Em declarações à agência Lusa, a mais jovem deputada da União Democrata-Cristã (CDU) no Bundestag (parlamento) alemão, assume que a crescente desconfiança dos eleitores na política é uma dificuldade e um dos maiores desafios que o seu partido enfrenta, numa altura em que a Alternativa para a Alemanha (AfD, extrema-direita) surge nas sondagens como a segunda força mais votada nas eleições legislativas antecipadas, agendadas para domingo.
"A maioria das pessoas não vota neles por estar convencida que têm as melhores ideias, mas por frustração. Convence-las de que podem confiar nos partidos do centro não vai ser uma tarefa fácil e estou preocupada que esta possa ser a última oportunidade de conseguirmos uma maioria estável", partilha Catarina dos Santos.
"Se não conseguirmos agora formar um governo estável, seguro, e mandarmos esse sinal, talvez não tenhamos essa possibilidade nas próximas eleições", sublinha.
Catarina dos Santos faz um balanço "mais do que positivo" destes três anos no parlamento na bancada do principal partido da oposição, confessando ter sido uma "experiência enorme de crescimento pessoal e profissional" que lhe permitiu conhecer de perto os mecanismos da política nacional.
"Quando fui eleita, não sabia que era a primeira portuguesa no parlamento federal alemão. Foi uma grande alegria e orgulho. (...) Tive o privilégio de trabalhar muito com tópicos portugueses. A comunidade portuguesa está muito bem integrada, mas enfrenta desafios, como por exemplo o reconhecimento de qualificações, acesso a serviços públicos, ou questões ligadas ao empreendedorismo. Eu tento levar, sempre que posso, essas questões ao debate político", assume.
Conta que é abordada por vários portugueses, muitos deles jovens, nas redes sociais. Mas também recebe telefonemas.
"Houve uma senhora que me ligou e falou com a minha chefe de gabinete em inglês. Eu estava numa reunião, mas quando voltei a minha chefe de gabinete disse-me que ela devia ser uma tia minha, porque me tratou por 'tu' e falou de mim de uma forma muito simpática. Mas eu não conhecia a senhora que era portuguesa. Ela tinha uma preocupação pequenina que conseguimos resolver. Foi uma experiência muito engraçada", descreve, entre risos.
A CDU lidera as sondagens com cerca de 30%, um valor que tem oscilado pouco nas últimas semanas. Tudo aponta para que Friedrich Merz seja o próximo chanceler da Alemanha e os conservadores estejam no governo.
"O impacto será enorme passar de oposição a governo porque vamos poder implementar as reformas que temos vindo a defender. No meu caso, estou muito entusiasmada com o facto de podermos avançar com temas de digitalização e modernização do Estado. Eu acho que claramente será um momento de grande responsabilidade para garantir que as promessas da campanha sejam cumpridas", confessa, num tom entusiasmado.
A recuperação económica, a estabilização e o reforço da segurança, são alguns dos temas "clássicos" da campanha, mas Catarina dos Santos admite que restituir a confiança dos eleitores deverá ser uma prioridade importante.
"O meu desejo seria formar um governo só com dois partidos. Viu-se agora com a 'coligação semáforo' que foi muito difícil chegar a compromissos, especialmente com os liberais e os Verdes com pontos de vista tão diferentes (...). A escolha parece que vai ser entre o SPD [social-democratas] e os Verdes, mas só saberemos depois de domingo", sustenta, sem adiantar preferências.
A deputada lusodescendente voltou a realçar uma ideia já diversas vezes abordada por Merz: a CDU não formará coligações com a extrema-direita.
"Não haverá qualquer aliança com um partido que ameaça os nossos valores democráticos, não tenho qualquer dúvida que manteremos essa linha de separação absoluta porque nos venderíamos a alma da CDU se nos coligássemos com esse partido. É impossível", afirma, argumentando que há uma grande diferença entre acordos pontuais e uma coligação.
A CDU apresentou há umas semanas uma moção não vinculativa que, em cinco pontos, defende uma política de asilo mais rigorosa. A proposta acabou por não passar, mas teve o apoio e os votos favoráveis da AfD.
"A questão migratória tem de ser abordada de uma forma equilibrada e responsável. A Alemanha é um país de imigração. O problema é que, às pessoas que vivem cá, lhes parece que a migração já não é ordenada nem regulada, não garantindo integração e coesão social", explica.
"Sei que muitos migrantes chegam à Alemanha para contribuir positivamente para o país, os portugueses são o exemplo disso, mas também sei que uma política migratória desorganizada pode gerar problemas, e criar problemas às pessoas que são bem integradas e trabalhadoras (...). Os que têm direito a proteção devem ter proteção, mas devemos combater abusos no sistema", refere.
A Alemanha realiza no domingo eleições legislativas antecipadas - estavam previstas para 28 de setembro -, na sequência da queda da coligação governamental liderada por Olaf Scholz e composta pelo SPD, pelos liberais do FDP e pelos Verdes.
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