"Eu não estou a pedir nada de extraordinário, simplesmente estou a pedir para trabalhar e fazer a coisa que eu mais amo, que é ser médico", disse à agência Lusa o médico de cirurgia geral, um dos 33 especialistas cubanos que chegaram em abril de 2020 a Cabo Verde, um mês após os primeiros casos de covid-19 no arquipélago.
Durante três anos, exerceu a maior parte do tempo no Hospital Batista de Sousa (HBS), em São Vicente, com várias funções, no âmbito da cooperação médica entre os dois países, que já conta com quase 50 anos.
Antes de terminar o período de cooperação, trouxe a família para Cabo Verde, atualmente reside na ilha do Sal, e já tentou ingressar na Ordem dos Médicos Cabo-verdianos (OMC), mas a condição é ter um contrato de trabalho com o Ministério da Saúde.
Por isso, disse que já pediu audiências à ministra da Saúde, Filomena Gonçalves, e já enviou e-mails a outros responsáveis do setor, manifestando interesse em continuar a trabalhar no Sistema Nacional de Saúde (SNS) de Cabo Verde.
"Mas até hoje ninguém me respondeu", lamentou o clínico, com formação em cirurgia vascular, mostrando-se dececionado, porque nunca pensou "que ia ter tantos problemas, tantas barreiras do ponto de vista legal e político".
Mas garantiu que vai continuar a bater em várias portas, com a esperança na resolução da sua situação, mesmo acreditando que quem está por detrás é a embaixada de Cuba em Cabo Verde.
"Estamos cientes da grande pressão diplomática que está a ser submetida ao Ministério da Saúde para que não aconteça essa contratação de um médico cubano livre em Cabo Verde", afirmou Cabrera, um dos sete médicos que estão a pedir "mais uma oportunidade" no país africano.
O caso já é do conhecimento do movimento internacional S.O.S Cuba, em Cabo Verde, que também se tem multiplicado nos apelos para uma resolução o quanto antes, conforme disse à Lusa, na Praia, Yanira Monteiro, porta-voz do grupo de conterrâneos residentes no país.
"É uma situação que nos preocupa muito", descreveu a jurista residente em Cabo Verde desde 1995, salientando que se trata de um ser humano que está numa situação de "fragilidade grave", juntamente com a mulher e uma criança de quatro anos.
O médico é agora considerado um "traidor" em Cuba, e por lei, não pode voltar ao país nos próximos oito anos e se entrar na ilha antes corre o risco de enfrentar uma pena de prisão de três a oito anos.
"Mas não quero voltar para Cuba porque simplesmente escolhi Cabo Verde como a minha segunda pátria. É o lugar onde eu quero que o meu filho cresça em paz, com tranquilidade e em liberdade", manifestou à Lusa, por videochamada, a partir da ilha do Sal.
O movimento S.O.S Cuba, que nasceu de forma espontânea em julho de 2021 em cada país de residentes cubanos, lamentou a "injustiça" e a "violação" dos direitos humanos, num país também de emigrantes e que precisa deste "técnico altamente qualificado".
Yanira Monteiro insurgiu-se ainda contra aquilo que considera de "campanha" da embaixada cubana em Cabo Verde para indiretamente "encobrir" as denúncias dos médicos, e explicou que há contratos semelhantes em outros países, com cláusula de proibição por parte do 'país-hóspede' de contratar os médicos "cooperantes" após a missão.
Instado a comentar o assunto, o Bastonário da Ordem dos Médicos cabo-verdiano, Danielson da Veiga, confirmou que já recebeu o pedido e explicou que há duas formas de inscrição na agremiação, uma direta de cabo-verdianos e outra de estrangeiros, que precisam de um contrato com serviços autorizados pelo Ministério da Saúde, ou exercer quando existe reciprocidade com outro país.
Por isso, disse que a ordem não pode fazer nada neste caso, lembrando que há "regras" no país e pediu "paciência" ao colega de profissão.
"Todo aquele que quis ficar em Cabo Verde seguiu trâmites normais", referiu, dizendo que Yosmel Cabrera "deixou uma marca negativa" e criou uma "situação difícil" entre os dois países com as suas críticas na comunicação social.
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