muhajir.
"Ghafari é responsável pela aprovação de todas as operações do EI-K (...) e por encontrar financiamento para realizar essas operações", indicou o Departamento de Estado, que o incluiu em novembro na lista negra norte-americana de "terroristas" estrangeiros.
Mas quanto ao resto, o seu percurso continua repleto de incógnitas, até à sua origem: alguns afirmam que é afegão, outros, iraquiano.
"Sabemos pouco sobre Al-Muhajir", refere a organização não-governamental (ONG) Counter-Extremism Project (CEP), citada pela agência noticiosa francesa AFP.
Dirigente do EI-K desde meados de 2020, ele é apresentado pela propaganda como um líder militar, um dos "leões urbanos" do EI em Cabul "que participaram no planeamento e realização de operações de guerrilha e ataques suicidas complexos", segundo o CEP.
Inicialmente ligado à rede ultraconservadora Haqqani, uma fação dos talibãs historicamente próxima da Al-Qaida, Ghafari "contribuiu com o seu grande conhecimento e o seu acesso às redes" para permitir ao EI-K sobreviver aos violentos ataques dos talibãs e dos norte-americanos em 2020, precisou a ONG.
Desde então, o EI-K mostrou uma eficácia devastadora. A empresa Jihad Analytics (JA), especializada na análise da 'jihad' global e cibernética, sublinha que o grupo reivindicou 340 ataques em 2021, igualando o seu recorde de 2018, altura em que o grupo foi classificado como uma das quatro organizações terroristas mais mortíferas do planeta pelo Índice Global do Terrorismo.
"O EI-K ganhou um novo fôlego em 2020", afirmou o analista Damien Ferré, fundador da JA, e "em 2021, recuperou terreno ao conseguir realizar ataques sangrentos e sobretudo ao diversificar as zonas de ataque no país, após o regresso dos talibãs, no final de agosto".
É atribuído a Ghafari, por exemplo, o atentado no aeroporto de Cabul a 26 de agosto (185 mortos, entre os quais 13 soldados norte-americanos), mas também operações sofisticadas como o cerco à prisão de Jalalabad durante 20 horas, em 2020, recordaram recentemente os investigadores Amira Jadoon e Andrew Mines na revista War On The Rocks.
"O seu objetivo foi tirar a organização desse período de relativo declínio duplicando os ataques a minorias vulneráveis e, depois, lançando uma guerra reforçada contra os talibãs", salientaram.
Muito dinâmico, Ghafari desenvolveu também uma estratégia alinhada com as ambições planetárias do EI-central e enraizada na realidade local afegã, terreno fértil para uma infinidade de pequenos grupos 'jihadistas'.
Ele pediu, assim, "aos seus comandantes intermédios para realizarem atividades sociais nas zonas controladas pelo EI-K, o que reforçaria a sua imagem de líder" e lhe permitiu suplantar muitos chefes tribais, considerou Asif Fuard, investigador da Universidade de Defesa General Sir John Kotelawala, no Sri Lanka.
"O EI-K estará em condições de minar o poder dos talibãs iniciando uma diplomacia intertribal e seduzindo a população local desiludida com o Governo", acrescentou.
Mas as ambições deste homem de apenas 27 anos, segundo o CEP, não se limitam ao Afeganistão: o grupo de especialistas das Nações Unidas sobre terrorismo indica que o EI-K está a desenvolver "um programa regional mais amplo, ameaçando os países vizinhos da Ásia central e da Ásia do sul".
E Ghafari gere atualmente, indica o CEP, o departamento Al-Sadiq do EI, que abrange uma região que inclui Afeganistão, Bangladesh, Índia, Maldivas, Paquistão, Sri Lanka e Estados da Ásia central.
Altamente apreciado pelo EI-central -- o órgão oficial Al-Naba tem-no afirmado com frequência nos últimos meses -, o líder 'jihadista' mantém com ele estreitas ligações, enquanto outros braços da organização adotam uma gestão mais local e mais autónoma.
Ele pode igualmente esperar atrair ainda mais combatentes estrangeiros, como aconteceu com o EI na Síria e no Iraque no período do autoproclamado califado (2014-2019). O grupo terá neste momento cerca de 4.000 combatentes, segundo os especialistas da ONU.
Os ataques suicidas do EI-K, num contexto de crise económica e de permeabilidade das fronteiras, "poderão transformar o Afeganistão num novo polo de concentração de apoiantes do EI do Médio Oriente e da Ásia central e do sul", teme Uran Botobekov, especialista quirguiz no movimento 'jihadista'.
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