A agência Lusa visitou três dessas povoações, Gondramaz, no concelho de Miranda do Corvo, Candal e Talasnal, no vizinho município da Lousã, e verificou que o traço comum continua a ser a construção das paredes com xisto, a inclusão de pinho, castanho ou carvalho nas portas, janelas e varandas, e a cobertura com telha serrana e loisas.
Porém, estas lajes naturais de xisto, outrora extraídas nas pedreiras que os autóctones conheciam e mantinham de geração para geração, têm atualmente um uso especialmente decorativo, colocadas sobre os telhados que dominam ao longe a silhueta de cada povoado.
Os dois concelhos, no distrito de Coimbra, têm diferentes regras para a recuperação das casas serranas, adotadas pelas respetivas câmaras municipais.
Margarida Amaral, embora resida na Lousã, decidiu fazer os investimentos da sua empresa familiar no Gondramaz, terra do escultor popular Carlos Rodrigues, em Miranda do Corvo, cuja autarquia diz ser mais flexível a aprovar os projetos.
"Temos de conseguir conjugar de uma forma equilibrada o antigo com o contemporâneo", defendeu a arquiteta.
A dona do empreendimento turístico Mountain Whisper salientou que, "hoje em dia, existem materiais e formas construtivas que ajudam a construir de uma forma completamente diferente", proporcionando um conforto e uma fruição da natureza que antes não estavam ao alcance dos moradores.
"No Gondramaz, temos duas piscinas e um bar, enquanto umas paredes de vidro nos fazem olhar para a paisagem", disse, enfatizando que tais inovações não são permitidas nos lugares do concelho da Lousã que também fazem parte da rede Aldeias do Xisto.
"Queremos que as pessoas venham para o nosso espaço para sentir a natureza. Pode estar a chover e temos toda a vegetação à nossa volta", sublinhou a empresária, de 41 anos, que comprou sete casas, desde 2012, tendo projetado e concretizado a sua reconstrução.
Logo na primeira experiência, procurando "seguir a linguagem arquitetónica" da aldeia, Margarida Amaral reutilizou "ao máximo os materiais que já existiam" na habitação, tanto na estrutura como na decoração.
A construção em xisto "exige mão-de-obra especializada", pois atualmente "não é qualquer pessoa que faz" esse trabalho.
Joaquim Lourenço, de 52 anos, disse à Lusa que "é cada vez mais difícil" encontrar madeiras velhas para reutilizar na renovação das casas do Talasnal, onde detém vários imóveis.
Até agora, o empresário da Lousã conseguiu reaproveitar telhas, loisas, barrotes e vigas das construções pré-existentes, um problema que não se coloca relativamente às pedras de xisto, que abundam em toda a Serra da Lousã.
No caso das loisas, para telhados, pavimentos e revestimentos de paredes, algumas pessoas optam por ir comprá-las em Vila Nova de Foz Côa e noutras zonas do país, embora sejam diferentes.
"No Talasnal, não há grandes erros nas soluções encontradas. é um bom exemplo de reabilitação", assegurou Joaquim Lourenço, dono da empresa Montanhas de Amor.
Tem sete unidades para alojamento e uma taberna a funcionar no Talasnal, além de uma casa no vizinho Casal Novo, ambos integrados nas Aldeias do Xisto, investindo igualmente, para fins turísticos, na recuperação de edifícios de granito em Fornos de Algodres, no distrito da Guarda.
O reformado António Paiva Henriques, de 66 anos, reabilitou uma casa para a família no Candal.
Como laborou longos anos na ex-Junta Autónoma de Estradas (JAE), após ter passado por uma pequena firma de construção da Lousã, o reformado aprendeu muito jovem a arte de construir e reparar muros.
"Os muros e pontões eram maioritariamente feitos com pedra à vista", recordou à Lusa.
Enfatizou que a matéria-prima nunca falta ao longo da estrada nacional 236, entre Lousã e Castanheira de Pera, onde andava regularmente ao serviço da JAE.
"Hoje, com o desenvolvimento, as pessoas querem coisas mais rápidas", adiantou o pedreiro, para indicar, por exemplo, que no passado as loisas "eram extraídas sem pressa", ao ritmo da vida dos serranos, e que a madeira era geralmente de castanheiros seculares.
Residente em Coimbra, Maria da Conceição Alexandrino é proprietária há mais de 20 anos de uma casa no Candal, cujas obras recentes foram efetuadas por António Paiva Henriques.
Em geral, na Serra da Lousã, "as pessoas têm privilegiado os produtos locais" na reconstrução.
"Não vemos nenhuma extravagância", concluiu a professora de Físico-Química reformada.
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