"No início eram alunos com uma idade muito elevada, ou seja, com mais de 50 ou 60 anos, alguns analfabetos, agora, com o fenómeno de inúmeros brasileiros a virem para cá, nós estamos com uma situação atípica", afirmou Rejane Lima, em entrevista à Lusa.
Hoje, "são brasileiros jovens, com mais de 18 anos, muitos deles que não se adaptaram à escola portuguesa e vão estudar e terminar o 12.º ano", explicou.
"Não se adaptaram, sobretudo à pronúncia do português, o ouvido ainda não está preparado. Por isso, a gente tem a preocupação de mesclar [juntar] professores de português e brasileiro" no curso preparatório para o exame, para o aluno se habituar a ouvir a língua em Portugal.
Segundo Rejane Lima, "mais de 60% dos alunos são indocumentados", ou seja, ainda não regularizaram a sua situação em Portugal e a maioria não tem intenção de voltar para o Brasil.
De acordo com a responsável pelo projeto em Lisboa, estes alunos procuram cada vez mais o ENCCEJA por muitas outras razões, como o facto de perceberem que "em Portugal a exigência educacional é muito maior" para poderem ter uma profissão.
"Para ter o curso de cabeleireiro precisa do 12.º ano, para ter um curso profissionalizante precisa do 12.º ano e até para que tenha um estatuto melhor dentro do seu local de trabalho precisa de uma vida académica mais elevada", considerou.
No ENCCEJA Lisboa, há cursos de inglês, francês e espanhol, "para que o aluno tenha conhecimento de outras línguas de que precisa, porque está na Europa", acrescentou.
Além disso, no curso o aluno pode conciliar a vida académica com o trabalho, porque as aulas são em horário pós-laboral, referiu.
Por outro lado, mesmo que um aluno venha com o quinto ano de escolaridade só vai estar um ano no projeto ENCCEJA, porque o "exame é global" e a preparação é feita, num ano, por módulos, explicou.
Do curriculum obrigatório, faz parte, porém, literatura portuguesa, como os Lusíadas, de Luís de Camões, e livros de Eça de Queirós, Fernando Pessoa e Florbela Espanca.
Outra componente que tem peso para quem chegou há pouco tempo a Portugal e ainda com um emprego precário é o facto de que ali "tudo é gratuito".
O governo brasileiro manda as provas, que são realizadas na Universidade Lusófona, em Lisboa, e o Consulado do Brasil "aplica-as".
Normalmente, estas provas decorrem no mês de setembro, porque o ano escolar foi adaptado ao da Europa. Os alunos que vêm só para o exame estudam em casa, por sebentas disponibilizadas no site do Ministério da Educação do Brasil, explicou.
Porém, "muitas vezes este material está muito desatualizado", porque "não há uma preocupação constante", o que com que o aluno que estuda sozinho não consiga alcançar um bom resultado, adiantou a responsável do ENCCEJA Lisboa.
Quanto à prova, é toda em português do Brasil, mas no ENCCEJA Lisboa os alunos que participem no curso preparatório têm aulas sobre Portugal.
"Não é matéria que caia na prova, mas fazemos um trabalho social e também de inserção social", realçou Rejane Lima.
Assim, o aluno que frequenta as aulas do curso preparatório aprende como é Portugal, a distribuição geopolítica, como se podem deslocar, como se podem documentar, quais são os seus direitos e deveres, como se devem comportar, como é a cultura local.
Tudo para que tenha também "uma condição social de inserção muito mais fácil, sem sofrimento. Porque são culturas diferentes", concluiu Rejane Lima.
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