O email do filho e a (não) intervenção. Marcelo esclarece caso das gémeas

O chefe de Estado convocou os jornalistas para uma declaração no Palácio de Belém, esta segunda-feira.

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Daniela Filipe
04/12/2023 18:15 ‧ 04/12/2023 por Daniela Filipe

País

Marcelo Rebelo de Sousa

A partir de uma localização não usual no Palácio de Belém, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, prestou uma declaração inesperada sobre o caso das gémeas luso-brasileiras com atrofia muscular espinhal que foram tratadas com Zolgensma, um medicamento que custa mais de dois milhões de euros, no Hospital de Santa Maria, em Lisboa. Perante os jornalistas, que convocou esta tarde de segunda-feira, o chefe de Estado adiantou ter mandado "apurar tudo o que pudesse existir" sobre o caso, tendo dado conta da linha temporal da intervenção da Presidência da República.

Marcelo, que garantiu que não se recordava "minimamente" de como a trama tinha começado, confirmou que, a 21 de outubro de 2019, recebeu um email do filho, Nuno Rebelo de Sousa, sobre a situação das meninas, que era "uma corrida contra o tempo".

"Tinham enviado para Santa Maria a documentação e não tinham resposta. [Perguntou] se era possível saber. No mesmo dia, despachei para o chefe da Casa Civil", explicou, ao mesmo tempo que adiantou ter enviado a documentação recolhida para a Procuradoria-Geral da República (PGR), que abriu um inquérito ao caso.

A resposta chegaria dois dias depois, tendo sido garantido ao filho do Presidente que o processo foi recebido, mas que estavam a ser "analisados vários casos do mesmo tipo", com capacidade de resposta "limitada". 

Nessa linha, Nuno Rebelo de Sousa contactou novamente a Casa Civil, tendo o organismo apontado que "a prioridade é dada aos casos portugueses, daí que não tenham sido contactados, nem devam ser", uma vez que as crianças não se encontravam no país.

Marcelo Rebelo de Sousa detalhou ainda que os pais das meninas foram informados de que a documentação tinha sido enviada, e assim terminou a intervenção da Presidência.

"Termina aqui a intervenção da Presidência da República. A partir daqui, não há qualquer informação na sequência do processo", disse, e reiterou que "isto foi o que foi apurado". 

Caso das gémeas? "Está aberto um inquérito e eu estou satisfeito"

O Presidente da República saudou hoje a abertura pelo Ministério Público de um inquérito sobre o caso das gémeas vindas do Brasil que receberam no Hospital de Santa Maria um tratamento com um dos medicamentos mais caros do mundo.

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O chefe de Estado considerou, assim, ter "certamente" condições para manter o seu cargo, uma vez que "não há uma intervenção do Presidente da República pelo facto de ser filho ou de não ser filho".

E, na sua ótica, o que "fica claro é que o Presidente da República Portuguesa, perante uma pretensão de um cidadão como qualquer outro, dá o despacho mais neutral e igual a que deu em 'n' casos. [...] Recebi como receberia de qualquer outro e mandei a quem deveria mandar", disse, ressalvando que o filho "quis ser solidário".

Questionado quanto à possibilidade de Nuno Rebelo de Sousa ter contactado "alguém" no Ministério da Saúde, o Presidente foi taxativo: "Não sei, e espero bem que não tenha falado. Mas isso já não é comigo."

"Nestas matérias sou muito estrito e, portanto, espero bem que ele [ou outro conhecido] não tenha de algum modo invocado o meu nome ou invocado a situação de ter relacionamento comigo. Se se viesse a comprovar, seria, a meu ver, totalmente inaceitável. Parto do princípio de que isso não aconteceu e quero deixar a quem investiga toda a liberdade para investigar. Seja filho, seja primo, seja irmão, não pode invocar o meu nome. Seria muitíssimo mais lamentável", complementou.

De notar que, segundo confirmou a PGR ao Notícias ao Minuto, "o processo encontra-se em investigação no Departamento Central de Investigação e Ação Penal Regional de Lisboa e, por ora, não corre contra pessoa determinada". O caso está também a ser averiguado pela Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS), além de ser objeto de uma auditoria interna no Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Norte, do qual faz parte o Hospital de Santa Maria.

Vale a pena recordar que as meninas já estariam a ser tratadas no Brasil mas, apesar da contestação dos médicos, foram admitidas em solo português, para receber o tratamento também administrado à bebé Matilde. A voz que corria nos corredores era que tal se devia à influência do Presidente da República, que negou estar associado ao caso, ainda que tenha admitido que o pedido foi recebido pela Casa Civil, que interveio.

O programa da TVI Exclusivo revelou, contudo, que o chefe de Estado fez referência à situação das gémeas em emails com um neuropediatra, em 2019, e que a família das meninas seria conhecida do filho e da nora de Marcelo Rebelo de Sousa.

Na declaração de hoje, o chefe de Estado garantiu que o processo "não se acelerou" com a intervenção do seu filho, tendo ressalvado que não se recordava do email referido pelo médico.

"Não me lembro de um email que o médico divulgou na comunicação social, mas é ele próprio que diz que eu lhe disse que não havia privilégio nenhum", disse.

MP investiga suspeitas de 'cunha' no caso das gémeas luso-brasileiras

Segundo confirmou a Procuradoria-Geral da República (PGR) ao Notícias ao Minuto, "o processo encontra-se em investigação no Departamento Central de Investigação e Ação Penal Regional de Lisboa e, por ora, não corre contra pessoa determinada".

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Além dos emails, o dossier de registo e de inscrição das bebés desapareceu, assim como uma carta entregue de indignação dos médicos, levando a unidade hospitalar a abrir uma auditoria. Entretanto, o Conselho de Administração do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte (CHULN) confirmou ter recebido a referida carta, tendo adiantando apenas que "o caso seguirá a sua tramitação interna", num comunicado a que o Notícias ao Minuto teve acesso.

De todo o modo, e apesar das reservas dos profissionais de saúde, a primeira consulta das crianças foi realizada mesmo sem a presença das bebés, que estavam internadas no Brasil. Esta consulta foi solicitada por um secretário de Estado à professora Ana Isabel Lopes, diretora do Departamento de Pediatria do Santa Maria, que nunca terá respondido aos contactos para entrevista.

A referência a um secretário de Estado surgiu também numa informação clínica e na justificação do medicamento à Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde (Infarmed), que foi pedido a um sábado e autorizado em dois dias, úteis de acordo com o programa. Ora, o secretário de Estado da Saúde era, na altura, António Lacerda Sales, que terá negado categoricamente qualquer interferência. Por seu turno, a ex-ministra da Saúde, Marta Temido, terá confessado que ouviu falar sobre o caso, mas assegurou que nem soube se as meninas tinham sido tratadas em Portugal, apesar de se ter mostrado disponível para prestar esclarecimentos.

As menores só foram examinadas no dia 2 de janeiro de 2020 e, mesmo antes da viagem para Portugal, a família já tinha comprado um T5 em Lisboa, com equipamentos de saúde. Viriam ainda fisioterapeutas, uma terapeuta da fala e uma enfermeira, detalhou a reportagem.

Já no Brasil, o Tribunal Regional Federal decidiu que as meninas não deveriam de receber o medicamento através do Estado, uma vez que a família não estava "em condição de pobreza e as crianças não [estavam] desassistidas".

[Notícia atualizada às 19h08]

Leia Também: Marcelo diz ser necessário "distribuir melhor a riqueza criada"

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