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"Viver na maioria até permite falar de minorias de estimação"

Mãe de transexual divulga carta emocionante sobre lei que estabelece direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de género e à proteção das características sexuais de cada pessoa.

"Viver na maioria até permite falar de minorias de estimação"

Rita Alves é mãe de uma menina. Uma menina chamada Leonor e que é transexual. Perante a polémica que envolve a lei que estabelece direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de género e à proteção das características sexuais de cada pessoa e depois de um artigo de opinião de Laurinda Alves, no jornal Observador, intitulado 'Minorias de estimação', esta mãe decidiu escrever uma carta aberta, em que reforça o sentimento que este assunto é muito mais importante do que “discorrer sobre casas de banho nas escolas”.

Rita começa por criticar o título do artigo de opinião, publicado a 20 de agosto. Esclarece que, se para Laurinda Alves, uma “minoria de estimação” é um mero trocadilho com animal de estimação, para ela é muito mais, visto que a sua filha, Leonor, pertence a essa minoria.

“A Laurinda Alves nem sonha, nem imagina o que vivem estas crianças e as suas famílias. Está tão longe do seu mundo de anjinhos e coisas fofas que, percebo bem, a sua única via é falar do que não sabe e discorrer sobre casas de banho nas escolas”, começa por dizer para, de seguida, explicar o que acontece às famílias que passam por uma situação de mudança como esta.

Não sabe o que é viver no corpo errado. Não sabe o que é ser mãe e ter um filho que logo aos três anos diz a chorar que não é menino, que não percebe porque insistimos em tratá-lo por menino. Não sabe que os punimos por isso, que os repreendemos e que rejeitamos. Porque nós, pais, tal como a Laurinda Alves, não sabíamos o que era. Para nós, tal como para si, o nosso querido filho era afinal o quê? Um deficiente? Uma aberração?”, desabafa.

Além da difícil transição de corpo e de opiniões, a criança transexual enfrenta, ainda hoje, lembra Rita, grandes preconceitos na escola.

Sabe o que é ir ver as notas da sua filha e a pauta ter o nome em branco, como se não existisse, porque era, até agora, a única forma legal de não usar o nome que já não usávamos? Sabe o que é ter uma filha em pânico por não saber se pode ir a uma casa de banho, por ter de se despir em frente a outros?”, questiona Rita.

Uma pergunta que, apesar de ser retórica, acaba por responder mais à frente. “Não sabe nada disto. Não tem como saber porque não terá nenhum filho trans. Não viveu. Viveu apenas a vida da mãe dos filhos privilegiados que cabiam na norma da maioria. E é tão confortável viver como a maioria. Até permite falar das ‘minorias de estimação’”.

Recorde-se que, na passada sexta-feira, dia 16 de agosto, foi publicado em Diário da República, com entrada em vigor no dia seguinte, um despacho sobre a aplicação da lei da identidade do género (aprovada no ano passado) nas escolas, que, na alínea três do artigo cinco, diz que as escolas "devem garantir que a criança ou jovem, no exercício dos seus direitos, aceda às casas de banho e balneários, tendo sempre em consideração a sua vontade expressa e assegurando a sua intimidade e singularidade".

O despacho tem inflamado as redes sociais, com vários deputados a insurgirem-se contra e outros a favor. A opinião pública também parece dividida. Se uns concordam com a nova lei  sobre identidade de género, outros há que a criticam ferozmente. Aliás, mais de 20 mil pessoas assinaram já uma petição criada com o intuito de suspender o despacho em questão.

Já as escolas defendem que deve haver um "período de transição" para aplicar nas mesmas a questão do acesso a casas de banho e balneários.

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