Reportados jovens com lesões neurológicas graves por inalar "gás do riso"

Jovens com lesões neurológicas graves, resultantes do consumo de óxido nitroso (gás do riso) para fins recreativos, estão a ser identificados nos hospitais portugueses, uma situação acompanhada com apreensão pelos profissionais de saúde e forças de segurança.

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Lusa
22/03/2025 08:42 ‧ ontem por Lusa

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óxido nitroso

Os hospitais têm comunicado esses casos ao Centro de Informação Antivenenos (CIAV) do INEM, que desde 2020 registou 21 situações, a maioria envolvendo rapazes entre os 20 e os 29 anos, disse à agência Lusa a coordenadora do CIAV, Fátima Rato.

 

Em 2020, foram registados três casos, quatro em 2021, um em 2022. Em 2023 não foi registada nenhum, e, em 2024, oito. Nos primeiros dois meses deste ano, já foram registadas cinco intoxicações por este gás.

O caso mais grave aconteceu em 2024: Um jovem de 29 anos que ficou com dificuldades respiratórias, após ter inalado "uma dose mais elevada" deste gás.

"Ficou em coma e teve que ser hospitalizado numa unidade de cuidados intensivos", contou a médica do INEM.

A neuropediatra Rita Silva do hospital pediátrico Dona Estefânia, em Lisboa, relatou que o hospital tem acompanhado "um ou outro caso", mas tem conhecimento de vários, como no Hospital Garcia de Orta, em Almada.

"Nem há duas semanas tivemos um jovem adolescente que já tinha vindo ao serviço de urgência e depois regressou com um quadro muito grave de falta de força, desequilíbrio e alterações de sensibilidade dos membros, a ponto de ser para ele difícil andar sem apoio, por consumo de óxido nitroso", contou Rita Silva.

O adolescente, entre 15 e 16 anos, será agora submetido a "um programa intensivo de reabilitação".

A especialista explicou que os jovens consomem óxido nitroso de forma recreativa e esporádica, mas alertou que o uso de "forma mais continuada" diminui os níveis da vitamina B12, fundamental à formação da bainha de mielina que envolve os nervos.

"Quando a mielina está deficitária, não é feita a transmissão correta do impulso nervoso e isso pode dar alterações do sistema nervoso central", como perda de memória, confusão mental, alucinações.

Rita Silva explicou que o gás provoca "alterações da perceção do espaço e do tempo", criando um efeito dissociativo da realidade, com sensações de euforia que duram "30 a 60 segundos", que é o pretendido pelos jovens.

O uso continuado do "gás do riso" também pode causar danos a nível periférico dos nervos e dos músculos, resultando em "falta de força nos membros" e alterações graves de coordenação e do equilíbrio.

"Chegam a andar com o que chamamos de ataxia, parecem bêbados, e têm alterações de sensibilidade", como formigueiros ou mesmo não sentir os membros", disse a especialista, alertando para a importância de detetar e tratar precocemente estas situações, caso contrário as sequelas podem ser irreversíveis.

"Se for um consumo pesado ou crónico, sabemos que pode ter consequências orgânicas que, mesmo sob tratamento, podem vir a ser irreversíveis", acrescentou Margarida Alcafache, pediatra na Unidade de Adolescentes da ULS São José, no Hospital Dona Estefânia.

Margarida Alcafache alertou também para as consequências deste consumo a nível pulmonar, mas sublinhou que "a toxicidade neurológica" será "a mais preocupante, a mais grave.

Apontou que há relatos no estrangeiro de mortes por asfixia, na sequência de inalarem o óxido nitroso, usando sacos de plástico na cabeça.

Desde abril de 2021 que o consumo deste produto preocupa a PSP, que emitiu um alerta para serem reforçadas as medidas de fiscalização de venda e o consumo deste gás, incluído em 2022 na lista de novas substâncias psicoativas.

Em 2022, a PSP fez 173 apreensões de óxido nitroso (botijas ou balões), 69 em 2023 e 152 no ano passado.

As botijas também são de fácil acesso através das redes sociais ou na internet, bem como em estabelecimentos comerciais.

"Este gás, inodoro e incolor, tornou-se uma droga popular em festas e em contexto de diversão noturna. Pode ser inalado através de balões ou cartuchos vendidos para culinária, como os encontrados nos recipientes de chantilly", refere a PSP, alertando igualmente para os riscos do seu uso.

O Instituto para os Comportamentos Aditivos e as Dependências (ICAD) tem acompanhado de perto a evolução destes consumos: "Está mais circunscrito ao contexto recreativo, com consumos mais pontuais e com menor severidade. No entanto, é, obviamente, um comportamento que nos preocupa e ao qual temos dado atenção", disse Andreia Ribeiro.

A psicóloga do ICAD realçou que a "baixa perceção do risco" entre os jovens leva-os a exporem-se a esse comportamento, sem consciência das suas possíveis consequências, enaltecendo a importância do trabalho preventivo em meio escolar e universitário.

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