Presidente de Timor-Leste preocupado com partidarização de artes marciais
O Presidente de Timor-Leste manifestou-se hoje preocupado com a "partidarização" de grupos de artes marciais e disse que vai avaliar a idoneidade de qualquer partido que queira integrar o futuro executivo.
© Lusa
Mundo Timor-Leste
"Estamos, ao longo de 20 anos, a querer construir um estado de direito democrático com leis e regras de integridade e transparência e estamos a assistir à partidarização de grupos de artes marciais que, com a capa da democracia, de eleições, instalam-se nas instituições do Estado", disse José Ramos-Horta à Lusa.
Escusando-se a referir em particular qualquer força política, Ramos-Horta relembrou que cabe ao presidente timorense, depois das eleições legislativas, dar posse ou não ao Governo que seja formado.
"Nesse momento terei em conta, e é minha obrigação solene, vários fatores, entre eles a idoneidade desses partidos", explicou, referindo que vai exigir "auditorias" a essas forças políticas.
"Para eu dar posse a alguém tenho que ter confiança. E o partido que integrar um Governo vai ter que ter evidência clara de que esse partido não está envolvido em crime organizado, não está envolvido em atividades que não correspondem às atividades normais de um partido democrático", afirmou.
Ramos-Horta insiste que "não vai haver carta branca" e que não vai dar posse "apenas pelo facto de um ou mais partidos se constituírem em coligação e terem maioria".
Os comentários do presidente surgem numa altura de crescente debate em Timor-Leste sobre as ligações entre grupos de artes marciais e partidos políticos.
Há pelo menos dois partidos políticos no atual panorama político com ligações diretas e significativas a grupos de artes marciais, nomeadamente o Kmanek Haburas Unidade Nacional Timor Oan (KHUNTO) -- que está no Governo e tem nas suas fileiras a quase totalidade dos membros do grupo de artes marciais KORKA -- e o estreante Partido Os Verdes de Timor (PVT), com fortes ligações ao grupo de artes marciais 77.
É comum nos comícios e ações partidárias destas forças que tanto dirigentes como militantes se apresentem com simbologia dos respetivos grupos de artes marciais, nomeadamente em gestos feitos com as mãos.
Este mês, a organização não-governamental timorense Fundasaun Mahein (FM) alertou para o que considera ser a crescente politização de grupos de artes marciais (GAM) no país, especialmente no contexto eleitoral, destacando os riscos de violência e instabilidade sociopolítica.
"Embora os GAM possam proporcionar vários benefícios a nível individual e comunitário, a Fundasaun Mahein continua preocupada com o facto de a crescente colaboração entre as GAM e os partidos políticos -- bem como a penetração de várias instituições estatais pelas GAM -- poder contribuir para o aumento da violência e da instabilidade sociopolítica", referiu.
A FM acrescentou que muitos funcionários do Governo e membros das forças de segurança são conhecidos por serem membros" dos grupos de artes marciais, explicando que "membros das forças de segurança às vezes "facilitaram ou toleraram a violência" destes grupos.
Grupos não regularizados, notou a FM, "também adotaram esta abordagem, organizando-se secretamente e ameaçando com violência se as exigências políticas não forem satisfeitas", sendo que o poder político dos líderes dos grupos de artes marciais "deriva da sua capacidade de reunir apoio em massa, organizar (principalmente) em segredo e dirigir membros para intimidar outros grupos ou criar instabilidade".
A FM considerou "hipócrita" que alguns dirigentes políticos culpabilizem os GAM por criar problemas de segurança, quando "os principais partidos políticos não só estão a reforçar o papel político das GAM utilizando-as para mobilizar apoios, como têm supervisionado a normalização do clientelismo, do nepotismo e da corrupção".
"O fracasso do Governo em satisfazer as necessidades básicas de muitos timorenses e fornecer segurança básica está também a impulsionar a adesão a GAM e o aumento do apoio a partidos alternativos como o KHUNTO, que prometem distribuir recursos diretamente aos seus membros", refere.
"Os partidos estabelecidos normalizaram o clientelismo como forma de manter o apoio político, pelo que não podemos ficar surpreendidos quando os GAM também adotam esta estratégia. Enquanto isso, as medidas governamentais destinadas a gerir os GAM não conseguiram até agora limitar o seu crescimento ou prevenir a violência", sublinha.
José Ramos-Horta disse hoje não ter ficado claro o motivo pelo qual o Tribunal de Recurso (TR) não respondeu, "de forma clara", a perguntas que colocou relativamente aos estatutos do KHUNTO.
"Eu vou querer saber porque é que o TR nunca respondeu claramente a algumas perguntas que fiz, por duas vezes, se não três, sobre os estatutos do KHUNTO. Sempre se esquivou a responder", disse.
"Questionei em particular se um dos artigos do estatuto é consistente e está em harmonia com a nossa constituição", sublinhou.
Ramos-Horta refere-se, em particular, ao artigo 24 dos estatutos do KHUNTO, que determina a sucessão "biológica" no que toca ao Conselho Superior do partido.
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