Segundo explicou à Lusa o presidente da associação, José Bourdain, os tribunais "estão a inundar" os diretores das unidades com diligências relativas a estas pessoas, designadamente o pagamento de contas ou a resolução de problemas nos bancos, impedindo-os de fazerem o seu trabalho: gerir as unidades.
"Quer os procuradores do Ministério Público, quer os tribunais, inundam-nos com uma série de diligências que nos obrigam a tomar, relativas a pessoas que foram abandonadas pela família, pessoas que já não têm família ou até mesmo imigrantes ilegais", contou à Lusa José Bourdain, salientando que, nalguns casos, o diretor da unidade fica responsável por tratar dos assuntos pessoais desses utentes e que muitos destes responsáveis têm várias pessoas a cargo.
O diretor da unidade -- sublinhou - , "em vez de dirigir a unidade de saúde (...), anda envolvida em tarefas administrativas a tratar de coisas com as quais não tem nada a ver".
José Bourdain disse que este tipo de casos tem vindo a crescer e, por isso, a Associação Nacional de Cuidados Continuados (ANCC) vai pedir uma reunião com urgência à procuradora-geral da República para tentar encontrar uma solução.
"Isto paralisa o trabalho da unidade", lamenta o responsável, que diz ter exposto já o caso ao Governo, sem que tivesse tido resposta. "O Governo não resolve, não legisla para resolver este problema", lamentou.
Em declarações à Lusa, Dulce Vargas, diretora da CerciTop (uma das associadas a ANCC), contou que já foi obrigada a abrir contas em conjunto com o utente.
Explicou que, quando a pessoa não está capaz de tomar uma decisão por si, é preciso dar entrada em tribunal de um processo para se nomear uma espécie de tutor (processo de maior acompanhado).
Quando a pessoa não tem família, a instituição, ou a diretora da unidade, acaba por ficar responsável por estas pessoas, muitas das quais estão a ocupar vagas na rede de cuidados continuados, embora devessem estar em lares.
Quando a pessoa ainda tem família, "se for a família a entregar o processo em tribunal, é a morada da família que fica".
"Contudo, se quisermos ajudar e facilitar as famílias, entregando nós o processo, aí são as instituições, ou os próprios diretores, a ficarem responsáveis. Já cheguei a receber informações na minha morada fiscal", acrescentou.
Nestes casos, os diretores das instituições ficam "obrigados a visitar a morada da pessoa, onde ela já não está, e a tratar de tudo o que tenha que ver com contratos de luz e gás", exemplificou a responsável, pedindo uma solução para estes casos.
Segundo os dados fornecidos à Lusa, os associados da ANCC têm nas suas instituições 275 casos de maior acompanhado, 61 utentes abandonados pelas famílias e 54 utentes sem família internados (embora nem todos dependentes e sob responsabilidade das instituições ou dos diretores).
O presidente da ANCC diz que uma solução seria "criar um departamento do Estado, eventualmente com magistrados a liderar, e em que fosse o próprio Estado português a assumir estas responsabilidades".
"Quem deve assumir as responsabilidades destas pessoas que, do ponto de vista cognitivo, não têm capacidade de gerir o seu dia-a-dia deve ser o Estado, não estas unidades ou os diretores das unidades", sublinhou.
O responsável defendeu ainda que, em última análise, "as ordens dos tribunais colidem com os direitos da empresa no que se refere ao contrato de trabalho que tem com o seu trabalhador".
"A empresa está a pagar um salário, tem uma pessoa para exercer uma determinada função e essa pessoa está ao serviço do Estado português e dos tribunais portugueses. É impensável, além de que não está a cumprir a sua função, que é dirigir a unidade de saúde", acrescentou, insistindo que estes casos, nos últimos dois anos, têm vindo a aumentar.
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