E se deputados da AD e PS ficarem empatados? "Não interessa nada"
O Notícias ao Minuto falou com o constitucionalista Jorge Reis Novais, por forma a perceber o que está nas mãos de Marcelo Rebelo de Sousa - e como pode o Presidente da República 'jogar'.
© Jorge Reis Novais
País Governo
O resultado das eleições legislativas confirmou a viragem de Portugal à Direita, com a Aliança Democrática (AD) a estar no primeiro lugar da corrida com 79 deputados eleitos – numa altura em que faltam apurar os votos da emigração.
Enquanto os resultados – que darão origem aos últimos quatro de 230 mandatos – não chegam, o Presidente da República vai ouvindo os partidos com assento parlamentar. Marcelo Rebelo de Sousa recebeu na terça-feira a porta-voz do PAN, Inês de Sousa Real, na quarta-feira o líder do Livre, Rui Tavares, e hoje Belém abre portas a Paulo Raimundo (CDU).
As previsões apontam que será o líder da AD, Luís Montenegro, a ser indigitado como primeiro-ministro, mas perante os votos que faltam contar, quais são os cenários possíveis?
O Notícias ao Minuto tentou perceber o que tem agora o Chefe de Estado em mãos, e quais as opções por que poderá alinhar. Para isso, falou com o constitucionalista Jorge Reis Novais, que considerou “que o número de deputados não interessa para tomar qualquer posição”.
“A única coisa que importa – e que a Constituição diz – é que, tendo em conta os resultados, o Presidente da República deve apreciar quem é que, naquela composição da Assembleia da República, tem melhores condições para formar Governo”, explicou.
Reis Novais fez sobressair ainda que existe uma “confusão” sobre a questão de nomear o partido que mais votos tem e que mesmo o Presidente da República pode ‘cair’ nessa confusão. “Isso não existe em lado nenhum. Já houve tentativas de colocar isso na Constituição e foram rejeitadas. O Presidente tem toda a liberdade para nomear tendo em conta os resultados destas eleições”, defendeu.
Qualquer que seja a vontade do Presidente da República, só pode nomear este governo da AD
E se houver um empate técnico entre PS e AD? “Não interessa”
Apesar de serem remotas as hipóteses de haver um empate técnico entre PS e AD, ficando estes com o mesmo número de deputados, não deixa de ser possível, consoante a distribuição dos votos dos círculos da Europa e Fora da Europa. Questionado sobre este eventual cenário, Jorge Reis Novais considerou que esta situação não teria “absolutamente influência nenhuma” na hora de escolher, dependendo esta decisão apenas do Chefe de Estado.
“Depende da cabeça dele. Para mim mim é óbvio que só há um partido – quer haja um empate, quer um à frente, um atrás... isso não interessa nada”, reforçou Jorge Reis Novais, explicando que “o único critério que interessa” são as condições de cada partido para ter ‘luz verde’ na Assembleia.
“Nesta altura, só há um governo possível. Qualquer que seja a vontade do Presidente da República, só pode nomear este governo [da AD]”, reforçou.
“O Presidente da República pode dizer o que quiser, pode mandar para os jornais os recados que quiser, mas é óbvio que só pode nomear um governo liderado por Luís Montenegro”, defendeu.
E se o convite for feito ao Partido Socialista?
Jorge Reis Novais considerou que seria “duvidoso” que o Partido Socialista aceitasse, mas que, perante esse cenário, bateria de frente com a viragem à Direita que se fez sentir este ano. “Era reprovado pelos votos maioritários da AD e do Chega”, referiu, exemplificando com um episódio que se passou há quase uma década.
“É a mesma coisa que o anterior Presidente da República fez em 2015. Queria por força nomear o governo da Direita, que ele, no fundo, patrocinava. Foi uma pura perda de tempo porque nomeou aquele governo e durou um mês. Apresentou-se na Assembleia da República e foi reprovado e rejeitado”, exemplificou, assemelhando as duas situações separadas por quase uma década. “Seria isso que aconteceria. O PS apresentava-se na Assembleia da República e qual era o destino que tinha?”, atirou.
Mas se a AD é “única opção”, por que razão se fala em instabilidade?
O constitucionalista esclareceu ainda a falta de estabilidade de que se tem falado nos últimos dias, referindo que esta "é uma questão real porque apesar de a AD ser o único partido para formar governo, vai ser um governo minoritário".
Explicando que esta é, por definição, uma característica deste tipo de governos, o especialista referiu que a aprovação dos Orçamentos do Estado é uma prova disso.
“Se a AD quiser aprovar agora um Orçamento retificativo isso é problemático. E em novembro quando se for aprovar o Orçamento para o próximo ano, também vai ser problemático”, anteviu.
Falando no cenário atual, em que não há coligações fechadas e existe, inclusive, uma promessa de que estas não existirão [com o Chega], Reis Novais aponta mesmo que um primeiro Orçamento “ainda pode passar”, mas já o “segundo é muito difícil que um governo minoritário o faça passar”. Aqui teria de “haver uma coligação com o Chega” e isso permitiria, “em princípio”, uma certa estabilidade durante toda a legislatura. Não havendo uma coligação, cujo número de deputados permita dar 'luz verde' aos Orçamentos, "um governo minoritário tem sempre muitas dificuldades".
"Mesmo o primeiro [Orçamento] é difícil. O governo ainda está há muito pouco tempo, o chamado 'estado de graça', os partidos têm um certo receio de ser penalizados se o derrubarem e se forem a eleições. O primeiro Orçamento ainda será mais de passar. A partir daí é muito mais difícil, para não dizer impossível", entende Reis Novais, sublinhando que este cenário se realiza na inexistência de uma coligação.
Antes do convite, já 'há moção' de rejeição prometida
Quanto ao anúncio do Partido Comunista Português (PCP), que na quarta-feira disse que iria apresentar uma moção de rejeição ao governo da AD, o constitucionalista considera que essa não é mais do que marcação de uma posição e que "não tem efeitos práticos nenhuns", dado que todos os partidos de Esquerda somados não chegam à maioria absoluta. "É para marcar a agenda, mas sem nenhum efeito prático", concretizou.
Leia Também: "Prova de vida". Que disseram os partidos à prometida moção de rejeição?
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