Pintada com as cores dos cravos vermelhos, dos cartazes e das bandeiras de Portugal, de partidos e movimentos da sociedade civil, a Avenida da Liberdade voltou hoje a ser palco do tradicional desfile comemorativo do 25 de Abril. Hoje, uma festa especial, que assinalou o cinquentenário da revolução dos cravos.
"É a primeira vez. O meu pai costumava vir muito. Em honra dele vim aqui com a minha irmã e as minhas duas filhas", conta à Lusa João Cabral, de 42 anos.
De mão dada com a filha de quatro anos, explica que a trouxe ao desfile, embora considere ser "muito cedo" para falar com ela sobre a importância do 25 de Abril.
Atrás das duas chaimites, que seguiram na frente do desfile, uma coluna de centenas de milhares de pessoas fazia a festa de cravo ao peito ou em punho, num desfile que percorreu lentamente a avenida ao longo de mais de quatro horas.
"Se alguém pudesse duvidar que eles não passarão, temos aqui a demonstração disso mesmo", disse o presidente da Associação 25 de Abril, Vasco Lourenço, já no discurso de encerramento do desfile, quando muitos ainda não tinham sequer chegado a meio do percurso.
Como habitualmente, o desfile foi também um encontro de gerações, algumas que já tinham saído à rua há 50 anos, outras que nasceram em democracia e fazem questão de a celebrar, e até os filhos dessas, que viveram hoje o seu primeiro 25 de abril.
"Eu não estava lá, mas estou aqui", lia-se num dos muitos cartazes que enfeitavam a multidão.
Com um brilho nos olhos, enquanto observa o início do desfile, Isabel Lagoa, de 72 anos, não tem dúvidas em afirmar que o 25 de Abril "foi o dia mais feliz" da sua vida.
"Significa tudo. A liberdade das amarras do fascismo", sublinha.
Com a mesma idade que Isabel Lagoa tinha em 1974 (22 anos), a jovem Catarina Rocha diz à Lusa que vê refletido nos avós a importância que teve a revolução dos cravos.
"Vejo pelos meus avós a alegria que foi o 25 de Abril. Para os jovens o 25 de Abril é liberdade", afirma.
Nas faixas centrais da Avenida, centenas de milhares de pessoas participaram no desfile, desde a rotunda do Marquês de Pombal até à Praça do Rossio, num passo lento, que às 16:30, uma hora após começar, deixava as pessoas que ainda não tinham saído do ponto de partida a questionarem-se se a marcha ainda não teria arrancado.
Nas laterais, outras tantas aproveitaram a sombra das árvores para ver o desfile passar, vendo-se também muitos jovens sentados no cimo das árvores e das paragens de autocarro. Apesar de não estarem a participar na marcha, não esqueceram o cravo vermelho, nem as palavras de ordem.
No meio da felicidade e festejos, José Marques, de 80 anos e ex-preso político, reconheceu que "há muita coisa que falta", ressalvando que "a democracia vai-se fazendo ao longo da vida".
Após 50 anos, mais de metade da sua vida já foi passada em democracia, mas no cinquentenário da revolução dos cravos, lamenta que o país tenha descoberto finalmente "aqueles que no 25 de Abril preferiam estar no 24 de abril", referindo-se ao partido de extrema-direita Chega.
O alerta foi também deixado por Vasco Lourenço, sem referir o partido de André Ventura, falando em "tempos de incerteza e enorme preocupação", pelo contexto internacional, mas não só.
Sem especificar, alertou que "novos ditadores estão no terreno ou ameaçam surgir no horizonte", pondo em causa os valores de abril e encerrou o discurso, antes de se ouvir a segunda senha da revolução - "Grândola, Vila Morena", de José Afonso - com a frase que, durante a tarde, foi sendo repetida em uníssono: 25 de Abril sempre, fascismo nunca mais".
Leia Também: Os 50 anos do 25 de Abril vistos lá fora. "Um país aberto ao mundo"