O facto de um chefe de Estado circular pelas ruas como qualquer outra pessoa é desconcertante para os moçambicanos que com ele se cruzam e o reconhecem.
"Gostei do Presidente. É um Presidente muito humilde", disse Pedro António, vendedor de fruta no Mercado Central de Maputo, seduzido há quatro anos pela proximidade de Marcelo, durante a última visita do Presidente português a Moçambique.
Desta vez, como já sabia da visita, andava prevenido com uma foto impressa no bolso, uma 'selfie' que ambos tiraram na altura, junto à sua banca no mercado.
"Hoje isso repetiu-se", disse, depois de chamar o Presidente de foto colada ao peito.
Marcelo comprou-lhe um ananás por 100 meticais, pouco mais de um euro, e já levava na mão um saco com caju e especiarias - sobretudo picante.
"O que eu gostava de comer, adorava e adoro, são especiarias, picante", refere aos jornalistas e à comitiva que o seguem como se fosse ele o guia do mercado, por onde distribui alguns beijos e abraços.
Moçambique é a sua "segunda pátria", aquela que conheceu entre os 19 e os 20 anos, em temporadas de férias dos estudos na Faculdade de Direito de Lisboa, durante o mandato do seu pai, Baltazar Rebelo de Sousa, como governador-geral (1968-1970) da então província ultramarina, em plena guerra colonial.
Hoje a luta é outra: Marcelo já transpira, estão quase 30 graus quando resiste às vendedoras que lhe tentam vender caranguejo quase à saída do mercado.
Na apertada agenda presidencial, a manhã pela baixa de Maputo afigura-se como o momento mais oportuno para cortar o cabelo, justificou, ao entregar-se aos cuidados do barbeiro Fernando Timane, no Salão Azul.
Será o corte final para se apresentar na cerimónia de tomada de posse do seu homólogo, Filipe Nyusi, na quarta-feira - enquanto na televisão pendurada na parede passa em direto a tomada de posse do novo parlamento.
Ninguém liga.
Toda a gente segue o vaivém da tesoura do barbeiro, tal como na rua todos seguem depois o ziguezague do pano do engraxador nos "sapatos velhinhos", tal como os descreveu Marcelo.
O chefe de Estado encontra uma foto do seu pai na nova livraria Minerva, que agora se juntou com a antiga pastelaria Continental para formarem um único espaço de cafetaria, leitura e loja de eletrónica.
"Boas memórias", remata, depois de observar a fotografia que retrata um momento de tertúlia que inclui Malangatana e outras figuras, à volta de uma mesa, eternizada a preto e branco no mural sobre a história da livraria.
"Eu passava a vida na Minerva", disse.
Na altura, "era apenas papelaria e livraria. Agora é esta maravilha com pasteis de nata ótimos", feitos pelo mestre pasteleiro Pedro Santos, de Seia, um português que há 20 anos trocou a Serra da Estrela pela costa do Índico.
Foi o local escolhido por Marcelo para terminar um passeio que lhe ocupou a manhã, pela baixa de Maputo, depois de aterrar na capital moçambicana pelas 07:25 (menos duas horas em Lisboa).
E entre um momento e outro, longe dos olhares dos jornalistas, disse já ter ido dar um mergulho à Costa do Sol, nas praias urbanas à beira da marginal.