O presidente da Associação Nacional de Médicos de Saúde Pública (ANMSP), Gustavo Tato Borges, reconheceu, em declarações ao Notícias ao Minuto, que o surto de casos de hepatite A que se verifica em Portugal é "uma situação que, não sendo normal, não é alarmante".
Isto porque "estamos a falar relativamente de poucos casos, associados a uma doença que implica uma transmissão orofecal e, portanto, associada à ingestão de produtos contaminados com fezes e também a um contacto físico muito próximo, num grupo populacional muito específico, que não é tão fácil e habitual de causar uma disseminação alargada".
Na terça-feira, a Direção-Geral da Saúde (DGS) anunciou um surto da doença, com 23 casos em Portugal.
Para Tato Borges, "estamos com uma situação que, não sendo a ideal, não apresenta um risco acrescido para toda a população". Aqueles que "estão a ser contactados pelas autoridades de saúde para tratar do controlo desta situação" devem, ainda assim, "facilitar o acesso à vacinação e aos dados individuais, para podermos rapidamente conter" a situação.
O líder da ANMSP realçou que, entre 2016 e 2018, Portugal viveu uma realidade semelhante, "em que também houve um aumento de casos". "O trabalho foi feito de uma forma bastante adequada e acabou por desaparecer esse aumento de casos", argumentou.
"Vacinação precisava de ser mais divulgada"
Sobre a vacinação para a hepatite A, Gustavo Tato Borges esclareceu que existem vários "grandes critérios para fazer a vacinação".
Um é na pós-exposição, ou seja, "quando alguém foi diagnosticado com a doença e tem pessoas com quem tem contatos mais próximos ou partilha habitação", que devem ser vacinadas no espaço de duas semanas.
O outro critério prende-se com quem "sabe que vai ter contacto com alguém, de uma forma regular, que é doente", dando o exemplo de alguém que vá "tomar conta de um idoso que tem essa doença". Caso este em que a pessoa cuidadora "também tem direito à vacinação".
Existe ainda outra possibilidade que é "para pessoas que vão viajar para o estrangeiro, para países que têm esse risco acrescido porque a incidência de hepatite A é maior" e ainda "a população de homens que têm sexo com homens, que também têm essa recomendação desde esse tal surto de 2016-2018, e está colocada essa possibilidade de também poderem ser vacinados".
Esta vacinação precisava de ser mais divulgada, para que houvesse uma adesão maior pelas populações de risco
Tato Borges afirmou, ainda, que "esta vacinação é feita de uma forma regular" e "para muitos dos casos, é necessário haver uma proatividade por parte do cidadão que se enquadre nalguma destas circunstâncias para poder ser vacinado", excetuando a vacinação em pós-exposição, em que "são os serviços que vão à procura".
"Esta vacinação precisava de ser mais divulgada, para que houvesse uma adesão maior pelas populações de risco, de forma a podermos ter um efeito protetor mais acrescido e vermos menos casos a acontecerem no futuro. É aqui que está o cerne da questão: podermos dar mais oportunidades vacinais para que as pessoas, assim querendo, possam então proteger-se", concluiu o médico.
DGS reporta surto com 23 casos em Portugal
A maioria dos casos são homens com idades entre os 20 e os 49 anos, 44% em contexto de transmissão sexual, sem casos graves ou mortais reportados, informa a DGS na sua página da Internet.
"O Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA) identificou, entre os confirmados, seis casos das estirpes do vírus da hepatite A anteriormente identificada no surto que ocorreu entre 2016-2018, afetando vários países europeus, incluindo Portugal", salientou a DGS na mesma nota.
A DGS adiantou que, até ao momento, "não parece haver associação com o eventual consumo de alimentos específicos".
"Até à data, e de acordo com a informação disponível dos casos notificados, não parece haver associação com o eventual consumo de alimentos específicos, nomeadamente morangos, tendo em conta o alerta de segurança alimentar da Europa sobre a deteção e pré-venda, em Espanha, de lotes de morangos contaminados com vírus de hepatite A oriundos de Marrocos, país endémico de hepatite A", indicou.
Embora esteja em curso uma investigação epidemiológica, é verificado "um aumento de número de casos reportados em janeiro e fevereiro de 2024, em comparação com igual período de anos anteriores".
Em 2020, foram reportados quatro casos, entre janeiro e fevereiro, em 2021, dois casos, em 2022, seis casos, em 2023, dois casos, e em 2024, 18 casos.
Entre 2020 e 2023 foram contabilizados 102 casos.
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