Advogado recusa atribuir culpas nos incêndios de Pedrógão Grande

O advogado José Dinis Marques, que representa um assistente gravemente ferido nos incêndios de Pedrógão Grande, em 2017, recusou hoje atribuir culpas aos arguidos, apontando o Estado como um dos responsáveis pelas consequências dos fogos naquele ano.

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Lusa
19/05/2022 16:20 ‧ 19/05/2022 por Lusa

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Pedrógão Grande

"Não sou capaz de imputar a ninguém responsabilidade direta, porque, para mim, enquanto o Estado português não fizer mais, em termos de planeamento, não haverá amanhã bombeiros, voluntários, para dar a cara e o corpo, e responder perante as necessidades e evitar mortos, feridos e danos materiais", afirmou José Dinis Marques, no Tribunal Judicial de Leiria, nas alegações finais, do julgamento para determinar eventuais responsabilidades criminais naqueles incêndios.

Sem quaisquer dúvidas de que há culpados, o advogado disse ter "sérias dúvidas" de que as culpas possam ser imputadas a cada um dos 11 arguidos, individualmente, considerando que nenhum deles, "num só momento, tenha dito, em consciência 'eu não vou fazer isto, ainda que alguém venha a morrer queimado'".

Aos arguidos, José Dinis Marques deixou "uma palavra especial" e o apelo para que "tenham calma e fé", enquanto lamentou não ver no julgamento "pessoas com responsabilidades altas, membros do Governo, que têm obrigação de planear o território, a floresta e omitiram todos os seus deveres ao longo de décadas", defendendo a necessidade de alterar o planeamento florestal.

"Não é fácil apontar o dedo a A, B ou C, mas pode ter havido da parte de alguns dos arguidos alguma incúria", declarou o advogado, não pedindo a condenação de nenhum, mas deixando expressa a "confiança nos colegas, nos procuradores e no tribunal".

Por seu turno, o advogado Afonso Pinho Alves que, com Gonçalo Ribeiro, representa o bombeiro Rui Rosinha, outro dos feridos graves nos incêndios, defendeu que "a culpa não poderá morrer solteira" e uma condenação como a pedida pelo Ministério Público "não configura um casamento à força".

Destacando a "inexistência completa de faixas de gestão de combustível", sobretudo na EN 236-1, onde morreram a maioria das vítimas, Afonso Pinho Alves salientou que os arguidos não tinham consciência de que a não prática dos atos a que estavam legalmente obrigados iria dar origem a mortes e ofensas à integridade física, "mas era clara a possibilidade objetiva de prever esse desfecho".

"Os arguidos eliminaram a possibilidade de salvar as vítimas", acrescentou.

Rui Rosinha era chefe de uma viatura dos Bombeiros Voluntários de Castanheira de Pera mobilizada para os incêndios em 17 de junho de 2017, na qual seguiam mais quatro bombeiros.

"Todos sofreram queimaduras", refere o Ministério Público (MP), salientando que devido àquelas o bombeiro Gonçalo Conceição acabou por morrer dois dias depois, na Unidade de Queimados do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra.

Em causa neste julgamento estão crimes de homicídio por negligência e ofensa à integridade física por negligência, alguns dos quais graves. No processo, o MP contabilizou 63 mortos e 44 feridos quiseram procedimento criminal.

Os arguidos são o comandante dos Bombeiros Voluntários de Pedrógão Grande, Augusto Arnaut, então responsável pelas operações de socorro, dois funcionários da antiga EDP Distribuição (atual E-REDES) e três da Ascendi, e os ex-presidentes das Câmaras de Castanheira de Pera e de Pedrógão Grande, Fernando Lopes e Valdemar Alves, respetivamente.

O presidente da Câmara de Figueiró dos Vinhos, Jorge Abreu, também foi acusado, assim como o antigo vice-presidente da Câmara de Pedrógão Grande José Graça e a então responsável pelo Gabinete Florestal deste município, Margarida Gonçalves.

Em sede de alegações, na quarta-feira, o Ministério Público pugnou pela condenação de nove dos 11 arguidos. As exceções foram Jorge Abreu e o funcionário da ex-EDP José Geria, neste último caso referindo que deve ser "julgado de acordo com a prova produzida".

As alegações prosseguem na segunda-feira, a partir das 09:30.

Leia Também: Decisão do tribunal é "fundamental" para evitar repetição da tragédia

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