Segundo a decisão de hoje do tribunal sediado em Estrasburgo, o caso remonta a fevereiro de 2012, quando a jornalista Cristina Ferreira, do Público, revelou que as autoridades tinham apreendido os computadores de dois ex-espiões então ao serviço da empresa Ongoing, "numa investigação criminal sobre corrupção de alto nível, acesso ilegal e abuso de poder" que esteve sob segredo de justiça entre agosto de 2011 e maio de 2012.
A jornalista viria a ser condenada pelo tribunal em março de 2017 a 100 dias de multa, correspondendo a um valor de 1.000 euros.
A sentença foi confirmada em dezembro desse ano pelo Tribunal da Relação de Lisboa, o que levou à apresentação de uma queixa por violação da liberdade de expressão.
O TEDH destacou que o artigo publicado por Cristina Ferreira "era uma questão de interesse público considerável" e que o caso e os seus suspeitos já tinham sido anteriormente noticiados, pelo que a justiça portuguesa deveria ter tido essa circunstância em atenção.
"É questionável se, tendo em conta a cobertura mediática do caso, os factos em investigação e a sua relevância política, era ainda necessário impedir a divulgação de informações que, pelo menos em parte, já eram do domínio público. Além disso, o tribunal observa que as autoridades nacionais não demonstraram de que forma, nas circunstâncias do caso, a divulgação (...) afetou negativamente a investigação judicial", lê-se na decisão.
Para o tribunal europeu, a justiça portuguesa limitou-se a uma "aplicação formal e automática do crime de violação do segredo de justiça", sem ter em conta o que já se sabia do caso e o suposto impacto na investigação da divulgação daquelas informações.
"Nestas circunstâncias, a proteção da informação em virtude do seu caráter secreto não pode constituir uma exigência imperiosa", disseram os juízes, concluindo: "O tribunal considera que a condenação da recorrente constituiu uma interferência desproporcionada no seu direito à liberdade de expressão e que, por conseguinte, não era necessária numa sociedade democrática".
O TEDH reconheceu a violação da liberdade de expressão da jornalista pelas decisões judiciais nacionais, impondo ao Estado português o pagamento de 1.000 euros por danos pecuniários e mais 510 euros para cobertura das despesas com este processo, num total de 1.510 euros.
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