Alberto Arons de Carvalho falava na comissão parlamentar de Cultura, Comunicação, Juventude e Desporto, no âmbito dos requerimentos dos grupos parlamentares do PCP, do PS e do Livre para ouvir o CGI da RTP sobre o Plano de Ação para a Comunicação Social anunciado pelo Governo.
"Queria assinalar que no Conselho Geral Independente há um consenso alargado em considerar esta medida como errada", começou por dizer Arons de Carvalho.
Até porque a medida é "cortar receitas previsíveis sem que se conheça alternativa que o Governo se propõe" para suprir "esse prejuízo".
De acordo com o plano do Governo para os media, os canais de televisão da RTP deverão gradualmente, durante os próximos três anos, eliminar a publicidade comercial das suas grelhas. Paralelamente, a redução do tempo dedicado à publicidade comercial deverá ser compensada com espaços de promoção e eventos culturais, de acordo com o plano.
Tal acontecerá nos próximos três anos, prevendo-se a eliminação total da publicidade em 2027, com redução de dois minutos/hora em 2025 e 2026.
O custo estimado total é de 20 milhões de euros e o impacto da redução de receita na RTP será de cerca de 6,6 milhões de euros por ano, ao longo de três anos.
"Não se percebe bem" sobre se o novo financiamento virá da Contribuição Audiovisual (CAV), valor que vem na fatura da eletricidade, de Indemnização Compensatória (IC) "ou virá do corte de alguns serviços de programas, de alguns canais", prosseguiu Arons de Carvalho.
"A meu ver não faz qualquer sentido uma medida destas sem dizer qual é a situação alternativa", considerou.
Arons de Carvalho destacou ainda um segundo ponto, que passa pelas contas feitas pelo Governo no Plano de Ação para os media, afirmando haver um "erro crasso" nas mesmas.
"O Governo considerou no seu documento (...) que estaríamos perante um corte de 18 milhões de euros. Ora, as contas que fazemos dão o dobro", salientou.
Ou seja, "se se prevê cortar no primeiro ano dois minutos, no segundo mais dois minutos - quatro minutos -, no terceiro ano os tais seis minutos, isso significa que no primeiro ano temos seis milhões de euros a menos, no segundo 12 [milhões] e no terceiro 18 [milhões]", prosseguiu o membro do CGI.
Assim, "se somarmos seis, mais 12, mais 18, dá 36 milhões. Penso que isto é um erro, não diria indescupável, mas muito possivelmente inconcebível numa situação destas", acrescentou, referindo que o Governo deveria esclarecer esta situação.
Por último, lembrou que a RTP tem uma lei de financiamento, há os Estatutos da RTP e que tudo "isso passou pela Assembleia da República".
Por isso, "pergunto se uma questão desta relevância deveria apenas vigorar num Contrato de Concessão e não deveria estar integrado numa Lei do Orçamento, numa alteração legislativa à existente", questionou.
E acrescentou: Esta matéria "suscita problemas de constitucionalidade, há constitucionalistas que dizem que pôr em causa o regular funcionamento de um serviço público de rádio e televisão através de uma quebra sistemática, grande de financiamento, põe em causa o direito à informação".
Salientou que atualmente "há um consenso europeu absoluto sobre a relevância do serviço público de media, há documentos internacionais, não apenas no Conselho da Europa", e o último grande documento europeu relevante sobre o tema é o 'Media Freedom Act' [Liberdade dos Meios de Comunicação Social].
Este regulamento tem "considerandos e cláusulas relativas ao modelo de serviço público, ao financiamento do serviço público" e isso "está tudo a ser ignorado, o que me parece inaceitável", rematou.
Por sua vez, o deputado do PSD Carlos Reis considerou que se tratava de um "ataque ao Governo".
Em resposta, Arons de Carvalho disse que não lhe competia, nem ao CGI "entrar na luta político-partidária".
Mas destacou o "facto de dois antigos membros do Governo [do PSD] que tem responsabilidades sobre o modelo da RTP, Nuno Morais Sarmento e Miguel Poiares Maduro" terem referido "aquilo que pensam" sobre o tema, considerando que isso deveria ser tido em conta não só pelo deputado Carlos Reis, como também pelo Governo.
O Governo "propõe-se acabar com a publicidade, mas não há uma linha de pensamento que se conheça sobre qual é a alternativa" e essa "é uma questão que não está explicada", rematou.
[Notícia atualizada às 15h17]
Leia Também: Administração da RTP espera reunir-se com ministro a "muito curto prazo"