Nas alegações finais do julgamento, a procuradora Isabel Lima pediu a condenação mais pesada para o instrutor Ricardo Rodrigues que, segundo o MP, terá colocado terra na boca do instruendo Hugo Abreu durante a "prova zero" dos Comandos, em 04 de setembro de 2016, numa altura em que este já se encontrava "muito desgastado fisicamente" pela dureza da prova.
Hugo Abreu, que na altura, segundo a acusação, já estava "tonto e a cambalear", ter-se-á engasgado e desmaiado posteriormente, com a língua enrolada, não tendo recebido o auxílio imediato e necessário, tendo-se o INEM limitado, mais tarde, a confirmar o óbito por alegado "golpe de calor".
Segundo a procuradora, o instrutor Ricardo Rodrigues terá também obrigado o instruendo Dylan Silva, que veio a morrer dias depois no Hospital Curry Cabral por insuficiência hepática e renal, a rastejar no meio de um mato de silvas.
O MP deu como provado que Ricardo Rodrigues praticou o crime de abuso de autoridade com ofensa à integridade física, com perigo de vida, pedindo que o seu comportamento, por "ação" e não omissão, seja punido com pena de prisão até 10 anos de cadeia.
Isabel Lima, coadjuvada pela colega Leonor Machado, considerou, durante as mais de quatro horas de alegações finais, que cabia ao instrutor Ricardo Rodrigues "zelar pela segurança e saúde dos instruendos", mas que "não agiu" dessa forma, "potenciando o perigo para a vida do instruendo (Hugo Abreu)".
Quanto ao médico Miguel Domingues, também acusado de abuso de autoridade com ofensa à integridade física, mas "por omissão" e não ação, o MP pediu uma condenação a cinco anos de prisão, pena passível de ser suspensa na execução.
Quanto ao militar responsável pela "prova zero", Mário Maia, que falou durante o julgamento e que está acusado de abuso de autoridade com ofensa à integridade física, por "omissão", a procuradora pediu a sua condenação a uma pena de dois anos de prisão, suspensa por igual período.
Igual pena suspensa de dois anos de prisão foi pedida para os arguidos Pedro Nelson Morais, Pedro Fernandes e Lenate Inácio. Não foi pedida condenação para os restantes arguidos.
Em causa no processo estão os acontecimentos ocorridos durante a primeira prova do 127.º curso de Comandos em que morreram os recrutas Dylan da Silva e Hugo Abreu, tendo o MP, no final da investigação, acusado 19 militares, por cerca de 500 crimes relacionados com os atos alegadamente praticados na instrução.
Dylan da Silva e Hugo Abreu, à data dos factos ambos com 20 anos, morreram e outros instruendos sofreram lesões graves e tiveram de ser internados durante a denominada "Prova Zero" (primeira prova do curso de Comandos), que decorreu na região de Alcochete, distrito de Setúbal, em 04 de setembro de 2016.
Oito oficiais, oito sargentos e três praças, todos militares do Exército do Regimento de Comandos, a maioria instrutores, foram acusados de abuso de autoridade por ofensa à integridade física.
Segundo a acusação, os arguidos atuaram com "manifesto desprezo pelas consequências gravosas que provocaram nos ofendidos".
"Os princípios e valores pelos quais se regem os arguidos revelam desrespeito pela vida, dignidade e liberdade da pessoa humana, tratando os ofendidos como pessoas descartáveis", refere a acusação produzida pela procuradora do inquérito Cândida Vilar.
A acusação nota que, ao sujeitarem os ofendidos a essa "penosidade física e psicológica" durante a recruta efetuada em setembro de 2016, todos os arguidos sabiam que "excediam os limites" permitidos pela Constituição e pelo Estatuto dos Militares da Forças Armadas e "colocaram em risco a vida e a saúde dos ofendidos, o que aconteceu logo no primeiro dia de formação".
A defesa dos cinco elementos a quem o MP pediu a condenação deverá contestar os factos quando for a sua vez de efetuar as alegações finais.
O julgamento do caso dos Comandos relativo à morte de Hugo Abreu e Dylan Silva durou quase dois anos e meio.
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