"O Rei Zwelithini era um líder com uma grande visão; se hoje há paz na África do Sul, não se deve apenas ao Presidente Mandela, mas igualmente também ao rei Zulu, porque foram os dois que trabalharam em conjunto nesse sentido. Sei disso porque servi de elo de ligação", referiu, em entrevista à Lusa, José de Castro.
O líder tradicional português da nação AmaZulu recordou a sua relação de quase três décadas com o monarca africano, que hoje morreu no hospital, em Durban, litoral do país, explicando que logo após as primeiras eleições multirraciais e democráticas em 1994, o monarca Zulu enviou o empresário madeirense a Pretória para preparar um encontro com o primeiro chefe de Estado negro da África do Sul, Nelson Mandela.
"Na altura julguei que iria acompanhar o rei, mas ele enviou-me primeiro ao Union Buildings [sede da Presidência sul-africana], foi o secretário pessoal do Rei que me levou lá, para preparar o encontro entre os dois líderes", explicou.
"Conversei com o Presidente Mandela, bebi café com Mandela, e depois é que se realizou o encontro com o rei Zwelithini", frisou José de Castro, salientando que o encontro teve por objetivo discutir as terras do rei Zulu.
"O sucesso do Mandela dependia da cooperação e do apoio do Rei, e para mim, o grande valor do Rei foi quando ele, que era anti-Mandela, se tornou pró-Mandela, E houve Paz", salientou.
Questionado sobre a sucessão de Zwelithini e o futuro político da província do KwaZulu-Natal, José de Castro considerou que a expropriação de terras sem compensação, tal como é preconizada pelo partido de Nelson Mandela, o Congresso Nacional Africano (ANC, na sigla em inglês) e por Julius Malema, líder do partido de oposição Economic Freedom Fighters (EFF, na sigla em inglês), de esquerda radical, e ex-dissidente do partido no poder, "poderá criar instabilidade" na província mais populada do país.
"O maior desafio do sucessor do rei será o de dar continuidade à paz que o 'pai' estabeleceu com o Mandela, mas vai haver uma reviravolta dentro do KwaZulu-Natal", adiantou o líder tradicional do monarca Zulu.
Em 2018, Goodwill Zwelithini anunciou uma aliança com o AfriForum, organização da sociedade civil de maioria Afrikaner, para se opôr à expropriação de terras preconizada pelo Governo do ANC e do partido EFF.
Goodwill Zwelithini ka Bhekuzulu, rei do povo Zulu desde a década de 1960, era o único administrador de cerca de três milhões de hectares de terra sob o Fundo Ingonyama, criado em 1994, para salvaguardar "o bem-estar material e social dos membros das tribos e comunidades" que fazem parte de cerca de 11 milhões de pessoas que habitam a província do KwaZulu-Natal, a segunda mais povoada do país.
O rei Zulu Goodwill Zwelithini morreu hoje aos 73 anos, no hospital, anunciou o primeiro-ministro tradicional do monarca e da nação Zulu, Mangosuthu Buthelezi, em nome da casa real AmaZulu.
O Presidente da África do Sul Cyril Ramaphosa decretou um funeral de Estado, em data ainda por anunciar.
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