Na segunda-feira, o Provedor de Justiça referiu que o seu relatório assinalava "uma série de omissões graves e reprováveis nas tarefas de busca e salvamento por parte de oficiais superiores da Guarda Costeira Helénica, que constituem indícios claros" para a instauração de um processo contra os oficiais, por colocarem em perigo a vida dos passageiros do 'Adriana'.
O organismo independente iniciou a sua própria investigação em novembro de 2023, após "a recusa direta de uma investigação disciplinar por parte da Guarda Costeira".
Estima-se que mais de 500 pessoas se afogaram com o naufrágio do 'Adriana', ao largo da costa de Pylos, no sul da Grécia, quando o navio viajava da Líbia para Itália, em junho de 2023.
Apenas 104 pessoas foram resgatadas do barco de pesca sobrelotado, - todos homens, a grande maioria da Síria, Paquistão e Egito - e 82 corpos foram recuperados.
A guarda costeira, que foi notificada na altura pelas autoridades italianas, seguiu a embarcação durante horas, enquanto esta navegava em águas internacionais, mas ainda na área de responsabilidade da Grécia no que respeita a operações de busca e salvamento.
A guarda costeira afirmou então que o capitão do "Adriana" havia insistido que não necessitava de assistência e que pretendia continuar a navegar para Itália, mas vários sobreviventes afirmaram que os passageiros haviam pedido ajuda repetidamente e que o barco se havia voltado durante uma tentativa de reboque por parte da guarda costeira grega.
O Ministério da Política Marítima e Insular, que tutela a guarda costeira, rejeitou o relatório do Provedor de Justiça, acusando-o de "tentar desviar a atenção das redes criminosas de contrabando para os membros da guarda costeira, que lutam dia e noite pela proteção do país".
O Ministério grego acusou ainda o relatório de favorecer frequentemente versões dos acontecimentos que põem em causa a ação da guarda costeira "sem a mínima prova credível".
"Numa altura em que a migração irregular está a causar preocupação a nível mundial, o governo continua firmemente empenhado numa política rigorosa, mas justa, de vigilância das fronteiras do país", disse o ministério num comunicado.
Vários grupos de defesa dos direitos humanos saudaram o relatório do Provedor de Justiça e criticaram a reação do Governo, criticando as declarações do ministério como "um monumento de hipocrisia, mas também uma confissão de que vai continuar a encobrir o crime", afirmou o Movimento Unido Contra o Racismo e a Ameaça Fascista (KEERFA), que convocou uma manifestação de protesto em frente a um tribunal naval na principal cidade portuária da Grécia, Pireu, para hoje à noite.
Os advogados que representam alguns dos sobreviventes apresentaram em dezembro um pedido ao Tribunal Naval do Pireu para que fossem instauradas ações penais contra os membros da operação de busca e salvamento.
"A transparência da ação administrativa e a atribuição de responsabilidades, se for caso disso, pelo naufrágio mortal de Pylos é uma exigência jurídica elementar, indissociavelmente ligada ao respeito pelo Estado de direito", declarou o Provedor de Justiça Andreas Pottakis num comunicado.
"Tal como o é a investigação exaustiva de qualquer outro incidente relacionado com a violação do direito à vida, à saúde e à integridade física", acrescentou.
O naufrágio do 'Adriana' renovou a pressão sobre os governos europeus para protegerem as vidas dos migrantes e dos requerentes de asilo que tentam chegar ao continente, uma vez que o número de pessoas que atravessam ilegalmente o Mediterrâneo continua a aumentar todos os anos.
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