O jornal satírico Charlie Hebdo, palco de um violento massacre em janeiro de 2015, afirmou que "nada justifica" o ataque ao escritor Salman Rushdie, esfaqueado na sexta-feira antes de uma palestra em Nova Iorque.
"No momento em que escrevo, não sabemos os motivos do autor do ataque com faca contra Salman Rushdie. Revoltou-se contra o aquecimento global, contra o declínio do poder aquisitivo ou contra a proibição de regar vasos por causa da onda de calor?", escreveu com ironia Riss, o editor-chefe do Charlie Hebdo e um dos poucos sobreviventes do ataque de 2015, numa publicação no site do jornal. "A liberdade de expressão não tem valor para Deus."
"Il va falloir répéter encore et encore que rien ne justifie une fatwa. De quel droit des individus, dont on se fout totalement de savoir qu’ils sont des religieux, s’arrogent le droit de dire que quelqu’un doit mourir ?" #SalmanRushdie https://t.co/XCoQJTVIQN
— Charlie Hebdo (@Charlie_Hebdo_) August 12, 2022
O editor-chefe do Charlie Hebdo defendeu ainda que "de forma alguma" o livro 'Os Versos Satânicos' foi desrespeitoso com o Islão.
"Bem, não teremos que repetir várias vezes que nada, absolutamente nada justifica uma 'fatwa' (decreto da lei islâmica), uma sentença de morte, de ninguém por nada", insiste Riss, castigando "líderes espirituais medíocres, intelectualmente estúpidos e muitas vezes culturalmente ignorantes".
"A liberdade de pensar, refletir e se expressar não tem valor para Deus e para os seus servos. E no Islão, cuja história muitas vezes foi escrita com violência e submissão, esses valores simplesmente não têm lugar porque são muitas ameaças contra o seu domínio na mente das pessoas", argumenta Riss.
Salman Rushdie é o autor de "Os Versículos Satânicos", obra pela qual foi condenado à morte pelo Irão do líder religioso Ayatollah Khomeini, que emitiu uma 'fatwa' (decreto da lei islâmica) contra o escritor, distinguido com o prémio Booker.
O escritor chegou a viver em paradeiro desconhecido, sob segurança.
O Irão ofereceu então uma recompensa de três milhões de dólares a qualquer pessoa que assassinasse Rushdie.
O Governo do Irão há muito que se distanciou do decreto de Khomeini, mas o sentimento anti-Rushdie permanece.
Em 2012, uma fundação religiosa iraniana aumentou a recompensa pelo assassinato de Rushdie para 3,3 milhões de dólares.
Rushdie desvalorizou a ameaça na altura, dizendo que não havia "nenhuma prova" de que houvesse alguém interessado na recompensa.
Nesse ano, o escritor publicou o livro de memórias 'Joseph Anton - Uma Memória', sobre a 'fatwa'.
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