O governo israelita ameaçou na quinta-feira o jornal Haaretz, uma das mais importantes e influentes publicações do país, por considerar que o jornal está a "sabotar Israel em tempo de guerra" ao ser crítico das medidas do regime, acusando-o de ser um "megafone inflamatório".
Shlomo Karhi, o ministro das comunicações israelitas e membro do Likud (o partido de Netanyahu), considera que tempos de guerra permitem maiores restrições à imprensa nacional e internacional e, numa carta divulgada nas redes sociais, avisou que o governo iria cancelar todas as subscrições ao jornal de todos os funcionários e instituições públicas - incluindo membros do exército, polícia, sistema prisional, ministérios , entre outros - e que iria proibir a divulgação de comunicados do governo no jornal.
Na carta aberta ao secretário do governo, Yossi Fuchs, Karhi afirmou que o Haaretz "mina os objetivos da guerra e menospreza o esforço militar e a sua força social".
"É possível que algumas das publicações do jornal ultrapassem os padrões criminais implementados em tempo de guerra pelo código penal", disse o ministro, apesar do próprio jornal constatar que o documento e a proposta não foram verificados por autoridades judiciais.
לאור הפצה באופן עקבי של "תעמולה תבוסתנית ושקרית, וחתירה נגד מדינת ישראל בשעת המלחמה" בעיתון הארץ, הגשתי כעת לממשלה, הצעת מחליטים להפסקת המימון של עיתון הארץ, כולל הפסקת הפרסום ודמי המנוי של כלל המשתמשים בשירות המדינה, כולל צה"ל, משטרה, שב"ס, משרדי ממשלה וכל חברה ממשלתית. pic.twitter.com/qdbH1K96kX
— 🇮🇱שלמה קרעי - Shlomo Karhi (@shlomo_karhi) November 23, 2023
O Haaretz é conhecido por ser o jornal mais crítico das políticas de Benjamin Netanyahu e do seu executivo de extrema-direita, sendo a publicação mais próxima da esquerda israelita. A publicação é também declaradamente contra a ocupação da Cisjordânia e a favor de negociações de paz entre Israel e a Palestina - embora, na sua cobertura, não deixe de ser abertamente inclinada na defesa dos interesses israelitas sobre a comunidade árabe.
A fundação do periódico data de 1918, antes mesmo da fundação do estado de Israel, começando como um jornal promovido pelo mandato britânico na Palestina e passando, pouco depois, para as mãos de líderes sionistas que imigraram para a Palestina a partir da Rússia.
O jornal já reagiu às ameaças do ministro israelita e o 'publisher', Amos Schocken, apontou que "se o governo quer fechar o Haaretz, então é a altura de ler o Haaretz".
Já o sindicato dos jornalistas israelitas considerou que a proposta de Karhi é uma ameaça à liberdade de imprensa no país, notando que o governo tem passado o seu mandato em "tentativas falhadas de fechar a emissora pública e agora escolheu um novo alvo", acusando uma "medida populista sem lógica". "Apoiamos os jornalistas do Haaretz e estamos certos que continuarão a trabalhar para o benefício de Israel, e não serão dissuadidos pelas ameaças vazias e estúpidas do ministro".
Esta não é a primeira vez que o estado israelita procura limitar a cobertura noticiosa sobre a guerra, sendo conhecidas as várias limitações à divulgação de imagens captadas na Faixa de Gaza. A CNN Internacional revelou, há várias semanas, que o exército obrigou os jornalistas a assinar um documento que permitiria às forças israelitas validar as imagens captadas nas visitas com o exército.
Mais recentemente, o mesmo Shlomo Karhi pediu que o governo fechasse a Al Jazeera, a estação qatari responsável pela maior cobertura sobre Médio Oriente no mundo, mas o governo recusou devido ao papel do Qatar nas negociações do cessar-fogo.
Os bombardeamentos e ataques israelitas na Faixa de Gaza já provocaram a morte de mais de 50 jornalistas, a maioria palestinianos, segundo dados do Comité para a Proteção de Jornalistas. A organização não-governamental Reporters Without Borders considerou que o "jornalismo está a ser erradicado na Faixa de Gaza devido à recusa de Israel em ouvir pedidos de ajuda para proteger profissionais de média".
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