O vice-primeiro-ministro de Cabo Verde, Olavo Correia, defendeu que a cooperação com a China tem de ser "na base do benefício mútuo" e não "meramente comercial", que obrigue a um elevado endividamento público dos países africanos.
Em entrevista à Lusa, em Washington, à margem das Reuniões de Primavera 2024 do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial, Olavo Correia confirmou que Cabo Verde já tem projetos prontos a serem apresentados no quadro da cooperação com a China e que "alguns privados estão a ser ultimados" a fazê-lo, mas avaliou que a abordagem com Pequim "não pode ser apenas numa lógica de projetos".
"Isso não vai resolver problema nenhum, isso não vai resolver os problemas de África, nem de Cabo Verde. É importante, como é óbvio, mas a abordagem com a China tem de ser mais transformativa, mais estruturante, mais ancorada no desenvolvimento, mais desenvolvimentista, tem de ser ancorada numa nova qualidade da cooperação e não apenas em projetos", defendeu.
"Mesmo que sejam grandes, não vão resolver o problema do continente africano nem de Cabo Verde, e nós queremos que a China seja um parceiro para ajudar a resolver os problemas candentes com que África se debate, como o acesso a energia, à água, ao saneamento, à habitação, à educação. Mas também hoje, e cada vez mais, a quarta revolução industrial - felizmente tecnológica -, em que a China também tem um papel importante e que pode colocar ao serviço do desenvolvimento do continente africano", acrescentou.
A China e os países lusófonos voltam a reunir-se em Macau na segunda-feira, após um interregno de oito anos e o fim da pandemia da covid-19, para relançar o comércio e investimento.
A sexta conferência ministerial do Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa vai decorrer até terça-feira e inclui a assinatura do novo plano de ação do organismo, mais conhecido como Fórum de Macau, até 2027.
Um fundo de cooperação, no valor de mil milhões de dólares (941 milhões de euros), foi criado há 10 anos pelo Banco de Desenvolvimento da China e pelo Fundo de Desenvolvimento Industrial e Comercial de Macau.
No entanto, as regras de acesso têm sido alvo de críticas por parte de países membros do Fórum Macau, que pedem uma flexibilização no acesso aos fundos existentes.
Olavo Correia, que é também ministro das Finanças e Fomento Empresarial cabo-verdiano, advogou que a China tem todas as condições para ajudar o continente africano a resolver o problema de acesso à energia, por exemplo, mas defendeu um olhar para as "novas prioridades" dessa cooperação.
"Nós temos quase metade da população africana sem acesso a energia quando temos soluções, temos financiamento, temos necessidade e, portanto, não faz sentido que isto esteja a acontecer no continente africano. Portanto, podemos, no quadro da cooperação com a China, resolver esse desafio para o continente africano", afirmou.
"Esta cooperação tem de beneficiar as duas partes. Não pode ser apenas uma cooperação meramente comercial que possa, digamos, obrigar a um elevado endividamento público dos países africanos. Têm de ser uma cooperação na base do benefício mútuo da China, mas também do continente africano", reforçou o governante.
Ao mesmo tempo, destacou Olavo Correia, a cooperação com Pequim tem de criar as condições para um vasto programa de infraestruturação, mas com financiamentos concessionais, rejeitando a lógica de "investir hoje, mas depois hipotecar o futuro" dos países africanos.
"A China precisa de África e África precisa da China. Penso que se nós colocarmos esses pontos na mesa, numa cooperação focada nas soluções transformativas, na defesa do interesse mútuo (...) e focada na solução para os desafios das pessoas (...), então teremos aqui uma cooperação que atinge os elementos fundantes do desenvolvimento futuro do continente africano e é nesse caminho que devemos alocar a cooperação com a China, para que ela seja portadora de sucesso para o continente africano e para a China", declarou.
O ministro salientou que, durante a reunião na China, levantará precisamente essas questões, para que se faça uma "melhor reflexão" em prol da otimização dessas relações.
"Se África for desenvolvida e for próspera, a China ganhará, se for o contrário, nem China ganhará, nem o mundo ganhará", insistiu.
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