Criadora de uma rede solidária promovida por 200 mulheres brasileiras que apoiou centenas de compatriotas durante o confinamento gerado pela pandemia em Portugal, Ana Paula Costa mostra-se preocupada com a situação de muitas compatriotas: "Há muita situação de desemprego, e, por exemplo, na restauração, quem conseguiu ficar, ficou perdendo algum rendimento, por causa da queda [provocada pela pandemia]. Passaram para o part-time. Outras [mulheres] perderam mesmo o emprego e algumas optaram pelo retorno ao Brasil".
Ao mesmo tempo, a também dirigente da Casa do Brasil em Lisboa nota "um aumento da vulnerabilidade no trabalho, porque as pessoas precisam de emprego e estão dispostas a receber qualquer salário" e que a discriminação "cresceu muito", através das redes sociais.
"Cresceram os discursos xenófobos contra as mulheres brasileiras em Portugal, (...) um discurso que sempre existiu, estereotipado sobre a mulher brasileira, ligado ao seu corpo e à sexualidade", mas que se agravou agora, considerou.
Ana Paula Costa lembrou que durante a pandemia houve "um período de fake news em relação à covid-19. Espalhou-se uma certa ideia nas redes sociais de que a covid foi trazida para Portugal através dos imigrantes".
A pressão social e a estabilidade emocional e mental de muitas imigrantes foram uma preocupação que a plataforma Geni (o coletivo de mulheres brasileiras que Ana Paula Costa integra) sentiu no apoio às suas compatriotas durante o confinamento.
"As mulheres entraram em desespero e, como a questão financeira influencia muito na saúde mental, e muitas delas tinham filhos, renda para pagar e outras contas, então a pandemia trouxe muita ansiedade (...) e crise de depressão", sublinhou.
A rede solidária, identificando que este foi o primeiro problema a surgir com a pandemia, "conseguiu reunir psicólogas, que trabalhavam aqui em Portugal e tinham registo, para poderem atender essas mulheres de forma voluntária", contou.
E como os problemas psicológicos surgiram por razões financeiras e pela perda de trabalho, a rede criou um segundo grupo, o do apoio social, que "tinha advogadas que orientavam as mulheres sobre os direitos que elas tinham com as mudanças das regras dos apoios da Segurança Social, com as novas regras de despedimentos, com regras de termo e cessação de contratos", indicou.
Neste segundo grupo do apoio social havia ainda uma outra frente, a que ajudava na alimentação e que, numa primeira fase começou a direcionar as mulheres que pediam este tipo de ajuda para o banco de alimentação.
"Começámos a nos organizar entre nós para poder ajudar financeiramente essas mulheres e acabamos por enviar algumas ajudas monetárias. Conseguíamos recolher das mulheres do grupo e levantamos cerca de 400 euros e fomos fazendo assim uma gestão até as mulheres conseguirem ter uma resposta no banco", contou, além darem cestas básicas.
Passado o confinamento, a rede solidária acabou, mas continuou a apoiar as 232 mulheres que se inscreveram para pedir ajuda e tem um outro grupo, o do apoio ao emprego, que ajuda as mulheres a procurarem um novo trabalho, onde vivem.