Analistas excluem alterações na política da China com afastamento de Qin

Analistas defenderam hoje que a remoção de Qin Gang do cargo de ministro dos Negócios Estrangeiros da China "não vai ter qualquer impacto" na política externa chinesa, "obviamente" guiada pelo líder, Xi Jinping.

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© GREG BAKER/AFP via Getty Images

Lusa
26/07/2023 08:48 ‧ 26/07/2023 por Lusa

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China

Qin, que permanece há mais de um mês sem aparecer em cerimónias públicas, foi removido na terça-feira e substituído pelo antecessor Wang Yi, anunciou o Comité Permanente da Assembleia Popular Nacional (APN), o órgão máximo legislativo da China.

A nomeação de Wang, que é também diretor do Gabinete da Comissão para as Relações Externas do Partido Comunista Chinês, o cargo mais alto na diplomacia do país asiático, é "outro sinal" de que o desaparecimento e remoção de Qin "não vão ter qualquer impacto na direção da política externa da China", observou o sinólogo Bill Bishop, no boletim diário.

"A política externa chinesa é obviamente guiada pelo Pensamento de Xi Jinping sobre Diplomacia", notou Bishop.

Em entrevista à agência Lusa, Peter Martin, jornalista e autor do livro "China's Civilian Army", concordou: "a política interna é a prioridade, já que o sistema político chinês favorece a lealdade à liderança e obriga [os diplomatas] a estarem atentos para saber de onde podem vir os próximos riscos" políticos.

"Os diplomatas chineses olham, em primeiro lugar, para o público em Pequim, antes de pensarem nos seus homólogos estrangeiros", resumiu.

Nos últimos anos, sob a liderança de Xi Jinping, a diplomacia chinesa abdicou de um "perfil discreto", para adotar uma postura mais assertiva.

Observadores passaram a designar os diplomatas chineses como 'Lobos Guerreiros', numa referência ao filme de ação chinês "Wolf Warrior", que conta a história de um soldado chinês numa zona de guerra em África, onde salva centenas de pessoas de uma chacina conduzida por mercenários ocidentais que tentam apoderar-se do país.

O filme, um dos mais vistos de sempre na China, parece ilustrar a nova visão do país asiático sobre si mesmo: uma potência global, pronta a defender os seus interesses além-fronteiras. "Quem ofender a nação chinesa será punido, não importa o quão longe está" é, de resto, uma das mais emblemáticas frases de "Wolf Warrior".

No entanto, o novo perfil da política externa chinesa abalou as relações entre Pequim e vários países.

Na Suécia, por exemplo, o embaixador Gui Congyou foi convocado pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros por mais de 40 vezes, no espaço de dois anos. Numa ocasião, o diplomata comparou a Suécia a um pugilista de 48 quilogramas e a China a um de 86 quilogramas: "o pugilista leve não escuta, ele continua a provocar (...) que escolha é que o pugilista de 86 quilos tem", questionou.

Não é ainda claro se Wang Yi, que desempenhou as funções de ministro dos Negócios Estrangeiros entre 2013 e 2022, vai ocupar o cargo interinamente, até que um funcionário mais novo seja designado.

O comunicado da APN apresenta uma só frase, sem dar nenhuma razão para a substituição. Qin Gang continua também a ocupar o cargo de Conselheiro de Estado.

Bishop notou que, no comunicado, a palavra utilizada é "removido" e não "demitido".

Isto, junto com a manutenção no cargo de Conselheiro de Estado, pode indicar que uma investigação disciplinar a Qin Gang está em curso.

"A lei orgânica da APN diferencia claramente as duas palavras e permite que o Comité Permanente adote uma ou outra", notou o sinólogo. "Uma questão que tenho tentado apurar é se a demissão geralmente ocorre quando uma investigação disciplinar é concluída, enquanto a remoção ocorre quando a investigação continua em curso", observou.

No caso de Qin, a remoção pode ter ocorrido mais rapidamente do que aconteceria com outros funcionários sob investigação, já que a ausência inexplicável estava a afetar o trabalho diplomático e a imagem da China.

No início deste mês, a porta-voz da diplomacia chinesa Mao Ning justificou a ausência de Qin Gang de um encontro de ministros dos Negócios Estrangeiros da Associação de Nações do Sudeste Asiático, em Jacarta, por "motivos de saúde".

No entanto, a decisão do Ministério de apagar hoje várias referências ao ex-ministro do portal, é "um indicador" de que Qin cometeu uma violação da disciplina: "se ele fosse um camarada com boa reputação que estivesse doente, não tenho certeza de que seria sujeito a uma exclusão digital", escreveu Bishop.

"Adivinho, e aqui a palavra-chave é adivinhar, que as próximas notícias que vamos receber sobre Qin é de que ele está sob investigação", indicou.

Leia Também: Ministério chinês apaga do portal referências ao MNE demitido

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