"Se não as procurares, não as encontras. Já me doem os olhos", disse à Lusa, na praia de Madorra, concelho de Nigrán, José Manuel, trabalhador de uma empresa contratada pela Xunta da Galiza para limpar as praias, referindo-se às "bolinhas" que desde a semana passada começaram a surgir em quantidade na costa norte espanhola, da Galiza ao País Basco.
Numa manhã de sol brilhante e maré baixa, José Manuel olha com algum desalento para a garrafa de plástico cortada onde, com as mãos grandes, vai colocando o plástico que mal se vê e é difícil de apanhar, numa tarefa aparentemente infindável, cumprida desde quarta-feira "a partir das 08:00", na expectativa de que chegue ajuda.
"Parece que há uns aspiradores. A ver se vêm. Se fossem mais, era mais fácil de apanhar", desabafou.
As pequenas partículas são usadas na produção de plástico e mil sacos com 26,2 toneladas caíram ao mar no início de dezembro em águas portuguesas, a 80 quilómetros de Viana do Castelo, segundo informações do armador do barco prestadas ao Governo espanhol.
De joelhos no areal e cabelos encaracolados quase a tocar a areia, Açucena Iglésias, de 54 anos, levou de casa um coador para ajudar na recolha das partículas, uma missão "muito difícil, porque são muito pequenas" e "algumas já estão desfeitas pelo mar".
"Vi na televisão, moro aqui e quis vir, porque as praias são de todos e é o dever de todos ajudar nesta desgraça ambiental", explicou.
Cristina Sexto, de 49 anos, e Maria José Muguerza, de 66, aproveitaram a caminhada matinal para se informarem sobre as ações de voluntariado para "apanhar as bolinhas".
"Vimos nas redes sociais e estamos interessadas em ajudar", observaram.
Um pouco mais à frente na recortada costa de 1.600 quilómetros da Galiza, treinadores da Escola de Surf Prado acompanham nove professores e 75 crianças, dos 9 aos 12 anos, numa ação de limpeza programada para apanhar os 'pellets'.
"Vieram à procura de 'pellets', mas ajudam também na recolha de outro lixo", disse o treinador Leonardo Zambrano, de 24 anos, enquanto segura o resto de um tubo de plástico verde encontrado na praia.
Núria Garabal, uma das professoras da escola n.º 1 de Tui, indica que o grupo escolar fez uma viagem de 30 minutos de autocarro para apanhar 'pellets' em Nigrán, na província de Pontevedra, porque está a "trabalhar nos objetivos do desenvolvimento sustentável".
A recolha revelou-se "muito difícil, porque são pequenas e transparentes", alertou.
Ricardo, aluno de 10 anos, resume: "Um barco deixou cair estas bolinhas em alto mar e estamos nas praias a recolher o lixo porque é importante cuidar do meio ambiente".
Perto da hora de almoço, as brigadas do Ambiente já saíram da praia de Queiruga, em Porto de Son, na província da Corunha: "Hoje, aqui, não há nada, está muito disperso", observaram.
Segundo a associação ecologista galega Noia Limpa, que cita dados do EU Monitor, estas bolas de plástico têm menos de cinco milímetros de diâmetro, são usadas na indústria de plásticos e estima-se que só no ano de 2019 se perderam no meio ambiente entre 52.140 e 184.290 toneladas.
Não sendo biodegradáveis, estas pequenas bolas fragmentam-se em nanopartículas que entram na cadeia alimentar marinha.
As regiões do norte de Espanha, da Galiza ao País Basco, ativaram ou elevaram na terça-feira os alertas ambientais e, na quinta-feira, "cerca de 300 pessoas" estavam a limpar as praias galegas, segundo dados da Conselleria do Ambiente da Xunta da Galiza, que prevê para sábado a chegada de mais plástico devido à alteração das "condições marítimas".
A Autoridade Marítima Nacional (AMN) está a monitorizar as partículas de plástico que deram à costa em Espanha, tentando antecipar uma eventual deslocação para Portugal, e a preparar um plano de contingência para remover o material.
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