Em declarações à agência Lusa, o presidente da Associação Portuguesa de Neumusculares (APN), Joaquim Brites, explicou que "o estudo piloto a 100.000 nascimentos estava aprovado e previsto para avançar no primeiro semestre, mas ainda estão a ser ultimadas algumas diligências".
Sublinhando a importância do diagnosticar precocemente a doença, o responsável alertou: "Preocupa-nos o facto de começarem a chegar crianças com três a quatro meses de atraso no diagnóstico. Durante estes meses já perderam imensos neurónios motores e isso condicionou a sua qualidade de vida futura".
"O Estado está a gastar dinheiro nos medicamentos e, se diagnosticar as crianças mais tarde, o dinheiro que está a investir não está a surtir o efeito esperado", acrescentou.
Joaquim Brites lembrou que há dois medicamentos aprovados em Portugal e que um deles "pode evitar a maior causa de mortalidade infantil por doença genética [a atrofia muscular espinal do tipo 1]".
Defendeu que é urgente que se abandone o "prognóstico de morte" - as crianças não tratadas têm uma prognóstico vida 2,5 anos -- e recordou: "Desde que as crianças passaram a ser tratadas não houve crianças a morreram por atrofia muscular espinal tipo 1. Já temos crianças com quatro e quase cinco anos vivas".
O presidente da APN recordou que a autorização para os preparativos para o projeto piloto em Portugal "foi aprovada em dezembro" adiantando que há alguns países europeus já com projetos piloto (Bélgica), outros que os estão a desenvolver (França) e outros que, tendo avançado com teste piloto, estão a ter "resultados fantásticos".
"A Áustria teve uma taxa de prevalência superior. Numa comunidade que estimavam mais pequena conseguiram descobrir uma taxa de prevalência superior em 30% ao que estimavam", exemplificou, insistindo: "temos urgência não só para preservar a qualidade de vida das crianças, como também para passarmos a saber exatamente qual é a taxa de prevalência da atrofia muscular espinal em Portugal".
Além da urgência no rastreio neo-natal, Joaquim Brites sublinhou a necessidade de ter serviços de saúde desenhados para responderem às necessidades dos utentes, dando o exemplo da falta de fisioterapia.
"Estas crianças diagnosticadas precisam de apoio constante, precisam de fisioterapia que não têm, os hospitais não estão preparados para dar, as consultas multidisciplinares não estão a funcionar", afirmou, lembrando que "a medicina física e de reabilitação considera estes doentes prioritários, mas não urgentes".
O que acaba por acontecer -- acrescentou -- "é que as famílias estão a recorre a sessões de fisioterapia nos convencionados e, às vezes, nos privados, que não têm qualidade e lhes consomem recursos financeiros. Há famílias a gastarem 1.500 euros de fisioterapia por mês, sem qualquer resultado".
"Se há famílias que podem gastar em terapias adicionais, outras não podem", insistiu.
O responsável contou ainda que, por falta de fisioterapia, há doentes neuromusculares a deixarem de comer e de escrever porque não têm capacidade física de agarrar na colher ou na esferográfica.
A falta de acompanhamento, a passividade e o excesso de burocracia são, aliás, alguns dos problemas identificados num estudo etnográfico que será hoje apresentado em Lisboa, numa conferência que decorre no Centro Cultural de Belém.
Sobre o excesso de burocracia, Joaquim Brites exemplificou: "Não se justifica, por exemplo, que pessoas que compraram uma carrinha há cinco anos continuem à espera que seja aprovada a sua transformação para poderem levar uma cadeira de rodas com o filho".
"Aprovou-se a cadeira de rodas, deu-se a cadeiras de rodas e a transformação da carinha não está aprovada", sublinhou.
Um estudo, que acompanhou doentes, familiares, cuidadores e médicos, concluiu igualmente que a informação e características usadas para definir atualmente os tipos da doença não são suficientes para ilustrar a diversidade de situações e as necessidades dos doentes.
Este trabalho mostra que um dos grandes entraves ao desenvolvimento e estímulo dos portadores de atrofia muscular espinal é a "postura limitadora da sociedade em geral"
"O desconhecimento geral [da sociedade] acerca da doença faz com que muitas vezes se assuma que as capacidades intelectuais dos doentes também são limitadas", indica o trabalho.
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