Constam, na certidão enviada pelo Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) para os serviços do Ministério Público (MP) no Supremo Tribunal de Justiça (STJ), mais de 20 escutas telefónicas que ligam António Costa ao processo do lítio que levou à sua demissão.
A informação foi avançada pelo jornal Observador, que diz que as escutas não foram feitas diretamente ao telefone do primeiro-ministro, resultando do denominado conhecimento fortuito. Ou seja, resultando de Costa ter falado com alguém que estava sob escuta.
As conversas terão acontecido entre 11 de novembro de 2020 e este ano, envolvendo o chefe de gabinete de Costa, Vítor Escária, o empresário Diogo Lacerda Machado e o ministro das Infraestruturas João Galamba, todos eles constituídos arguidos neste processo. Lacerda e Escária estão, recorde-se, sob detenção judicial, a aguardar primeiro interrogatório.
Segundo o avançado pela SIC Notícias, Escária tinha 75.800 euros em numerário no seu gabinete, quantia que acabou por ser confiscada pelas autoridades durante a operação levada a cabo na terça-feira, dia 7 de novembro - segundo a estação, chamar-se-á Operação Influencer. A Polícia de Segurança Pública (PSP) e os procuradores do Ministério Público terão encontrado o dinheiro no escritório do chefe de gabinete de António Costa.
"Não sei a que conversas se referem", reagiu Costa
"Não sei a que conversas se referem. Não comento processos judiciais, muito menos que desconheço em absoluto", disse ao Observador o primeiro-ministro, que também foi 'apanhado' por estas escutas a falar com o antigo ministro do Ambiente João Matos Fernandes, que não foi constituído arguido. É, sim, suspeito de ter cometido dois crimes de corrupção passiva e prevaricação.
Segundo a agência Lusa, terá, em 2020, junto do ministro das Infraestruturas e então secretário de Estado da Energia, João Galamba, imposto ao Resilient Group a integração da REN, EDP e Galp no projeto de hidrogénio verde 'Green Flamingo'.
Sobre se António Costa foi informado de que um membro do Governo estaria sob escuta, o primeiro-ministro disse apenas que "não".
Costa e Matos Fernandes evitaram falar sobre certos assuntos ao telefone
Segundo o Observador, os investigadores acreditam que as conversas entre Costa e Matos Fernandes são indiciárias de que houve fugas de informação. Isto porque o primeiro-ministro e o antigo ministro combinaram, em duas ocasiões, encontros pessoais para debater os procedimentos administrativos associados à exploração do lítio e do hidrogénio, preferindo não falar sobre tal ao telefone.
“Já te disse, falaremos disso mais tarde!”, chegou mesmo a dizer António Costa a Matos Fernandes, que alegadamente estaria a insistir em falar sobre o assunto ao telefone. Uma reação que estará a levar os investigadores a suspeitar que Costa saberia que estava sob escuta.
Em janeiro de 2021, o semanário Expresso tinha já noticiado o envio de três escutas telefónicas para o então presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Joaquim Piçarra.
Os autos enviados ao MP, que incluem mais de 20 escutas, têm também uma conversa entre António Costa e o Marcelo Rebelo de Sousa e entre o primeiro-ministro e o presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva. Não serão, no entanto, relevantes para a investigação, alega saber o Observador, argumentando que estão nos autos apenas graças a uma mudança do paradigma legal, tornando mais difícil ordenar a destruição de escutas, a partir de 2007.
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