O alerta foi lançado pelo Instituto de Apoio à Criança (IAC) e pela Associação Portuguesa de Mulheres Jurista (APMJ), que pedem alterações legislativas urgentes ao regime de regulação das responsabilidades parentais para proteger as vítimas de violência doméstica.
Em causa está a segurança das vítimas nas questões de guarda e de visitas dos filhos depois do divórcio.
A presidente executiva do IAC disse à Lusa que "em nome do interesse da criança estão a colocar-se em perigo as mães e os próprios menores".
"Muitos dos homicídios são praticados já depois das separações", lembra Dulce Rocha, explicando que "os agressores servem-se dos encontros, a propósito dos convívios com os filhos, para continuar a amedrontar, ameaçar, bater e até matar as ex-companheiras".
Teresa (nome fictício) conheceu este perigo após a separação: "Ele tornou-se mais agressivo porque não queria separar-se. Não aceitou a rejeição e ficou descontrolado".
O ex-marido foi condenado a dois anos e três meses de prisão, com pena suspensa, e proibição de se aproximar de Teresa. Mas os contactos mantiveram-se, porque o agressor "não estava inibido de se aproximar dos filhos", conta à Lusa.
Dulce Rocha diz que se "romantiza muito" a relação entre pais e filhos e ignora-se o risco de violência.
"É urgente alterar esta lei de 2008. São direitos humanos que estão em causa", defende, sublinhando ainda "o terror" a que muitas crianças são submetidas por assistirem àquela "luta permanente, que é muito má para o seu desenvolvimento".
Esta opinião é sustentada pelo psiquiatra Emílio Salgueiro, que acrescenta ainda o facto de muitas crianças se culpabilizarem pelas discussões dos pais.
Teresa sentiu isso e considera que o processo em tribunal foi "outra violência": "Estou há cinco anos em tribunal e não consegui que os meus filhos fossem protegidos", lamenta, adiantando que os dois filhos têm de fazer psicoterapia.
"Se o tribunal tivesse tido uma resposta em tempo útil e tivesse inibido o pai durante algum tempo das responsabilidades parentais, se calhar isto não tinha acontecido", desabafa.
Teresa diz que conhece situações em que o pai mantém os comportamentos violentos, mas não se faz nada.
"A mãe tem de estar escondida e o pai tem direito a ver os filhos. Não sei que bem isto pode fazer às crianças", interrogou-se Teresa, que admite fazer queixa ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem sobre esta situação.
Emílio Salgueiro diz que os filhos mantêm uma ligação afetiva ao agressor, mesmo quando vivem com a mãe numa casa de acolhimento.
Muitas crianças dizem "eu gosto do meu pai só queria que ele não batesse na minha mãe", conta o psiquiatra, ressalvando os ofensores "não são agressivos com os filhos".
Sobre os encontros que os pais são obrigados a manter em nome dos filhos, considera que há casos em que "são impossíveis": "Se estão gravemente desavindos como se vão entender? Só a presença um do outro desencadeia violência", sublinha
As associações querem que haja uma alteração legislativa que vá ao encontro da Convenção de Istambul, que impõe aos Estados que garantam a segurança das vítimas nas questões de guarda e de visitas depois do divórcio.
A APMJ já entregou uma proposta que está a ser analisada na Subcomissão de Igualdade.
A presidente da Subcomissão de Igualdade e deputada socialista, Elza Pais, reconhece que "tem de se fazer alguma coisa", mas afirma que é preciso garantir que as crianças "não perdem o direito" de ver os progenitores, a não ser que sejam agredidas, "mas essa situação já
Em dezembro de 2013 estavam detidos 427 reclusos pelo crime de violência doméstica, mais 189 face a 2011, e havia 210 agressores com pulseira eletrónica, contra 51 em 2011.