Gestor suíco diz que Vara lhe entregou dinheiro para contas na Suíça
O gestor de fortunas Michel Canals afirmou hoje em julgamento que Armando Vara lhe entregava dinheiro em numerário para depois, através de Francisco Canas, "aparecer" numa conta na Suíça que pertencia ao ex-ministro e à filha deste.
© Global Imagens
País Armando Vara
Michel Canals, gestor de fortunas suíco, falava como testemunha na primeira sessão do julgamento em que o antigo ministro e ex-administrador da Caixa Geral de Depósitos (CGD) Armando Vara responde por um crime de branqueamento de capitais.
O gestor de fortunas suíço, que fala italiano e precisou de intérprete, foi ouvido pelo tribunal por "whatsApp" (telemóvel), tendo revelado que foi gestor de conta de Armando Vara e da filha deste, Bárbara Vara, até 2007.
A testemunha disse que recebeu dinheiro em numerário em encontros mantidos com o ex-deputado socialista, verba essa que entregava posteriormente a Francisco Canas, proprietário de uma Casa de Câmbio em Lisboa, que fazia chegar o dinheiro ao banco suíco UBS" e à empresa 'offshore' VAMA, com sede no "Panamá ou nas ilhas Seychelles", a qual era controlada por Vara e pela filha.
Segundo relatou a testemunha, Francisco Canas, tinha a facilidade de colocar o dinheiro na Suíça porque "não tinha residência fiscal" em Portugal.
Francisco Canas, também conhecido como "Zé das Medalhas", e que já morreu, tinha uma Casa de Câmbio na baixa de Lisboa (Rua do Ouro), tendo chegado a ser um dos arguidos do caso "Monte Branco", relacionado com o desvio e ocultação de grandes fortunas ao fisco português. A Casa de Câmbio, segundo a investigação do Ministério Público, servia de "fachada" para colocar milhões de euros em contas bancárias na Suíça.
No seu depoimento, Michel Canals admitiu que Armando Vara "era cliente da UBS" e teve nesse banco suíco uma conta em que o primeiro titular era a filha Bárbara Vara, mas que o ex-deputado "também podia assinar", ou seja, movimentar.
Perante a crescente dificuldade em tornar as contas bancárias na Suíça "discretas" foi constituída uma sociedade 'offshore' (VAMA) que, segundo a sua memória, teria sede nas Seycheles ou no Panamá.
"Comecei a abrir contas 'offshores' porque as contas abertas [na Suíça] já não eram discretas", justificou, lembrando que "antigamente as contas cifradas apenas eram conhecidas pelo banco e pelo cliente", ou seja, por "poucas pessoas". Foi por isso - acrescentou - que aconselhou os clientes a abrirem contas 'offshores' porque "deixou de haver segredo nas contas [bancárias]".
Michel Canals admitiu que teve alguns encontros com Armando Vara, nem todos por causa da entrega de dinheiro, algumas vezes apenas para falar de investimentos.
A testemunha disse ainda que a partir de 2007, devido ao elevado número de clientes, deixou de ser gestor de conta de Armando Vara, o qual passou a tratar dos assuntos com o seu colega e gestor bancário José Pinto, que trabalhava "há muitos anos no UBS".
Antes de Michel Canals, o coletivo de juízes inquiriu como testemunha o advogado e antigo presidente da RTP, João Carlos Silva, que admitiu ser amigo de Armando Vara e ter sido contactado por este porque havia um investidor imobiliário que pretendia adquirir uma casa em Lisboa.
Aceitando intermediar o negócio, a testemunha, com escritório de advogado no Porto, referiu que em 2008 passou então a gerir a Citiwide, uma empresa 'offshore', mas acrescentou que só anos mais tarde é que se apercebeu que o imóvel alvo de transação (compra e venda) era propriedade de Bárbara Vara e o comprador, era na realidade, o pai, Armando Vara.
Adiantou que, na altura, "o melhor era vender o apartamento (situado na avenida do Brasil) e devolver os fundos onde eles estavam e que isso foi feito".
João Carlos Silva disse ainda que o apartamento foi vendido com a intenção de dissolver a sociedade, mas a 'holding' "já não tinha conta bancária", pois a mesmo tinha sido judicialmente bloqueada.
A testemunha revelou que a venda do apartamento se efetuou pelo valor de 530 mil euros, após ter sido inicialmente adquirido por cerca de 400 mil euros, admitindo que ele próprio utilizou o saldo favorável para efetuar pagamentos de natureza fiscal e outros relacionados com a transmissão do seu escritório de advogado.
Ao contrário de Vara e de Bárbara Vara, João Carlos Silva nunca chegou a ser constituído arguido nas investigações, embora o seu escritório tivesse sido alvo de buscas em 2017.
Vara não quis hoje, e para já, prestar declarações, e está dispensado da próxima sessão (16 de junho), tendo a sua defesa prescindido de fazer o contra-interrogatório às testemunhas João Carlos Silva e Michel canals.
Armando Vara está desde 16 de janeiro de 2019 a cumprir uma pena de cinco anos de prisão por três crimes de tráfico de influências, condenação que transitou em julgado em dezembro de 2018, após vários recursos sem sucesso.
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