"Quando Manuel Pinho sabe que vai exercer funções como ministro, faz um acordo com Ricardo Salgado, presidente do BES, para se manter ao serviço do GES e, no exercício das funções como ministro, tomar decisões que fossem dirigidas aos interesses diretos ou indiretos do Grupo", afirmou o procurador Rui Batista na primeira sessão do julgamento no Juízo Central Criminal de Lisboa, após dois adiamentos na semana passada devido à greve dos funcionários judiciais.
Segundo o representante do MP, o designado pacto corruptivo "foi feito e dissimulado por Manuel Pinho através de uma demissão", com a consequente resposta de Ricardo Salgado a aceitar a demissão e a definição de contrapartidas, entre as quais o pagamento de 15 mil euros mensais, de uma verba de 500 mil euros e outros benefícios que se estendiam também à mulher do antigo governante, Alexandra Pinho, igualmente acusada no processo.
"Este acordo foi para manter a relação de Manuel Pinho com o BES. As verbas não foram declaradas à Autoridade Tributária e foram ocultadas através de 'offshores'. Alexandra Pinho participa, associando-se a essa estrutura de ocultação numa 'offshore' da Tartaruga Foundation, podendo movimentar essa conta, coisa que faz durante o tempo que Manuel Pinho foi ministro. Isso foi o mercadejar do cargo", resumiu.
Para Rui Batista, as decisões tomadas por Manuel Pinho enquanto ministro da Economia não foram segundo o interesse público, mas em nome do interesse do GES, ao citar os projetos PIN (projetos de interesse nacional), a promoção de projetos aos quais o BES estava ligado, a reversão de uma decisão da Autoridade da Concorrência na compra da Autoestradas do Atlântico pela Brisa e o papel na candidatura da Comporta para a organização da Ryder Cup.
"Uma vez terminada essa escolha da Comporta, volta ao BES. Essa contrapartida da reforma aos 55 anos é substituída por um cargo no BES África, com condições remuneratórias que eram aquelas que lhe seriam asseguradas se tivesse a reforma", sentenciou.
Ricardo Sá Fernandes, advogado do ex-ministro, considerou os crimes de fraude fiscal e branqueamento "uma questão de direito", uma vez que o dinheiro foi posteriormente regularizado junto do Fisco, e centrou a argumentação na contestação ao crime de corrupção.
"Há uma enorme fragilidade da acusação. Como é que se estabelece um pacto corruptivo com condições estipuladas desde 2004? Manuel Pinho não é um corrupto", disse.
Já Manuel Magalhães e Silva, advogado de Alexandra Pinho, defendeu que a sua cliente "está a ser julgada por ser mulher de Manuel Pinho", enquanto Francisco Proença de Carvalho, mandatário de Ricardo Salgado, assumiu ser "o espelho processual" da situação do ex-banqueiro, em alusão ao diagnóstico de doença de Alzheimer atribuído a Salgado, que foi recentemente alvo de uma perícia neurológica.
"Está uma perícia em curso, vamos ver o que vem da perícia. Se uma pessoa não está capaz de se defender e limitado na capacidade cognitiva, o tribunal tem a responsabilidade de dizer que justiça quer", notou, concluindo: "Que o tribunal não deixe de tirar as devidas consequências".
O antigo ministro da Economia Manuel Pinho, em prisão domiciliária desde dezembro de 2021, é acusado de um crime de corrupção passiva para ato ilícito, outro de corrupção passiva, um crime de branqueamento e um crime de fraude fiscal.
A sua mulher, Alexandra Pinho, está a ser julgada por um crime de branqueamento e outro de fraude fiscal - em coautoria material com o marido -, enquanto o ex-presidente do BES, Ricardo Salgado, responde por um crime de corrupção ativa para ato ilícito, um crime de corrupção ativa e outro de branqueamento.
[Notícia atualizada às 15h07]
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