"Sem uma regra de cooperação da UE, os países do Sul da Europa estão a ser encostados a soluções económicas e sociais que são a segunda vaga da atual pandemia [covid-19] e essa segunda vaga é tão perigosa como a primeira", defende o professor universitário.
Louçã diz concordar com a ideia de que a covid-19 é um choque que está a atingir toda a UE e que terá efeitos económicos sobre todos os países, mas, no futuro, esses efeitos não serão iguais para todos, porque nem todos terão as mesmas condições para lidar com a crise económica que se adivinha.
O economista antevê mesmo um cenário pior, uma vez que considera que a Alemanha "beneficia em termos financeiros dos efeitos económicos da crise".
Na prática, explica Louçã, as emissões de dívida vão ser muito mais elevadas porque os países vão ter de se endividar para fazer face à pandemia e à crise subsequente. Até mesmo a Alemanha terá de emitir dívida depois de ter abandonado o seu excedente orçamental, lembra o economista.
Ora, para Louçã, "a desigualdade da vulnerabilidade destes países [do Sul] implicará um aumento das diferenças de taxas juro. Ou seja, quanto pior forem as condições de emissão dos países do Sul, melhores são as condições da Alemanha, acabando por ser um beneficiário líquido".
O economista admite que as próprias agências de 'rating' voltarão a atacar os países mais endividados, transformando "a zona alemã, a Alemanha, a Holanda, a Finlândia, a Áustria, nos referenciais de ativos seguros", enquanto aos "países do Sul será imposta austeridade".
Uma estratégia que para o economista "conduz à destruição do euro e, porventura, a uma tensão como a UE nunca viveu desde o seu início".
É também por este cenário que Louçã, apesar de defender os 'coronabonds', não acredita na sua criação.
"Permitiriam evitar um peso significativo sobre a dívida soberana porque permitiriam financiamento a juros muito baixos e poderiam ser emitidos a prazo muito largo. Mas creio que serão rejeitados", uma vez que existe um obstáculo político à sua implementação e esse obstáculo é o veto alemão, afirma.
Não havendo este cenário, o antigo coordenador do Bloco de Esquerda diz que, neste momento, o que está a ser discutido "é uma combinação entre uma operação de caridade e operações de crédito".
A operação de caridade, explica, foi sugerida pelo primeiro-ministro holandês, Mark Rutte, quando anunciou que a Holanda daria 600 milhões de euros para um fundo que poderia ir até 20 mil milhões.
"Resta saber quem o vai pagar", questiona-se o economista, adiantando que este dinheiro seria depois oferecido à Itália e à Espanha e a países em dificuldades.
"Tudo isto é muito nubloso e significa que a Holanda está a ressentir a gravidade da sua ostentação antieuropeia, da sua agressividade...", afirma.
"Mas como este donativo é pouco plausível", prossegue Louçã, "o que verdadeiramente parece estar a ser discutido é o recurso ao Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE)".
Louçã lembra que o MEE tem um fundo de 410 mil milhões de euros, mas que não é todo mobilizável a curto prazo.
E, além da insuficiência do fundo, o economista aponta três problemas a estas linhas de financiamento: "têm um juro elevado, excluem a Itália e têm condicionalidade para quem aceitar."
Assim, o professor universitário considera que, mesmo num cenário em que o Conselho Europeu aceitasse aliviar qualquer destas três condições, Portugal "não deveria aceitar" esta solução, "porque há condições para impor aos países beneficiários da desigualdade do euro uma condição muito mais protetora das sociedades".
Na sequência do último Conselho Europeu por videoconferência, no qual foram visíveis as divergências entre os 27 sobre a melhor forma de responder no plano económico à crise provocada pelo surto do novo coronavírus, o Eurogrupo vai celebrar nova reunião extraordinária na próxima terça-feira, tendo em conta o mandato atribuído para finalizar propostas concretas a apresentar aos líderes europeus.