Desinformação por autocracias é "desafio" para democracias como o Brasil

O especialista Doowan Lee considera que a ameaça da desinformação e manipulação, proveniente de governos autocráticos como o chinês ou russo, é um desafio global para estados democráticos, incluindo aqueles ideologicamente muito marcados, como o atual do Brasil.

Notícia

© AHMAD GHARABLI/AFP via Getty Images

Lusa
22/04/2023 08:18 ‧ 22/04/2023 por Lusa

Mundo

Brasil

Recentemente, o Presidente brasileiro, Lula da Silva, recebeu fortes críticas por ter defendido que a solução pacífica para acabar com a guerra na Ucrânia é este país ceder territórios ao invasor russo, considerando que as culpas têm de ser repartidas pelos dois lados, numa narrativa alinhada com o Kremlin, mas também associada às campanhas de desinformação, que se intensificaram desde a invasão russa em fevereiro do ano passado.

Ainda que Lula da Silva, que se encontra de visita a Portugal, tenha depois emendado as suas palavras e dito que o Brasil condena a violação da integridade territorial da Ucrânia, estas são declarações que não se esperam de países democráticos, disse Doowan Lee, professor de Segurança Internacional da Universidade de São Francisco, em entrevista à Lusa em Lisboa.

O especialista esteve na semana passada em Portugal a convite Universidade do Minho e também para proferir uma palestra na Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento (FLAD), em Lisboa, sobre "Soberania e Democracia em Risco: Estratégias de Soluções Cibernéticas e de Informação Contra o Extremismo e a Autocracia".

Os governos, sustentou, têm de fazer parte da solução face à poderosa máquina de desinformação e manipulação de países como a Rússia ou a China, mas "se tentarem resolver esse problema sozinhos, pode ser realmente muito prejudicial e, na verdade, torná-lo muito pior".

O especialista em política de segurança afirmou que "as histórias enganosas podem influenciar uma grande população em casa e no exterior", sendo necessária mais alfabetização contra esta ameaça e o envolvimento de parcerias público-privadas, de jornalistas, investigadores, organizações não-governamentais e da sociedade civil.

"Acho que isso funciona como um bom contrapeso a um governo muito ideológico e é também por isso que os governos sozinhos não podem resolver este problema", disse.

Sobre a fuga recente de documentos secretos norte-americanos, com informação sensível sobre a Ucrânia e sobre os aliados, Doowan Lee comentou que o assunto tem gravidade, mas não foram perdidos dados muito críticos para os seus adversários nem prejudicadas as relações diplomáticas globais com o ocidente.

"A aliança, as relações diplomáticas que temos entre as democracias ocidentais são muito mais robustas, muito mais baseadas em regras e muito mais institucionalizadas", observou, acrescentando que essa é "uma vantagem sobre os regimes autocráticos".

O que de grave o académico vê na fuga de informações é a forma como ela foi de imediato manipulada na ideia de que as democracias ocidentais não sabem lidar com informações confidenciais.

"De certa forma, a história sobre esse incidente é o que regimes autocráticos e extremistas estão a manipular para atacar governos democráticos e isso é realmente muito consistente com o que o Kremlin e o Partido Comunista Chinês têm tentado fazer no ambiente de informação", afirmou.

O objetivo, salientou, "é mostrar que as democracias ocidentais são corruptas, as democracias ocidentais são incompetentes, as democracias ocidentais são ineficientes" e que os modelos de governação autocráticos são melhores.

Esta é uma ameaça de segurança muito maior para as democracias ocidentais agora e que vai aumentar, advertiu, elencando, porém, saídas para combatê-la.

A primeira está relacionada com a forma com governos e instituições públicas se devem sentir muito mais ambientados a trabalhar com tecnologia e dados, uma vez que a ameaça se desenvolve na abertura do espaço da informação.

"Não acho que devamos tentar fechar esse ambiente, isso seria muito incoerente com as normas e ideais das sociedades abertas, no entanto, podemos trazer mais transparência", referiu, apontando, por exemplo, "marcas de água" ao indexar de onde de histórias surgiram.

"Quando a maioria das pessoas percebe que tais histórias enganosas vêm de regimes autocráticos, que são meios de propaganda autocráticos ou extremistas, ou de pessoas que não vivem no seu próprio país, então percebem que não vão partilhá-las (...) porque ninguém quer sentir-se manipulado ou enganado", afirmou.

Isso leva a um segundo ponto, relacionado com a literacia digital, como já decorre em vários países nórdicos, onde crianças aprendem a questionar informações duvidosas antes de terem um 'smartphone'.

"Antes mesmo de começar a divertir-se como o que está disponível no YouTube, TikTok, Telegram e a exporem-se a esse tipo de plataforma, elas aprendem a questionar, a avaliar, e lidar com informações 'online', exemplificou.

É por isso, prosseguiu, que informação manipulada pela Rússia não tem grande acolhimento nesses países, pelo que destacou a ideia de que a tecnologia também não consegue combater o problema sozinha, tal como os governos também não.

Leia Também: AO MINUTO: Arranca agenda de Lula da Silva em visita de Estado a Portugal

Partilhe a notícia

Produto do ano 2024

Descarregue a nossa App gratuita

Oitavo ano consecutivo Escolha do Consumidor para Imprensa Online e eleito o produto do ano 2024.

* Estudo da e Netsonda, nov. e dez. 2023 produtodoano- pt.com
App androidApp iOS

Recomendados para si

Leia também

Últimas notícias


Newsletter

Receba os principais destaques todos os dias no seu email.

Mais lidas