Ucranianos com pró-russos? "Câmara chamou pessoas que sabiam a língua"

O autarca alega que a presença de Igor Khashin, da Associação dos Emigrantes de Leste (Edintsvo), na receção de imigrantes ucranianos daquele município, se deveu à necessidade de traduzir os documentos e a informação necessária para o seu acolhimento.

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© Leon Klein/Anadolu Agency via Getty Images

Daniela Filipe
29/04/2022 23:59 ‧ 29/04/2022 por Daniela Filipe

País

Ucrânia/Rússia

André Martins, presidente da Câmara de Setúbal, eleito pela CDU, assegurou, na noite desta sexta-feira, que o organismo segue "um protocolo reconhecido pelas várias entidades da administração central", justificando que a presença de Igor Khashin, da Associação dos Emigrantes de Leste (Edintsvo), na receção de imigrantes ucranianos daquele município, se deveu à necessidade de traduzir os documentos e a informação necessária para o seu acolhimento.

"No dia 17 de março, a Câmara Municipal entendeu criar um serviço de atendimento a refugiados, e fê-lo desde logo porque temos uma comunidade de imigrantes de leste bastante significativa em Setúbal, e é por isso que temos tido ao longo dos anos uma relação com a Associação dos Emigrantes de Leste", começou por justificar o autarca, em declarações à SIC Notícias, ressalvando que a entidade se encontra no município "há cerca de 20 anos". 

"O senhor a que se refere, Igor Khashin, é um dirigente dessa associação e, como a Câmara Municipal precisava de alguém que fizesse a tradução no atendimento aos refugiados, para se perceber aquilo que é a informação que é necessária, [...] recorremos à associação" complementou. "Os serviços recorrem a pessoas que sabem a língua dos refugiados para os receber", justificou.

Autarca não mete "as mãos no fogo por nada", mas nega partilha de dados

Confrontado com o facto de que o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) negou ter trabalhado com o dirigente, o autarca reiterou a sua posição, admitindo, contudo, não saber se "têm algum protocolo". "Volto a afirmar que esta associação de que o senhor Igor é dirigente tem colaborado com o SEF, várias vezes. Não posso é dizer que têm algum protocolo", confessou.

"O senhor Igor é uma pessoa reconhecida na comunidade setubalense, e estas entidades, não só o SEF, recorrem aos serviços desta associação quando é necessário. Portanto, foi isso que nós sempre fizemos", acrescentou. Admitiu, no entanto, não colocar "as mãos no fogo por nada" no que diz respeito à partilha de dados dos imigrantes ucranianos, ainda que não tenha "provas nenhumas" quanto a essa hipótese.

"Não ponho as mãos no fogo sobre nada. O que lhe posso garantir é que os serviços da Câmara Municipal, que estão afetos a esta receção, o fazem seguindo um protocolo, que é um protocolo reconhecido pelas várias entidades da administração central. Não tenho provas nenhumas de que essas questões tenham sido colocadas", garantiu.

Carta enviada a Costa pedia "esclarecimento". Primeiro-ministro nega

André Martins disse ainda que, quando teve conhecimento das declarações da embaixadora da Ucrânia, Inna Ohnivets, escreveu "nesse mesmo dia uma carta ao senhor primeiro-ministro [António Costa], falando sobre várias questões que a senhora embaixadora tinha colocado". Uma delas prendia-se com a existência de associações pró-russas infiltradas em Portugal - entre elas a Associação dos Emigrantes de Leste - que podiam estar a "receber dados sobre familiares que combatiam no exército ucraniano".

"Por esse facto, escrevemos uma carta ao primeiro-ministro para nos esclarecer se a afirmação que a senhora embaixadora fez, na conversa que teve com a secretária de Estado, se reconhecia que de facto era necessário alterar a lista, para que tivéssemos informação sobre essa relação com essa associação", explicou.

António Costa, por sua vez, reagiu em comunicado, afirmando que a carta do autarca de Setúbal era um "protesto" e não solicitava informações.

Refugiados ucranianos recebidos por pró-Kremlin?

Segundo o Expresso, que avança a notícia, pelo menos 160 refugiados ucranianos terão sido recebidos por Igor Khashin, da Associação dos Emigrantes de Leste (Edintsvo), e pela mulher, Yulia Khashin, de origem russa. Estes terão, alegadamente, fotocopiado documentos de identificação dos refugiados ucranianos, no âmbito da Linha de Apoio aos Refugiados da Câmara Municipal de Setúbal.

A autarquia reconheceu que "Igor Khashin colabora, regularmente, há vários anos, com várias entidades da administração central, entre as quais o Instituto de Emprego e Formação Profissional, o Alto Comissariado para as Migrações e o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, tendo prestado esta colaboração já este ano em instalações de alguns destes serviços em Setúbal, no contexto do acolhimento de refugiados da guerra da Ucrânia".

Além disso, o município reforçou que "são cumpridos todos os requisitos técnicos inerentes a um atendimento social" e que a "recolha de informação só é feita com autorização expressa por escrito dos próprios", tratando-se de "um procedimento reconhecido e utilizado pelas entidades que, em Portugal, fazem este tipo de trabalho", repudiando "com a veemência toda e qualquer insinuação de quebra de sigilo no tratamento de dados de cidadãos ucranianos acolhidos nos seus serviços".

De acordo com o jornal, a Edintsvo foi subsidiada desde 2005 até março passado pela Câmara Municipal de Setúbal, tendo Igor Kashin e Yulia Khashin também questionado os refugiados sobre os familiares que ficaram na Ucrânia.

Entretanto, a Câmara Municipal de Setúbal retirou a técnica superior Yulia Khashin do acolhimento de cidadãos ucranianos, e vai pedir ao Ministério da Administração Interna que proceda a uma averiguação sobre a receção de refugiados por russos alegadamente pró-Putin. Contudo, não realizará uma investigação autónoma, por considerar que isso "não faz sentido".

Leia Também: Autarquia recusa comentar "troca de correspondência oficial" com Governo

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